Declarações de Lula não representam censura

Para especialistas, as recentes críticas do presidente à mídia refletem estratégia política, mas não ameaçam a liberdade de imprensa

Infográfico: Liberdade de imprensa no Brasil através dos tempos“Nós vamos derrotar alguns jornais e revistas que se comportam como partidos políticos. Nós não precisamos de formadores de opinião. Nós somos a opinião pública”. Essa foi uma das duras críticas feitas pelo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na “Declaração de Campinas”, feita em um comício no dia 18 de setembro.

Essas afirmações foram feitas logo depois que a Ministra da Casa Civil e sucessora da candidata Dilma Rousseff, Erenice Guerra, foi demitida da Pasta. Antes de sua demissão, uma série de reportagens revelou graves denúncias de irregularidades em torno dela.

Para muitos jornalistas e especialistas políticos, a reação de Lula não foi uma explosão, mas uma ação pensada. Alberto Dines, no Observatório da Imprensa, diz: “O radicalismo da ‘Declaração de Campinas’ tem lógica e justificativa: ao dar a mão à palmatória e levar em conta as denúncias da imprensa, afastando a ministra-chefe da Casa Civil, Erenice Guerra, o passo seguinte seria a desqualificação de jornais e revistas – sobretudo estas, causadoras da crise.”

O professor de Ética da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, Eugênio Bucci, possui a mesma opinião: “Ela começa pela necessidade de blindar a candidatura de Dilma Rousseff contra reportagens que possam minar o voto de confiança que ela vem recebendo nas pesquisas. Para isso, Lula caracteriza a imprensa como ‘partidos de oposição’. Ele iguala o discurso jornalístico ao discurso da oposição e, na sequência, conclama os eleitores a ‘derrotar alguns jornais e revistas que se comportam como partidos políticos’. Eis a fórmula da blindagem necessária. Portanto, o movimento teatral de Lula é estritamente racional, calculado. E faz sentido.”

Mídia dividida

A “Declaração de Campinas” provocou reações da imprensa. Em seu editorial “O mal a evitar”, o jornal Estado de S. Paulo se declara a favor do candidato José Serra e faz críticas pesadas a Lula e a “manutenção do poder a qualquer custo”. Também na seção editorial, a Folha de São Paulo repreende o presidente por suas afirmações, retoma a importância da imprensa em denúncias recentes e relembra que o jornal também foi prejudicial ao governo FHC. A revista Veja, em sua principal reportagem, trata do que entende serem riscos à democracia no País. Sua capa traz o título: “A liberdade sob ataque”.

Não foi toda a mídia, porém, que ficou contra o Governo. A revista Carta Capital disse que “em desespero” diante da possível vitória da candidata petista à presidência, Dilma Rousseff, a oposição “tenta evocar fantasmas do passado alimentada pela mídia”. Outra reportagem da revista, assinada pelo jornalista Mino Carta, diretor de redação, fala de “uma verdadeira tentativa de assalto à liberdade de imprensa”. Ainda no Observatório da Imprensa, Alberto Dines acusa o Estado de “transformar um embate episódico entre o governo e alguns veículos de comunicação numa confrontação política de grandes proporções e imprevisíveis conseqüências”

Bucci concorda que a democracia não está sob ameaça, mas pensa que o presidente errou em sua fala, pois o chefe de Estado não pode dar tais declarações. “O poder executivo concentra o poder do Ministério das Comunicações, que opera a concessão de todas as emissoras de rádio e TV no Brasil. Então, uma declaração dele, que seja generalizante, enseja esse tipo de conflito de interesses.”

A professora de Mariângela Furlan Haswani da disciplina de Marketing Político, também acha que o presidente está errado. “Ele está totalmente equivocado. Em primeiro lugar, a imprensa é uma instituição privada que ao longo da História se tornou ícone de Estado democrático. Países democráticos têm imprensas livres. A imprensa não é um partido político. Se ela tem uma linha editorial x, y ou z ela tem este direito.”
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