Fundações são imprescindíveis para as universidades, diz promotor

O promotor Airton Grazzioli (foto: Daniel Garcia/Adusp)
O promotor de Justiça Airton Grazzioli (foto: Daniel Garcia/Adusp)

A USP recebeu no final do ano passado, pela primeira vez, relatório anual de atividade e atestado de aprovação das contas das fundações vinculadas à universidade. As novas obrigações decorrem de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado pelas 16 fundações sediadas na capital em 2006.

O TAC foi firmado após representação da Adusp (Associação dos Docentes da USP) ao Ministério Público do Estado (MP) contra o exercício paralelo de funções por professores em regime de dedicação integral. O documento foi criticado pela Adusp, que o considerou favorável às fundações, e pela Reitoria, que queria normas mais rigorosas e decidiu não assiná-lo.

O Jornal do Campus entrevistou o promotor de Justiça que conduziu o processo de assinatura do TAC, Airton Grazzioli, da Promotoria de Fundações da Capital, que explica como funciona esse novo instrumento de fiscalização e dá sua opinião sobre a relação entre fundações e universidade pública.

Jornal do Campus: Como as fundações prestam contas de suas atividades?

Airton Grazzioli: Elas devem encaminhar o relatório de atividades anual e a prestação de contas para a Promotoria anualmente. O MP analisa os documentos e depois encaminha o relatório de atividades e um atestado de aprovação das contas para a Reitoria. A USP precisa conhecer o que as fundações vêm fazendo, pois elas usam o nome e o prestígio da universidade nos trabalhos que desenvolvem e a USP pode querer tomar providências caso sua imagem esteja sendo denegrida.

JC:
Que tipo de estrutura das fundações pode ficar dentro da universidade?
Airton Grazzioli: Atividades conveniadas quando há o exercício de uma finalidade da universidade. Um exemplo é a Fundação de Odontologia, que tem no campus cerca de 250 clínicas odontológicas colocadas à disposição para as aulas práticas. É uma atividade da fundação que precisa ser exercida dentro do campus, pois não é possível retirar o aluno para fazer a aula prática fora.

JC: Qual foi o resultado dessa primeira fiscalização?
Airton Grazzioli: Todas as contas enviadas no ano passado, relativas ao exercício de 2007, foram aprovadas.

JC: As fundações são submetidas a alguma auditoria externa?
Airton Grazzioli: Sim, no ultimo ano da gestão de cada diretoria é realizada uma auditoria independente convocada pelo MP. É um procedimento diferente da prestação de contas rotineira. A auditoria comparece às dependências da fundação, analisa toda sua documentação e oferece um parecer. Essa empresa é custeada pela fundação, mas é nomeada pelo MP e o relatório é apresentado ao MP, não à fundação.

JC: Como fica a situação dos professores em regime de dedicação integral?
Airton Grazzioli: Os professores que querem trabalhar fora da universidade precisam de uma autorização especial da CERT (Comissão Especial de Regimes de Trabalho), um dos órgãos de administração da USP. O TAC define que os coordenadores dos serviços prestados pelas fundações devem encaminhar à universidade uma relação dos docentes em dedicação integral que participaram de atividades desenvolvidas em convênio com a USP. É importante que a fundação forneça elementos para que a universidade fiscalize seus docentes.

JC: As fundações podem usar equipamentos e funcionários da USP?
Airton Grazzioli: Sim, para as atividades conveniadas. Para suas atividades administrativas não.

JC: A Reitoria não assinou o TAC?
Airton Grazzioli: Não. Houve toda uma negociação e no final ela não assinou.

JC: Seria importante que ela assinasse o termo?
Airton Grazzioli: Não é relevante, pois o TAC não traz nenhum tipo de obrigação para a Universidade. Seria mais importante para a Reitoria ter assinado, já que estabelece um quadro obrigacional com as fundações.

JC: A negociação foi tranqüila?
Airton Grazzioli: Com a reitoria foi fácil, temos um relacionamento harmonioso. A crítica que veio foi da Adusp, que acha que as fundações trazem prejuízos à USP, que privatizam a universidade. É um discurso que eu tenho evitado, de uma ideologia um pouco ultrapassada.

JC: Como o senhor vê a presença das fundações na USP?
Airton Grazzioli: As fundações, no contexto que temos hoje, são imprescindíveis. No dia em que a autonomia universitária sair de dentro da Constituição e se tornar uma realidade as universidades não precisarão mais das fundações. Mas vemos hoje que elas prestam excelentes serviços. Por exemplo, se você visita uma faculdade que não tem fundação de apoio, como a FFLCH, você chega e não tem nem papel higiênico nos banheiros. Agora, quando vamos à Medicina você vê que a fundação conseguiu restaurar aquele prédio em um projeto de 50 milhões de reais. É imprescindível ou não? Se você entra na FEA, há salas de aula com cadeiras anatômicas, projetor, equipamento multimídia para o professor. Isso é importante para o ensino ou não? Basta uma lousa com papel e giz?

JC: O senhor estudou na USP?
Airton Grazzioli: Sim, me formei em 1989 na São Francisco. Se você perceber, a própria São Francisco mudou um pouco. A São Francisco que eu freqüentei era muito mais pobre do que a São Francisco de hoje. A Fundação Arcadas está engatinhando, começa a ganhar terreno agora, já conseguiram restaurar alguns quadros. Espero que ganhe força.

Entenda o que é um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC)

É um acordo proposto pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública para adequar uma conduta à lei. Pode gerar penalidades se não for cumprido pelos signatários. Geralmente é utilizado para resolver certos problemas por meio de acordos, ao invés de punir diretamente o(s) infrator(es) (por exemplo, uma empresa que polui em excesso se adequa às normas por meio de um TAC, ao invés de receber uma multa pesada).