Papel da Universidade é debatido com as mudanças na Fuvest 2010

As mudanças aprovadas para a prova da Fuvest 2010 afetarão diversas áreas do ensino, trazendo à tona discussões relacionadas não apenas com o sistema de seleção do vestibular, mas com o papel da universidade e o ensino praticado no país. Segundo a professora Maria Amélia Oliveira, da Escola de Enfermagem (EE) da USP e assessora do GT Vestibular, “a idéia é aperfeiçoar o formato atual e, com isso, favorecer o ingresso na USP de alunos com maior potencial para aproveitar de maneira plena os estudos universitários”.

Já para Nilson Machado, professor da Faculdade de Educação na USP, ex-participante do conselho diretor da Fuvest de 2000 a 2004 e participante da nova proposta curricular do Estado de São Paulo, as mudanças deveriam propiciar uma transformação, não apenas do vestibular, mas da organização da própria universidade. Machado concorda com o projeto de aprovar alunos que aproveitariam mais o curso, porém não acredita que isso seja viável com a atual estrutura da USP: “Como seria possível o aluno que ingressará por essas mudanças no vestibular estar conivente com a universidade, se esta não mudou nada na sua maneira interna de se organizar?” Em suma, se as atuais mudanças selecionarão alunos mais interdisciplinares e que tem um conhecimento geral amplo, este aluno não terá facilidade para se adequar a cursos mais específicos.

Na visão do professor, deveria haver uma mudança na estrutura dos cursos, com um curso básico que se ramificaria posteriormente em habilitações específicas. Numa espécie de “pós-médio”, o aluno ingressante teria contato com todas as áreas do conhecimento antes de decidir sua profissão. Isso, segundo o professor, diminuiria o número de desistentes nas carreiras, pois deixaria o aluno mais certo de que profissão seguir. Atualmente, com cerca de 10.500 alunos ingressantes, o número de formandos dificilmente chega a 6 mil.

Outra questão polêmica é a de que a primeira fase não carregará pontos para a segunda. Maria Amélia explica que isso se dará porque a primeira fase deve ser apenas um filtro: no vestibular 2009, cerca de 122.000 candidatos concorreram às 10.557 vagas. Com esse número de candidatos, a primeira fase, constituída por 90 questões objetivas, selecionaria os candidatos mais bem preparados, na proporção de três candidatos para cada vaga. Esses candidatos irão, em igualdade de condições, para uma prova dissertativa, com o intuito de aferir a capacidade de articular conhecimentos, refletir de maneira critica e propor soluções originais para as questões formuladas.

Machado não considera esse critério injusto, pois dá oportunidade para que alguns candidatos consigam se recuperar nas provas analíticas. Com a mudança, a segunda fase será mais decisiva, com três dias de prova: O primeiro dia permanece igual (10 questões de Português e Redação); no segundo dia, haverá uma prova com questões dissertativas sobre conhecimentos gerais das disciplinas do Ensino Médio (de forma interdisciplinar). No terceiro dia acontecerá uma prova com duas ou três matérias vinculadas à carreira desejada. Dessa forma, o candidato demonstraria não apenas desempenho na área escolhida, mas também conhecimento geral sobre todas as disciplinas.

Maria Amélia salienta que a idéia dessa mudança é dar uma sinalização para que o Ensino Médio vá se adequando aos poucos, que tenha uma formação mais cidadã e valorize o núcleo comum de disciplinas. Para Machado, “isso é tentar consertar a febre com o termômetro”. Ou seja, de nada adiantaria o vestibular, um termômetro que serve para medir a capacidade dos alunos para o ingresso na universidade, tentar mudar as defi ciências do ensino básico. Uma das formas, acredita, seria melhorar as condições dos professores, para evitar cargas horárias enormes, vários empregos e falta de motivação.