Com caso Estadão-Sarney, país se aproxima de outros países do continente na restrição aos meios de comunicação
O jornal O Estado de São Paulo completou 60 dias sob censura. As versões impressa e online estão proibidas de publicar reportagens que se refiram à “Operação Faktor” desde o dia primeiro de agosto.
A decisão do embargador Dácio Vieira, que censurou previamente o Estado, ocorre em um cenário de tentativas de cerceamento da imprensa. Entretanto, de acordo com Eugênio Bucci, colunista do jornal, esse caso se sobressai entre os demais. Para ele, a situação é mais grave por envolver um “tema central” da discussão midiática e, mais do que isso, por “seu caráter político”.
Segundo ele, o acontecimento foi recebido como uma agressão e traumatizou a redação do jornal. “Os reflexos desse episódio são sentidos por toda imprensa e pela sociedade porque fere o direito à informação”. Para Carlos Alberto di Franco, colunista e consultor do Estado, trata-se de um precedente perigoso de controle da imprensa. “A Constituição é explícita na defesa da mais absoluta liberdade de imprensa e expressão. A demora na manifestação do Tribunal de Brasília é um desrespeito à própria Constituição”.
O Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) afastou o desembargador por considerá-lo suspeito devido suas relações com a família Sarney. Contudo, a liminar aprovada por ele não foi suspensa. Bucci e di Franco vêem essa contradição com desconfiança. Para o primeiro, trata-se de uma estratégia para se ganhar tempo e “esfriar” as notícias enquanto corre na Justiça uma decisão que “não se sustenta”; para o segundo, é possível identificar “um toque de corporativismo”.
Tendência Latina
O caso Sarney-Estadão se dá em um período de perseguição à imprensa na América Latina. O jornal americano The New York Times em matéria intitulada “Latin American journalists face new opposition” usa o episódio como ponto de partida para discorrer sobre a onda de censura a jornalistas que acontece na região. Segundo o jornal, governos populistas que se elegeram prometendo ajudar os excluídos usam sua força para intimidar a imprensa. Além do Brasil, foram citados Argentina, Bolívia, Venezuela, Equador e Nicarágua.
Nos debates do fórum de emergência sobre Liberdade de Imprensa, em Caracas, o episódio de censura ao Estado foi lembrado e, mais uma vez, utilizado como exemplo de atentado à liberdade de imprensa.
Há quem discorde de que o Brasil se insere nesse contexto latino-americano de restrição das mídias. “O Brasil tem instituições sólidas e uma democracia em pleno funcionamento. Não é o que acontece nos países mencionados”, diz Di Franco. “Outros políticos, apoiados no precedente, tentarão procedimentos análogos. Estou certo, no entanto, que o Supremo Tribunal Federal porá fim ao abuso”. Esperança compartilhada por Bucci, que também aposta no potencial democrático do Brasil: “o caso Estadão-Sarney é infeliz, mas não se tornará regra”.
Líderes na ofensiva
“Fomos nós que ganhamos as eleições, não os gerentes desses negócios lucrativos chamados meios de comunicação.”
(Rafael Correa, Equador)
“Nenhuma liberdade pode ser ilimitada onde existe Constituição. Quem quer viver onde não há leis deve ir para a selva com Tarzan.”
(Hugo Chávez, Venezuela)
“Os meios de comunicação são a caixa de ressonância dos inimigos do projeto polular. Temos que vê-los como uma arma.”
(Daniel Ortega, Nicarágua)