Para jornalistas, cobertura da greve é superficial

Grande mídia tende a noticiar efeitos imediatos de manifestações sem discutir seus motivos

Diversos veículos de comunicação entrevistam professor após conflito entre PM e manifestantes
Diversos veículos de comunicação entrevistam professor após confronto entre PM e manifestantes (foto: Bruna Escaleira)
“Todo movimento social vira matéria de trânsito hoje na mídia”, aponta Adauri Antunes, repórter do jornal O Globo, que cobria a manifestação do dia 9 de junho na entrada da USP. Assim como os demais jornalistas entrevistados pelo JC na ocasião, ele concorda que os grandes veículos de comunicação não têm se dedicado a mostrar e debater as reivindicações dos grevistas.

“O que vejo no noticiário é só o factual mesmo, o trânsito, o bloqueio. A gente, dentro do jornal, precisa se dedicar mais a fundo às pautas dessa mobilização, que não é só salarial. Sei que também tem o plano de carreira dos professores, o ensino à distância, mas a gente não têm se debruçado muito para entender o que está por trás dessa discussão. É preciso discutir também que tipo de universidade se quer ter daqui a 25 anos”, defende Laura Capriglione, repórter da Folha de São Paulo.

Apesar de defender a liberdade de expressão, os jornalistas entrevistados – que, em sua maioria, participaram do movimento estudantil em sua época de faculdade – questionam os tipos de protestos realizados. “Em São Paulo, fazer manifestações de rua é contraproducente para o movimento, porque o trânsito é tudo na cidade”, opina Antunes. “Acho legítimo qualquer tipo de manifestação, desde que não prejudique outras pessoas”, afirma Wellington Mesquita, repórter da rádio Jovem Pan.

Essa discussão é feita pelos próprios manifestantes: como chamar a atenção para suas reivindicações sem ganhar a antipatia da sociedade? Para Antunes, “se houvesse uma fórmula definida para protestar e conquistar reivindicações com apoio da população, já teriam encontrado; como ela não existe, tem que xingar mesmo, tem que entrar na reitoria”. “A manifestação é legítima, mas passa da conta – pra quê cercar o comandante da PM?”, questiona Roberto Burnier, repórter da Rede Globo. Ele também aponta a falta de organização dos manifestantes – que precisaram realizar uma votação no meio do ato para decidir como seria seu desfecho, antes do ataque da polícia – como um problema, “o movimento estudantil deveria ser mais maduro”, critica.

Visibilidade

Como afirma Mesquita, “a mídia mexe com o imaginário coletivo, por isso a importância de que ela mostre os movimentos sociais”. Apesar da escassa abertura da grande imprensa a esse tipo de assunto, ele acredita que “a cobertura desses movimentos não é ampla, mas as pautas chegam à sociedade de alguma maneira; tem que ser feito um trabalho de ‘formiguinha’, de convencimento sobre a importância das reivindicações aos poucos”.

É importante lembrar, também, que os repórteres não são os únicos responsáveis pela maneira como suas matérias são veiculadas, uma vez que estas estão sujeitas à edição dos donos da empresa de comunicação para a qual trabalham. “Fiz meu trabalho corretamente, apurei todos os lados, mas como não somos nós, repórteres, que fazemos os títulos, levei um susto ao ver nas bancas a distorção de informação que fizeram no título da minha matéria”, relata uma jornalista que preferiu não se identificar.

No entanto, apesar de obter mais visibilidade, hoje me dia, a grande mídia não detém o monopólio da informação. Através de blogs e outros recursos da internet, os manifestantes encontram espaço para mostrar seus pontos de vista. Para Mesquita, os movimentos sociais precisam se apropriar mais desses novos meios de expressão, já que “os grandes meios de comunicação estão perdendo espaço para eles”.