Extensão universitária estimula cultura dentro e fora da USP

O estudo dos meios de produção cultural leva professores e alunos a criarem projetos de interação entre academia e sociedade, visando produzir e ampliar o acesso ao conhecimento sobre as expressões culturais no país. Muitas dessas ações começam a partir do empenho de seus idealizadores, que usam os próprios recursos antes de conseguir patrocínio da universidade para mantê-las.

É esse o caso do Laboratório Experimental de Arte-Educação e Cultura, Lab Arte. Criado em 2006 por alunos de Pedagogia da Faculdade de Educação (FE), o projeto busca suprir lacunas do curso no que se refere a arte e cultura na educação. “A educação é um processo muito amplo, no qual a escola é importante, mas não é a única responsável”, explica o professor coordenador do projeto, Marcos Ferreira Santos.

Marcos conta que, em 2005, os alunos se reuniram em iniciativas de arte e cultura popular – como a Fermentação, que convidava os funcionários a serem “protagonistas” em música, brincadeiras tradicionais e teatro, em vez de apenas desempenharem suas funções. “A idéia era fermentar esse gosto [por cultura] e partilhar o conhecimento do que é produzido em arte-educação”, afirma. O grupo, que se intitulava “Estopim”, transformou-se no que hoje consiste o Lab Arte.

A primeira atividade do laboratório usava métodos incomuns para atrair o público às apresentações. “A gente começa na lanchonete, toca uma canção, declama um poema e faz uma espécie de cortejo até o saguão do Bloco B, onde começa a apresentação”, explica o professor.

O Laboratório foi instituído oficialmente em 2006, contudo, ainda enfrenta problemas para se manter. “No começo, houve um apoio muito frágil do departamento [de Administração e Economia da Educação – EDA]. Não tínhamos nem espaço físico para o laboratório”, relata. O coordenador apresentou, em 2007, um pedido de verba para a Pró-reitoria de Graduação, aprovado no começo deste ano, para manutenção das atividades do laboratório e adaptação da sala que compartilham com a graduação. Até então, Marcos dava palestras em escolas da rede pública em troca do material utilizado no laboratório.

Atualmente, o Lab Arte possui sete núcleos: artes visuais, dança, música, teatro, educomunicação, palavra e fotografia, que realizam encontros semanais para debater temas ligados a cada linguagem. As reuniões alternam a prática e o embasamento teórico, segundo explica Fernando Lopes, coordenador de artes visuais. “A idéia é ver como aquilo faz sentido [na prática] e se funciona”, explica.

Contudo, o objetivo não é formar atores, músicos ou artistas plásticos. “É fazer com que esses educadores tenham em seu repertório essa experiência para encontrar alternativas na prática profissional”, explica Marcos. Apesar do foco em educação, o Lab Arte é aberto a participantes de outras unidades da USP e à comunidade externa. “É só aparecer, conversar com o coordenador do núcleo e começar a freqüentar”, afirma.

Duas vezes por semestre ocorrem os saraus, que reúnem o trabalho produzido pelos alunos nos núcleos. Há ainda o Pensarte, colóquios que trazem convidados da própria USP e de outras instituições para debater temas ligados a algum dos núcleos. O próximo acontece no dia 17 de abril, e traz como tema “A arte do boi-bumbá”, com a doutora em antropologia Soraia Chung. Mais informações no site do Lab Arte www.marculus.net.

Além das barreiras

O acesso à cultura também é mote do centro Atopos de pesquisa em comunicação digital da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, que propõe reflexões sobre o protagonismo social que supera barreiras entre centro e periferia. Depois de trazer produções midiáticas indígenas e da periferia ao campus nas duas edições do seminário Mídias Nativas (em 2007 e 2008), o grupo se prepara para realizar uma nova atividade em um bairro da periferia de São Paulo no próximo semestre, o Laje Acadêmica.

O projeto consiste em encontros que tratarão do uso de tecnologias digitais para a produção audiovisual e visa a conexão entre saberes acadêmicos e locais da Cidade Tiradentes, extremo leste da capital. “É preciso entender que o fato de levarmos recursos a comunidades periféricas não significa que temos mais a ensinar lá do que a aprender”, ressaltam os integrantes do Atopos.

As atividades serão coordenadas por alunos da ECA, o “curador de saberes locais” Cláudio Nunes de Souza, mais conhecido como Tio Pac, outros monitores locais e pesquisadores do Atopos. A proposta já foi aprovada pela Comissão de Cultura e Extensão Universitária da ECA e aguarda o parecer do Conselho de Cultura e Extensão Universitária da USP.

A iniciativa vai ao encontro da demanda da comunidade. Tio Pac é um dos fundadores da Filmagens Periféricas, que produz e dissemina vídeos sobre o cotidiano da Cidade Tiradentes, desde 2003, e participou das duas edições do Mídias Nativas. No entanto, ele afirma que “preferiria se os seminários fossem realizados aqui na comunidade, para que a próxima iniciativa pudesse surgir daqui mesmo”.

“Pra mim, cultura popular é toda manifestação que uma pessoa ‘comum’ pode produzir ou consumir; vídeo, por exemplo, ainda não é popular no Brasil, porque muita gente não tem acesso, mas se passar a ter, será parte da cultura popular também”, opina Tio Pac. A importância desse meio de expressão é que mostra “um recorte da periferia por quem vive essa realidade, diferente do que é passado pela grande mídia”, ressalta.

O discurso do videomaker paulistano encontra respaldo no interior de Pernambuco, onde vive outro participante do Mídias Nativas, o índio Alex Pankararu, membro da rede Índios On-line (www.indiosonline.org). Ele é um dos comunicadores indígenas de diversas etnias que se unem, via internet, publicando desde histórias de ficção ou vídeos de rituais a denúncias sobre a precariedade da vida nas aldeias.

“Além de preservar o patrimônio cultural desses povos, criando um canal entre eles, o portal busca diminuir o preconceito em relação aos indígenas por mostrar como eles realmente vivem”, defende Sebastián Gerlic, presidente da organização de incentivo ao diálogo intercultural Thydêwá, que criou o site. O objetivo da organização é “qualificar os indígenas para lidar com essa ferramenta de transformação social de modo que não sejam enganados pela mídia ou por quem está no poder”, assevera.