Obras da Copa devem ter equilíbrio

Para professor da FAU, obras de infra-estrutura em São Paulo requerem gestão cuidadosa para não drenarem recursos de áreas carentes

A confirmação de São Paulo como uma das sedes da Copa do Mundo de 2014 obriga a cidade a planejar – e concluir a tempo – uma série de obras para melhorar a infra-estrutura do espaço urbano e da rede de transportes. Para o professor Milton Braga, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), a cidade entrará em um período delicado, no qual a competência administrativa será obrigatória para que as “obras da Copa” não drenem recursos de áreas carentes.

“As regiões que deverão receber turistas atraídos pela Copa do Mundo já são estruturadas acima da média do restante da cidade de São Paulo. No processo de planejamento, pode ser que obras prioritárias e que beneficiariam camadas da população sejam deixadas de lado”, alerta Braga. Dentre as obras, estariam principalmente as de saneamento, pavimentação de ruas e avenidas das periferias e de expansão e conexão da malha de transportes.

Para o professor, especialista em projetos urbanos, a capital paulista têm recursos sufi cientes para suprir a carência de infra-estrutura em todas as regiões. Entretanto, como as obras “concorrerão com outras prioridades”, o resultado dos projetos trará benefícios reais para a cidade apenas com uma gestão adequada dos recursos públicos.

Braga afirma que, embora São Paulo claramente tenha necessidades, ainda figura como uma das poucas metrópoles sul-americanas preparadas para receber, desde já, um evento como a Copa do Mundo, ao lado de capitais como Buenos Aires e Santiago. Segundo o professor, apesar de desordenado, o crescimento de São Paulo foi um dos mais intensos no século XX.

Csaba Deák, professor da FAU e especialista em planejamento urbano, discorda da “prontidão” da cidade para o evento esportivo. “Com ou sem Copa, São Paulo não tem uma infra-estrutura para servir sequer as necessidades de seus próprios habitantes, ao menos não a um nível que qualquer um de nós consideraria decente”, afirma.

O que deve ser feito

À época da Copa do Mundo, São Paulo sofrerá, de acordo com Milton Braga, uma pressão populacional signifi cativa. Sob essa perspectiva, o professor alerta que “não será possível fazer obras de ‘maquiagem’ na cidade. Os serviços terão que funcionar obrigatoriamente sem falhas”.

Deák reforça o alerta de Braga. “Todo anfitrião faz um esforço extra para receber bem seus visitantes. A questão é manter a cabeça fria e não cometer barbaridades e desperdícios sob o pretexto da pressa e da situação inusitada”.

Por esse motivo, Braga diz que a infra-estruturação da cidade deverá ser cuidadosa e avaliada com base em uma cultura urbana adequada. “Além de melhorias óbvias, como no transporte público, será preciso desenvolver um espaço público de qualidade. Um exemplo que passa despercebido para a maioria é a melhoria das calçadas. Elas não têm padrão nenhum em São Paulo. O poder público poderia investir em regularidade para estes espaços”.

Braga aponta a parceria entre o poder público e os próprios cidadãos como uma alternativa satisfatória para viabilizar esta padronização no espaço público. “Um exemplo simples seria o incentivo para que os próprios moradores dos bairros construíssem as calçadas, recebendo em troca benefícios como descontos em impostos da prefeitura. Isso resolveria o problema da falta de padrão dentro dos bairros”, diz.

“Acolhedor” é a palavra que Deák usa para definir um cenário urbano ideal para a São Paulo que será sede da Copa. Ele afirma que as necessidades tanto para promover eventos esportivos quanto para acolher os habitantes são as mesmas: “infra-estrutura de qualidade, bons restaurantes, equipamentos para pedestres e transporte público eficiente para os deslocamentos maiores”.