Entrevista com Dalmo Dallari

O JC entrevistou o professor emérito da Faculdade de Direito da USP, Dalmo Dallari, 77, sobre os recentes acontecimentos na USP, especialmente sobre o pedido de renúncia da reitora, feito pela Adusp, Sintusp e DCE. O professor explica porque declarou na semana passada para a Folha de S. Paulo que o pedido era absurdo e sugere que os grevistas documentem todas as suas reivindicações.

Jornal do Campus: O senhor afirmou em entrevista à Folha de S. Paulo, que o pedido de renúncia das entidades é absurdo. Por quê?
Dalmo Dallari: O pedido é absurdo porque não tem qualquer fundamento legal.

JC: Existe no regulamento da USP algum mecanismo formal por meio do qual as entidades podem solicitar a renúncia ou o “impeachment”? Se sim, qual?
DD: Não há qualquer previsão da hipótese de renúncia na legislação da USP.

JC: Como o senhor avalia o fato de que não há essa possibilidade?
DD: O normal é que não haja porque se supõe que a escolha tenha sido feita por alguém preparado, qualificado e pressupõe-se também que o escolhido vai ficar até o final do mandato. É o normal, não é?

JC: O senhor afirma que o pedido das entidades é absurdo. Por quê?
DD: Desmoraliza pelo seguinte, foram os órgãos superiores da USP que fizeram a escolha do reitor para um mandato determinado. Quer dizer, a renúncia significaria que ou a escolha foi mal feita ou então a USP não dá condições para o reitor exercer o mandato, o que de qualquer maneira é ruim para a USP. Ou ela escolheu mal ou ela escolheu bem, mas não dá condições pro reitor exercer o mandato.

JC: As entidades que pediram a renúncia têm uma participação muito pequena no Conselho…
DD: Pois é, elas não representam a USP, elas representam pequenas parcelas de setores da USP, mas não representam a universidade. É que a grande maioria da universidade não está pedindo a renúncia. E a grande maioria é professores, funcionários e alunos. É uma pequena minoria que está pretendendo isso, o que também reforça o absurdo.

JC: O senhor em outras ocasiões se colocou a favor das eleições diretas…
DD: E continuo a favor.

JC: E porque o senhor acha que não deve haver pedido de renúncia?
DD: Porque depois de eleger, depois de dar posse, tirar a pessoa do cargo é golpe. Não é solução jurídica, é golpe. Então, se a pessoa foi escolhida nesse processo, deve cumprir o mandato até o final. Agora os futuros devem ser escolhidos de maneira diferente.

JC: O senhor acredita na necessidade de mudança da estrutura?
DD: De mudança do estatuto da USP, para que os próximos eleitos sejam escolhidos por um processo diferente.

JC: O senhor acredita que o estatuto como ele é hoje de alguma forma contribui para essa situação tensão?
DD: Não, não. Eu acho que é muito mais uma influência de fatores momentâneos, circunstanciais, não há uma grande falha de organização que impeça a USP de funcionar bem.

JC: Mas e em relação à abertura para diálogo?
DD: Ela existe, perfeitamente, é preciso que os que fazem reivindicações adotem uma atitude razoável, uma atitude razoável, uma atitude de diálogo e não de agressão.

JC: Essas partes afirmam que muitas vezes já tentaram solicitar o diálogo.
DD: Mas faltou competência dessas lideranças, porque quando eles pretenderem alguma coisa devem colocar a pretensão num documento e dar divulgação ao documento, distribuir para a imprensa e aí todo mundo sabe que está havendo a reivindicação, porque dizer eu quis e não houve resposta é muito vago. Eu quero saber se quis mesmo, como quis, o que quis, por isso o processo razoável, normal, é formular por escrito a reivindicação e divulgar esse documento.

JC: Qual o senhor consideraria a melhor saída diante desse cenário?
DD: A melhor saída é exatamente a busca de diálogo. Mas eu acho que o que as entidades que reivindicam devem fazer é colocar no papel as suas reivindicações e entregar formalmente à reitora e aguardar uma resposta. Mas entregar para a reitora e dar divulgação, distribuir para a imprensa.

JC: Que foi o que aconteceu como pedido de renúncia da reitora?
DD: Pois é, mas quanto aos demais pedidos está tudo muito vago. Há muita coisa sendo falada, muita palavra de ordem, mas não há uma formulação. Inclusive são pedidos que de certo modo estão mal formulados porque se dirigem à autoridades diferentes. São assuntos que devem ser decididos por órgãos diferentes, então não cabe o mesmo pedido.

JC: O senhor poderia comentar o que aconteceu ontem em relação à solicitação da admissão do Brandão, que logo depois foi suspensa?
DD: Eu acho que o lugar normal para discutir o caso Brandão é exatamente o judiciário, então vamos discutir no judiciário e acatar aquilo que o judiciário decidir.

JC: Esse tipo de acontecimento é comum?
DD: É comum, é normal. Todos os dias existem decisões e decisões que são reformadas, faz parte da disputa judicial, por isso que existe a possibilidade de recurso. Já a possibilidade de recurso pressupõe a possibilidade de mudar uma decisão. Isto é fato normal, não é nada excepcional.

JC: E como vai se dar a continuidade desse processo?
DD: A justiça vai analisar o mérito, porque por enquanto a discussão está em torno de liminar. A liminar é uma decisão provisória, então temos que aguardar a decisão definitiva do mérito.