Entraves à exportação de tecnologias prejudicam redução de mudanças climáticas

Para especialistas, contribuição internacional ao Brasil é insuficiente; país realiza pouca pesquisa sobre impacto do clima no cotidiano

“Os países centrais dispõem de tecnologias que poderiam ser repassadas ao Brasil e a outros países periféricos para ter uma ação mais contudente no controle das mudanças climáticas. Mas isso não está sendo feito”, aponta Wagner Ribeiro, coordenador do Grupo de Pesquisa de Ciências Ambientais do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. Para o Tércio Ambrizzi, diretor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e autor de relatórios sobre mudanças climáticas para o Ministério do Meio Ambiente, não há cooperação devido à predominância de argumentos políticos e econômicos nos fóruns internacionais sobre mudanças climáticas “em detrimento das preocupações socio-ambientais”.

Ambrizzi ressalta que boa parte das contribuições internacionais para o meio ambiente brasileiro provem de organizações não governamentais – e não de políticas estatais. A maior parte delas destina-se apenas medidas de diminuição da emissão dos gases causadores do efeito estufa por meio de compensação – a chamada compra de créditos de carbono por países ou empresas que precisam diminuir seu impacto ambiental para atender ao Protocolo de Kyoto. Para Ribeiro, esses créditos são uma “medida criada para manutenção do status quo desses países”. O coordenador afirma ainda que os investimentos deveriam atender, principalmente, a demanda por pesquisas para desenvolver novas tecnologias “verdes”, que possibilitem a redução efetiva das emissões, bem como atenuar o impacto das mudanças climáticas na vida das pessoas.

No Brasil

Para os pesquisadores, o governo brasileiro ainda não faz a ligação entre as previsões de alterações climáticas no território nacional e seu impacto social. Isso se torna evidente tanto na dificuldade de atendimento à população em situações de catástrofe natural – como nas recentes enchentes do nordeste e no sul – como na carência da capacidade para atendimento de doenças respiratórias nas grandes cidades, por exemplo.

Também falta contribuição do país em relação ao intercâmbio de tecnologias verdes. O Brasil tem buscado aumentar seus embarques de etanol, em vez de exportar a tecnologia para que outros países possam produzi-lo – como está previsto no Plano Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC). Além de beneficiar a preservação ambiental, a exportação de tecnologia é muito mais lucrativa do que a de produtos.

Riibeiro acredita que o Brasil não está aproveitando seu potencial para o mercado de créditos de carbono. Apesar de ser o terceiro maior nesse mercado, o país está muito atrás dos primeiros colocados, Índia e China. “A maior parte dos projetos para compra de créditos brasileiros prevê a troca do uso de gasolina pelo etanol e a construção de aterros sanitários, que também são importantes mas apenas um em cada 300 desses projetos é de reflorestamento”, afirma. “Estamos perdendo uma ótima oportunidade de recuperação de áreas degradadas”, completa. Ele aponta que o Brasil poderia incentivas projetos de repotencialização de indústrias, como siderúrgicas e produtoras de etanol, o que otimizaria a produção e reduziria a emissão de gases.

As atuais tentativas de modificar as leis ambientais brasileiras promovidas por grandes proprietários de terra evidencia uma legislação ambiental eficaz, a qual, segundo Ribeiro, não está defasada em relação a outros países. Para ele, a criação de fundos para captar recursos internacionais apenas sistematiza uma ajuda que já ocorria e isenta o governo brasileiro de angariar dinheiro para preservação da natureza.

Ele relembra que a maior crítica ao Brasil feita pela comunidade internacional sobre a questão ambiental diz respeito ao desmatamento. Assim, ele propõe que esses recursos sejam destinados à remuneração de pequenos proprietários rurais para que implantem o sistema de reserva extrativista em suas terras.

Painel de pesquisa

Para Ambrizzi, hoje há abundância de pesquisas sobre o cenário global de mudanças climáticas. Um exemplo disso é o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), criado pela ONU e pelo Organização Meteorológica Mundial (WMO, sigla em inglês) em 1988, que reúne pesquisadores de todas as partes do globo na elaboração de relatórios sobre as mudanças climáticas.

O diretor do IAG, que foi um dos revisores do último relatório (publicado em 2007), considera que alcançamos um nível desejável de troca de informações sobre previsões e impactos de mudanças climáticas em cada região do planeta. Contudo, não existe a mesma disposição por parte dos governos em disseminar descobertas tecnológicas para a mitigação desses fenômenos.