Para cruspiano, porteiros são invasivos

Morador homossexual teria sido discriminado; membro da Amorcrusp alega delação

Dário Neto , morador do bloco C do Conjunto Residencial da USP (Crusp), alega ter sido discriminado por porteiro por sua orientação sexual. Segundo ele, o funcionário fez comentário ofensivo e de caráter moral-religioso enquanto ele passava pela portaria. “Ele levou a sério uma brincadeira que minha amiga fez sobre eu ‘entrar no céu’’ e respondeu com maldade. Reclamei para a Coseas, mas eles se limitaram a trocá-lo de bloco”, diz.

Para Dário, que é doutorando em Literatura Brasileira pela FFLCH e fundador do Grupo Prisma de diversidade sexual universitária, o preconceito por parte de alguns funcionários é grande. “Soube de casos em que porteiros barraram companheiros de gays, justamente por saber que havia laço afetivo entre a visita e o morador”, diz. Contudo, ele considera que, em geral, os porteiros são um grupo “bastante aberto” e amigável.

Privacidade

No conjunto residencial, a função do porteiro gera questionamentos. Para Maurício*, membro da Associação de Moradores do Crusp (Amorcrusp), os porteiros relatam para a Coordenadoria de Serviço Social (Coseas) detalhes da vida pessoal dos cruspianos, potencializando possível perseguição. “A Coseas tem o poder da concessão de bolsas e da sua permanência ou saída do Crusp. Se você, na concepção deles, não anda na linha, você perde esses direitos”, diz.

O porteiro recebe os telefonemas destinados aos moradores antes de lhes encaminhar. Além do controle das ligações, a correspondência tem de passar por ele antes de ir para o “escaninho” de cada apartamento. Os funcionários têm, ainda, de anotar o nome de qualquer visita que suba para algum conjunto.

Segundo Maurício, o porteiro anota o nome das visitas e sua relação com o residente, além dos horários de chegada e saída. “Isso é herança da ditadura, quando o Crusp foi foco de resistência aos militares. O regime militar acabou, mas essa política de vigilância não”, diz. Ele e outros moradores ouvidos contam que há despejo de hóspedes irregulares nas madrugadas, mas que a prática é negada em reuniões pela coordenadora da Coseas, Rosa Maria Godoy.

Anderson conta nunca ter tido problemas na portaria (foto: Yuri Gonzaga)
Anderson conta nunca ter tido problemas na portaria (foto: Yuri Gonzaga)

Altair Brito de Castro, porteiro há sete anos, diz que cruspianos se queixam quando ele pergunta o nome do acompanhante. “O morador chega com visita e não quer que o porteiro pergunte o nome. Mas eu preciso saber quem é: se dá um problema [com um visitante] e o supervisor vem checar se anotei o nome, esse problema vira meu”, conta. Anderson Roberto dos Santos, há oito anos exercendo a mesma função, alega nunca ter tido problemas. “Se aconteceu alguma coisa, eu não fiquei sabendo”, gaba-se.

A Coseas não se pronunciou sobre o assunto.

*nome fictício