O que a USP faz para estender a cultura?

Números e análises não faltam quando o assunto é produção acadêmica. A USP é responsável por 28% da produção científica brasileira e, com isso, ocupa a 15ª posição no mundo. Em vários rankings, como o Higher Education Evaluation & Accreditation Council of Taiwan, por exemplo, a universidade está entre as 100 melhores do mundo.

Esses números costumam ser associados à eficiência e à relevância da universidade na sociedade. Contudo, essas qualificações levam em conta apenas a produção científica, deixando de lado outro pilar da universidade: a extensão. Ensino, pesquisa e extensão constituem as três funções básicas da universidade. Está previsto na Constituição Brasileira (artigo 207) e as três devem ser tratadas de modo igualitário por parte da instituição.

A Extensão Universitária está prevista no Estatuto da USP no parágrafo 2º: estender à sociedade serviços indissociáveis das atividades de ensino e de pesquisa.Consta no relatório de atividades 2006-2007, publicado pelo Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária da USP : “a universidade como instituição é lugar de formação e reflexão crítica, fundamentada em valores democráticos; portanto, deve buscar a democratização do conhecimento”.

“A extensão é um canal de comunicação do que se faz na Universidade e a comunidade. Em relação à cultura, é uma via de mão dupla, pois assim como a Universidade leva cultura, a comunidade a traz para dentro da Universidade”, diz a professora Maria Thais Lima Santos, há dois anos diretora do TUSP (Teatro da USP), um espaço no centro de São Paulo ligado a extensão da USP. “O TUSP pretende estabelecer o teatro como área de conhecimento. É nossa função ampliar esse diálogo com a sociedade, através de ações efetivas como peças, mostras e oficinas abertas ao público”, completa a professora. Cerca de três vezes ao ano, o TUSP publica editais com concessão para companhias de teatro estrearem temporadas no espaço de teatro.

“A concessão é essencial, pois nós somos um grupo que não tem patrocínio”, afirma Gabriela Flores, atriz e diretora da peça Soslaio e membro da Companhia da Mentira, grupo que tem a concessão do espaço até 21 de dezembro.

Museus e Orquestra

A sociedade tem acesso aos vários museus da USP, como o Museu de Arte Contemporânea e o Museu de Ciências. Mas o acesso aos conhecimentos destes não se dá apenas com visitas: nos próprios museus são desenvolvidos programas de extensão e difusão cultural. Um deles é o Viva Arte!, do MAC-USP, coordenado pela educadora Andrea Amaral. O objetivo é inserir no mundo da arte e da cultura as pessoas dele excluídas por motivos sócio-econômicos. Trabalha-se com quem já faz parte de algum grupo da sociedade civil organizada, como ONGs e associações. Alguns dos alunos vêm da Associação Minha Rua, Minha Casa; da Cor da Rua, dentre outras. E o público abrange desde analfabetos até pessoas com curso superior.

O curso contribui para o repertório estético-cultural da pessoa, ajudando-a em sua atividade de geração de renda na instituição, e espera-se também que ela crie uma autonomia, passando a freqüentar os eventos culturais por conta própria; que fuja do senso comum em sua expressões e busque referenciais próprios, de sua vida e história.

“O MAC pertence a uma universidade estadual, tem vínculo com o Governo. E o Museu, ao ter funcionários na área da Educação, está realizando a atividade de mediação comunidade-patrimônio. Cabe a cada um de nós garantirmos a qualidade desse trabalho”, afirma Andrea Amaral.

A Osusp (Orquestra Sinfônica da USP) é a maior representante do braço musical da extensão universitária. Criada em 1975,e, em 2006 ganhou o Prêmio Carlos Gomes de “Melhor Orquestra do Ano”. A responsável por assuntos administrativos da Osusp, Liliane Pereira, não soube informar qual é o público que freqüenta os concertos, mas afirmou que ele é composto por estudantes e funcionários da USP, além de público externo. A vice-diretora da Osusp, Marilene De Vuono, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, foi questionada sobre “em que medida a Osusp é um órgão de extensão da Universidade”. Ela, porém, disse que não tem essa informação.

MAC (foto: Raphael Florêncio)MAC

Andrea Amaral coordena o Interarte e o Encontros Contemporâneos. Este, que existe há quase dois anos, são atividades voltadas para professores, educadores e alunos de licenciatura. A idéia é que se tenha contato com artistas, conhecendo sua trajetória profissional e pessoal.Já o Interar-te são oficinas mensais que, a partir do recorte de alguma exposição, propõem atividades em conjunto para pais e filhos. O projeto existe há dois anos e ocorre todo mês no MAC Ibirapuera, exceto no mês de dezembro. Com as atividades, Andrea Amaral espera que haja uma interação entre pais e filhos, que cada lado traga suas referências para troca durante a experiência artística. Cristiane, por exemplo, da empresa de limpeza terceirizada do MAC, levou o filho, Cristiano, de oito anos, em um dos Interar-te. Ele, que antes queria ser bombeiro, decidiu ser artista após as atividades.Há outros programas no MAC, como o Percursos Visuais, sob coordenação da professora Carmen Sylvia Guimarães; o Poéticas Visuais em Interação e o Lazer com Arte para a Terceira Idade, do professor Sylvio Coutinho.

Cinusp (foto: Divulgação)Cinusp

Ela senta e se afunda na poltrona, relaxa porque quando a luz da sala apagar e a tela de pano ascender o sonho começa. A aposentada Cida perdeu a conta de quantas vezes viu o ator italiano Mastroianni na tela daquela sala porque freqüenta o Cinusp desde sua fundação em 1993. Segundo ela, uma das poucas salas que oferecem bons filmes de graça. Qualquer professor ou aluno pode idealizar uma mostra e oferecer o projeto ao Cinusp. Não precisam ser, necessariamente, filmes artisticamente consagrados, o que se observa é uma coerência com a temática proposta. Todos os filmes precisam ser alugados ou cedidos gratuitamente por distribuidores ou pelos detentores e responsáveis pelos direitos das obras. Segundo o analista de comunicação do Cinusp Luiz Augusto, o intuito é ” buscar a qualidade da programação e a economicidade do orçamento das mostras”.

Osusp (foto: Divulgação)Osusp

“Fiz meu dever de casa”, disse Carlos Moreno, ex-maestro da Osusp (Orquestra Sinfônica da USP), que deixou o cargo em agosto. O “dever de casa” do músico, que foi regente titular da Osusp entre 2002 e 2008, é um documento em que ele registra o que imaginava como futuro da Orquestra, entregue à pró-reitoria de cultura e extensão. “O meu trabalho estava concluído”, disse, ao justificar a saída.

Segundo Moreno, a maior dificuldade enfrentada foi a falta de verba, que influía em todo o resto: na contratação de novos músicos e nas apresentações internacionais, por exemplo. Uma solução para o problema, segundo o músico, seria uma maior união entre as forças da USP: a reitoria, a pró-reitoria de cultura e extensão, a ECA, os cidadãos. “A orquestra pertence a todo mundo”, disse. Hoje o músico rege a Filarmônica de São Bernardo do Campo. “Estou iniciando esse trabalho com perspectivas positivas”, afirmou.

Tusp (foto: Divulgação)Tusp

Soslaio (foto) é o nome da peça em cartaz no TUSP da Companhia da Mentira. É o segundo espetáculo do grupo, junto desde 2003. A diretora da peça e atriz Gabriela Flores vê de forma crítica o alcance do projeto de extensão. “A gente teve uma estréia muito boa. As pessoas vêm nos falar sobre o trabalho do ator, mas ainda são muitas da classe teatral e profissionais liberais da arte, música e cinema. São poucas as pessoas que entram aqui pela primeira vez ou que desconhecem teatro”.Gabriela é coordenadora do Projeto de Teatro Vocacional da Prefeitura de São Paulo, que atua em bibliotecas e CEUs, levando estudantes da periferia ao teatro, muitas vezes pela primeira vez. Priscila Gontijo, atriz e escritora da peça, que também trabalha no projeto, disse que seus alunos foram à peça, e que assim, ela percebe a inclusão. “Na estréia de Soslaio, 16 alunos meus vieram. O espaço TUSP é maravilhoso, mas, de uma forma geral, ainda depende de mais aproximação”, diz.

Soslaio
De 13 de novembro a 21 de dezembro
Quando: de quinta a sábado, às 21h; aos domingos, às 20h
Ingressos: R$ 20 (inteira) R$ 10 (meia)
Onde: Rua Maria Antônia, 294 – Consolação