Opinião faz parte do jornalismo

Merece leitura o caderno especial sobre as eleições produzido pelo Jornal do Campus. É bom que o principal veículo de comunicação da mais importante universidade brasileira não tenha se furtado em trazer o debate para seus leitores. Além disso, a parceria com um instituto de pesquisa para verificar as intenções de voto foi importante para constatar, mais uma vez, algo que se sabe amplamente, mas não se quantifica: que a USP não é um naco representativo do Brasil.

Ao mesmo tempo, ao identificar que uma parte significativa da classe média urbana estava optando pela candidatura de Marina Silva, o jornal captou uma tendência que não aparecia em outras pesquisas – tendência que contribuiu para a ocorrência de segundo turno. O JC, contudo, não trabalhou isso como poderia.

Ou seja, faltou analisar dados, buscar opiniões plurais e, quiçá, antagônicas, que jogassem uma luz sobre a montanha de informação trazida. É função do jornalista não apenas reportar, mas também esmiuçar os números, conectá-los com a realidade, contextualizá-los, buscar interpretações diversas, tudo no intuito de informar melhor os leitores. Enumerar fatos não é suficiente, é preciso mostrar o que significam.

Opinião faz parte do jornalismo. O jornal poderia ter entrevistado cientistas políticos – na USP, temos um largo espectro de vozes que poderiam ser chamadas. E, mesmo dentro da redação, construir análises e avaliações – não é porque são estudantes de jornalismo que não escreveriam algo com profundidade. Provavelmente, o resultado seria muito melhor do que certas coisas picaretas que somos obrigados a ver, ouvir e ler no jornalismo brasileiro durante as eleições.

Em tempo: alguém me explique, por gentileza, o que são aqueles rabiscos de Dilma, Marina e Serra na capa do jornal, ilustrando o gráfico? Sugestão: se algo não tem qualidade técnica para ser publicado, não publique.

Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Cobriu conflitos armados e trabalhou em diversos veículos de comunicação, tratando de problemas sociais brasileiros. É atual coordenador da ONG Repórter Brasil. Fale com o ombudsman.