Servidores do restaurante central sofrem com lesões no trabalho

Os funcionários da divisão de alimentos da Coordenadoria de Assistência Social (Coseas) sofrem há anos com lesões por esforços repetitivos (L.E.R.). Desde a inauguração em 1977, o Restaurante Central do campus já viu diversos cozinheiros e auxiliares serem invalidados ou desviados de suas funções.

Josemir de Paiva Mesquita, 42, começou a trabalhar no almoxarifado do restaurante central em 1992. Logo depois passou a exercer a função de auxiliar de cozinheiro na unidade. Há cerca de dois anos começou a sentir dores no braço e procurou um ortopedista por iniciativa própria. Teve o diagnóstico de bursite avançada devido ao choque térmico provocado no preparo dos alimentos. “Quando o funcionário está lavando louças, tem que trabalhar com duas torneiras, uma de água quente e outra, fria”, explica. Com o tempo, a diferença entre as temperaturas causa as lesões.

Assim Josemir teve que passar por um “desvio de função”, quando o funcionário é obrigado a deixar de exercer sua atividade. Hoje, ele quase não tem força no braço esquerdo. Para segurar um copo d’água, precisa do apoio da mão direita. Desde novembro do ano passado trabalha como vigia do restaurante.

O Jornal do Campus apurou que o funcionário responsável pela Comissão Interna de Prevenção de Acidentes no restaurante central, o auxiliar de cozinha Marcelo Ferreira, foi deslocado para o restaurante da Escola de Enfermagem, em Pinheiros.

Marcelo participava de palestras de prevenção e depois repassava as instruções aos funcionários. Josemir acredita que a transferência, ainda não autorizada oficialmente, foi motivada por questões políticas.

Outra vigia improvisada é a ex-cozinheira Zulmira Francisco de Souza. Ela também foi desviada de sua função original devido aos problemas causados por L.E.R. Depois da confirmação do diagnóstico de bursite e tendinite nos dois ombros, passou por duas cirurgias. Ficou dois anos afastada da Coseas em cada uma delas.

Zulmira garante que teve apoio da chefia em todas as ocasiões em que apresentou problemas de saúde. “Acontece que a situação começou a melhorar apenas quando os funcionários com mais tempo de casa começaram a ser prejudicados.”

Segundo a especialista em saúde do trabalho, Carla Segre Faiman, psicóloga da Faculdade de Medicina da USP, lesões deste tipo são freqüentes em pessoas que trabalham em restaurantes. “Se uma ou duas pessoas adoecem, podemos pensar que elas sejam mais propensas, mas se muita gente está adoecendo é porque o setor está doente”.

Assim ela defende que medidas como rodízio entre funções, divisão equilibrada de trabalho e funcionários em número suficiente podem atenuar o problema, mas a resolução passa por uma revisão geral da seção como um todo. ”Tem que ser examinada a seção de trabalho mesmo”, afirma, “ver o que está sendo demandado dessa equipe, como as pessoas se sentem trabalhando lá”.

Licenças

Tanto Zulmira quanto Josemir concordam que as condições de trabalho melhoraram muito no “bandejão”. “Antes, as caixas de verduras e legumes que vinham da Ceagesp tinham até filhotes de cobras” conta ela. “Precisávamos cortar todos os alimentos, prepará-los desde a retirada das caixas”, acrescenta. Hoje os restaurantes da Coseas recebem muitos alimentos já processados. A própria evolução da indústria alimentícia facilita o trabalho dos cozinheiros. Mas problemas como o das torneiras para lavar louça como o enfrentado por Josemir continuam.

José Evangelista Portela de Oliveira, 37, exerce a função de cozinheiro há oito anos. Ele conta que tem que passar da chapa quente onde prepara os bifes para a chamada câmara fria, onde os alimentos são conservados, para novamente despejá-los na chapa. “A diferença de temperatura é muito grande, e todos se queixam de dores”, afirma.

O restaurante Central prepara diariamente cerca de 450 kg de arroz e 360 de feijão. José Evangelista diz que cada 50kg de arroz enchem sete cubos, que devem ser trocados constantemente durante as refeições. O peso e o esforço dos funcionários na troca dos cubos também é responsável pela ocorrência de lesões.

Por conta de todos esses problemas, os restaurantes do Coseas têm uma grande circulação de cozinheiros. De acordo com as estimativas de Josemir, 80 % dos funcionários têm problemas de saúde. José Evangelista ainda aponta outro problema: “para cada dez funcionários afastados, apenas um é substituído”. Os trabalhadores reclamam que, devido às licenças médicas e aos afastamentos, muitas vezes quem está saudável acaba sobrecarregado, gerando efeito bola de neve que aumenta número de lesões.

Por isso os funcionários, por meio do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), pediram à Coseas a contratação de novos funcionários, para que se aumentasse o número de servidores nos restaurantes. Segundo Solange Conceição Veloso, diretora do sindicato, seriam necessárias cerca de 30 pessoas para resolver os problemas.

O JC entrou em contato com a Coseas para pedir esclarecimentos sobre o assunto. Por e-mail, a coordenadora geral, Rosa Maria Godoy Serpa da Fonseca, comunicou que “não atende pedidos do Jornal do Campus”.