O cronograma de aulas pode ser alterado para que o professor participe de congressos?

O trabalho de professor exige atualização constante e contato com outros estudiosos da área, o que em geral se dá pela participação em congressos, simpósios e palestras. Esta é uma prática que enriquece as próprias aulas de graduação. Porém,
a atividade de docente e pesquisador nem sempre é equilibrada, podendo levar ao descumprimento do cronograma de aulas e consequente diminuição do conteúdo.
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Cumprir o cronograma de uma disciplina é um acordo que existe com os alunos – entrevista com Júlio Cerca Serrão, professor da EEFE
A natureza da atividade do docente é conciliar as viagens e convites que recebe com as aulas – entrevista com Marco César Álvares, professor da FFLCH


Cumprir o cronograma de uma disciplina é um acordo que existe com os alunos

Júlio Cerca Serrão é professor da EEFE.

Jornal do Campus: Como o senhor adapta congressos e palestras no cronograma?
Júlio Cerca Serrão: Os congressos são programados com no mínimo um ano de antecedência. Então, eu não vejo razão para que a aula seja suspensa por conta deles. Tem-se condição plena de compatibilizar as duas coisas. O problema é que muitos colegas não valorizam as atividades docentes. Talvez seja esse o grande empecilho que faz com que alguns não consigam equilibrar as duas atividades.

JC: Caso esses congressos não tenham sido programados, como funciona para repor as aulas?
JCS: Os congressos mais importantes são tradicionais e em geral acontecem anualmente. Não existe congresso de última hora. O que acontece hoje é que, muitas vezes, temos atividades paralelas; por exemplo, surge uma reunião de conselho superior e sempre tem a possibilidade de repor essa aula com os alunos. É uma necessidade. Cumprir o cronograma de uma disciplina é um acordo que existe com os alunos. Qualquer prejuízo repercute na formação acadêmico-profissional deles, o que é intolerável.

JC: Isso se refere também ao surgimento de bancas?
JCS: As bancas são agendadas previamente. O que procuramos fazer é compatibilizar o horário delas com o das aulas. Eu marco na minha agenda as minhas aulas de graduação e, quando tenho convites para banca, o horário da aula de graduação obviamente não pode ser sacrificado, a banca tem que se ajustar a isso.

JC: Essas participações em eventos contam para a carreira do professor?
JCS: Infelizmente hoje, na Universidade, o que conta de fato é a produção acadêmica. A participação no congresso é um momento importante para fazer intercâmbio com outros pesquisadores, então acaba tendo uma repercussão indireta muito importante. Por isso, é louvável que os docentes participem de congressos, mas isso não pode ser feito em detrimento da participação nas atividades didáticas.

JC: Os congressos dos quais o senhor participa têm relação com sua linha de pesquisa e com as aulas que ministra?
JCS: A maioria dos congressos dos quais eu participo tem a ver com a minha linha de investigação. Então, eles repercutem positivamente no ensino de graduação, levando para os alunos as últimas discussões, uma perspectiva de desenvolvimento da área; é extremamente importante para um docente da graduação estar envolvido nesses congressos.

JC: É comum ter docentes que atrasam o cronograma pela participação em congressos e são substituídos por monitores?
JCS: Na EEFE isso não acontece, porque a participação nos congressos exige autorização do departamento. O docente deve explicar se as aulas serão repostas, se já estavam programadas para não acontecer. Isso varia da cultura de cada unidade. Na EEFE, não permitimos que o bolsista substitua o docente, porque o prejuízo é duplo: o aluno de pós-graduação, que está lá para aprender uma prática docente, fica abandonado e os alunos de graduação deixam de contar com a participação de um professor experiente.

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A natureza da atividade do docente é conciliar as viagens e convites que recebe com as aulas

Marco César Álvares é professor da FFLCH.

Jornal do Campus: O senhor acha que é certo o professor alterar o cronograma de aulas para comparecer a congressos ou a atividades acadêmicas?
Marco César Álvares: A primeira questão a ser colocada é que nós professores das universidades públicas em geral trabalhamos com ensino, pesquisa e extensão. Então se espera que os professores tenham essa atuação nas múltiplas dimensões. É comum que a pesquisa que o professor faz esteja refletindo na aula da graduação. É meio inconcebível um professor que não possa participar disso, ou que não estivesse na sua agenda eventos de extensão, científicos e palestras. Devemos cumpri-los com possibilidades de remanejamento e reposições, e não vejo nada de negativo nisso.

Jornal do Campus: Qual a relevância desses eventos para as aulas?
MCA: Nesses eventos você não só apresenta as suas pesquisas, mas acompanha o trabalho de outros pesquisadores daqui ou do exterior, além de ter acesso à bibliografia que está sendo produzida. Então tudo isso vai voltar para a sala de aula. Pode não voltar no dia seguinte, mas no próximo semestre ou em alguma outra pesquisa, tudo isso retorna de alguma forma. Em sala de aula você vai transmitir o conhecimento, mas esse não é um conhecimento estático. Sem dúvida alguma o motor da produção do conhecimento é a pesquisa.

Jornal do Campus: A linha de pesquisa do professor costuma tratar da mesma matéria ministrada por ele na graduação?
MCA: Isso varia muito, depende de unidade para unidade, de curso para curso. Na sociologia, por exemplo, nós temos disciplinas básicas em que o professor não dá aula daquilo que ele pesquisa, porque são disciplinas mais abertas. Mas quase sempre alguma coisa da minha pesquisa vai aparecer; seja algum autor que eu estou utilizando ou alguma pesquisa que eu possa citar. A aula ficaria bem mais empobrecida sem esse trabalho de pesquisa e de extensão que o professor faz.

Jornal do Campus: Em média, de quantos congressos o senhor participa por ano?
MCA: Em geral, participo de uns dois congressos por semestre. Mas eu até diria que, em termos de agenda dos docentes hoje em dia, tem também muita banca; às vezes tem uma banca por semana até. Você viaja não só aos congressos, mas também porque você vai participar de bancas de exames de mestrado e doutorado em outras instituições.

Jornal do Campus: Se um professor é convidado para um evento acadêmico na última hora, é válido faltar à aula para participar?
MCA: Eu não colocaria desse modo. Acho que não é válido faltar às aulas. O que o docente tem que fazer, porque é a natureza da sua atividade, é conciliar essas viagens e os convites que recebe com as aulas. Se vem um convite, por exemplo, com uma semana de antecedência para um dia de aula, eu não posso aceitar. Porque não há tempo hábil para marcar a reposição ou para avisar os alunos. O trabalho do docente, sabendo que ele tem que cumprir essas múltiplas atividades, é de conciliar, mas nunca deixando aberta a graduação.

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