Imagem elitista da USP afasta negros

Quantidade ainda inexpressiva de negros no ensino superior brasileiro é reflexo de deficiências na educação básica, diz professor

Vista quase que como exclusividade das classes altas desde o Brasil colônia, a educação superior, especialmente a pública, recebe atualmente um número ainda pouco expressivo de negros. “A baixa expectativa quanto ao desempenho dos alunos negros é também uma forma de discriminação. Isso acontece desde a educação básica. É necessário um investimento maior e planejamento mais cuidadoso nessa área para que se mude essa atitude.”, diz o professor Antônio Sérgio Guimarães, do departamento de sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP).

Para o professor, o sistema universitário foi desenvolvido tardiamente, tornando-se elitista, tanto positiva, porque desenvolve pesquisa de ponta, quanto negativamente, por dificultar o acesso a uma parcela maior da população. Ele afirma que “Os colonizadores portugueses, diferentemente dos espanhóis, não se preocuparam em fundar universidades em suas colônias, pois as elites eram formadas na Europa. Dessa posição, vem a idéia da educação superior como exclusividade das classe alta, o que por si só já afasta os negros”.

O problema na educação brasileira, porém, não se resume ao nível superior. De acordo com Guimarães, há problemas desde a instrução elementar até os processos seletivos, que privilegiam aqueles que podem se preparar em cursinhos pré-vestibular.  “Existe uma classe média negra que já está se preparando para os vestibulares tradicionais, mas esse numero deve crescer com as mudanças no Enem e em outros processos seletivos.”, conclui Guimarães.
A presença de negros na educação superior vem crescendo com o passar dos anos, Em 2006, por exemplo, de acordo com dados da Fuvest, 12,47% dos ingressantes na USP eram negros. Já em 2009 14,27% dos aprovados no vestibular são negros.  A criação de políticas públicas como as cotas, programas de inclusao e a abertura de novas vagas, com a criação da USP Leste, são fatores que colaboraram para esse crescimento. Para Guimarães as cotas são positivas, mas as políticas neste sentido devem existir junto a autonomia universitária: “O ideal seria se cada universidade decidisse como promover sua política de inclusão, a partir de metas estabelecidas pelo poder central, que certamente deve ter metas para a inclusão dos negros”.

Negros na USP

Na USP, a parcela de estudantes e professores negros ainda é pequena se comparada ao perfil da sociedade brasileira. “Seria importante uma universidade pública refletir a heterogeneidade da população, para que todos fossem representados.”, diz Guimarães. Nesse contexto, surgem trabalhos como o do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Estudos Interdisciplinares sobre o Negro Brasileiro (Neinb) que inaugurou em 13 de Maio último o Centro de Pesquisa Milton Santos, na ECA-USP. O espaço é dedicado a promover o trabalho do Neinb, que desde 1996, ano de sua fundação, trabalha para criar uma forma de diálogo permanente entre docentes, estudiosos e pesquisadores sobre a questão do negro brasileiro e do negro na USP, incentivando a pesquisa e as atividades de extensão relacionadas com o tema. “O trabalho do Neinb promove também uma maior integração entre o negro e a universidade.”, explica Guimarães.

O número ainda pequeno de residências universitárias no campus do Butantã é um fator que dificulta o acesso dos negros e das classes mais baixas a universidade, pois além dos custos com transporte serem altos o trânsito complica ainda mais o deslocamento entre pontos distantes de São Paulo. “É difícil para um aluno que more em bairros mais afastados ter aulas a noite. Com mais residências universitárias,  haveria maior democratização”, resume Guimarães.