A legalidade e moralidade da demissão de funcionários aposentados da USP

A polêmica decisão da Reitoria de demitir 270 empregados aposentados, que continuavam exercendo suas funções, esbarra em questões administrativas, jurídicas e éticas. Os rumos desse embate influenciarão diretamente a qualidade acadêmica e técnica dos serviços prestados pela Universidade.
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É uma lógica que diminui custos em detrimento da qualidade de ensino e pesquisa – artigo de Magno Carvalho, diretor do Sintusp
A permanência de servidores aposentados é uma lógica funcional quando exceção – informações compiladas de artigos assinados por Antônio Dechen (Esalq), Gustavo Mônaco (FD-USP), Joel Dutra (FEA-USP), José Visintin (FMVZ-USP), Ricardo Silva (FAU-USP) e Sigismundo Neto (FEARP-USP)


É uma lógica que diminui custos em detrimento da qualidade de ensino e pesquisa

Magno Carvalho é diretor do Sindicato de Trabalhadores da USP (Sintusp)

Em outubro de 2010, havia um boato na USP de que o reitor João Grandino Rodas iria demitidos aposentados que continuassem a trabalhar. Uma sentença do Supremo Tribunal Federal (STF), porém, separa o conceito de aposentadoria ao de salário, permitindo ao funcionário ter as duas remunerações como fonte de renda.

A partir desta sentença,em 2007, a USP baixou uma portaria dizendo que o aposentado tem direito de optar se continua ou não trabalhando. Com isso, cerca de mil funcionários que estavam com tempo de aposentadoria e contribuição paga, se aposentaram e continuaram trabalhando.

Com o boato das demissões dos funcionários aposentados, o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) procurou o Prof. Joel Dutra, diretor do Departamento de Recursos Humanos (DRH) da USP. Na ocasião, o diretor Dutra negou a informação e enfatizou que não passava de boato. Também disse que o DRH pensava em um plano de demissões voluntárias para os funcionários aposentados, mas apenas em meados de março. Mesmo assim, em janeiro, 270 funcionários foram demitidos de uma só vez.

Foram dispensadas pessoas importantes para a Universidade. Como um casal de pediatras que trabalhava em Bauru, e que pesquisavam a Síndrome de Pierre Robin. Também foram demitidos experientes técnicos de laboratórios, o que compromete o andamento das pesquisas.

Na realidade, a reitoria está fazendo uma redução de custos. Um funcionário mais antigo, que tenha cinco quinquênios – um aumento de 5% do salário a cada cinco anos – é um funcionário mais de 25% mais caro que uma pessoa recém-contratada. Essa é a lógica dessas demissões. É uma lógica que diminui custos em detrimento da qualidade de ensino e pesquisa.

A Reitoria afirmou que desligou funcionários aposentados não concursados, mas pessoas que fizeram concurso público também perderam cargos, obrigando o órgão a readmitir 99 dos 270 demitidos. A USP possui funcionários públicos estatutários – vinculados ao regime da Lei Federal n°. 8.112 e contratados por concurso público – e celetistas, já que os concursos para servidores públicos na USP acabaram em 1974.

Até o momento, quatro funcionários de Campi do interior foram julgados separadamente e todos foram reintegrados. A Justiça considerou a Portaria da USP de 2007 e o fato de o STF dizer que o funcionário aposentado pode continuar em atividade sem caracterizar acúmulo de trabalho.

Em relação à orientação financeira e psicológica proposta pela Reitoria, nós, do Sintusp, a consideramos uma piada de mau gosto. Eu lhe demito e você entra numa crise psicológica por perder seu sustento, logo te ofereço assistência. É uma lógica absurda. Além disso, a assistência psicológica é dada por uma empresa privada, contratada pela Reitoria, e não pelos profissionais da própria Universidade. As demissões fazem parte do plano da Reitoria de sucatear e privatizar a Universidade.

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A permanência de servidores aposentados é uma lógica funcional quando exceção

Informações compiladas de artigos assinados por Antônio Dechen (Esalq), Gustavo Mônaco (FD-USP), Joel Dutra (FEA-USP), José Visintin (FMVZ-USP), Ricardo Silva (FAU-USP) e Sigismundo Neto (FEARP-USP)

Em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo e no boletim interno da USP – o USP Destaques – a cúpula da Reitoria justificou as demissões de 270 funcionários aposentados alegando a necessidade de renovação do quadro de trabalho e a transferência de conhecimento para os empregados mais novos.

De acordo com a reitoria, 10% do quadro de funcionários da USP estavam aposentados no final de 2010. Segundo suas projeções, este número saltaria para 25%, até 2014. Com isso, no momento em que o quadro antigo da Universidade fosse substituído por razões naturais, não haveria trabalhadores aptos e treinados para substituí-lo, com prejuízo para a realização dos objetivos próprios da Universidade. Logo, foram desligados os funcionários que solicitaram a aposentadoria pelo INSS e continuaram trabalhando na Universidadee que se encaixavam dentro dos critérios estabelecidos pela reitoria.

Os profissionais aposentados que foram demitidos não eram concursados e não ingressaram no serviço público após 4 de junho de 1998 – data da Emenda Constitucional nº 19. Isso demonstra que a decisão se baseou em critérios isonômicos, que não levaram em consideração os níveis de carreira – básico, técnico ou superior – aos quais os funcionários desligados pertenciam.

As decisões tomadas foram norteadas pelos princípios da legalidade, da impessoalidade e da isonomia, preservando-se o pessoal estável no serviço público, mesmo que temporariamente. A reitoria entende que a possibilidade de permanênciade funcionários aposentados, permitida há alguns anos, é lógica e funcional quando é uma exceção. Mas é inviável quando se torna regra, como vinha ocorrendo.

Segundo artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, a reitoria afirma que as decisões judiciais, mormente as do Supremo Tribunal Federal (Adins 1.721-3 e 1.770-4), foram respeitadas e acrescenta que a administração atual não pretende efetuar mais nenhum desligamento em razão de aposentadoria. Desligar os funcionários foi como “um corte na própria carne”, já que havia pessoas de grande valia para a Universidade.

De acordo com informaçõesda reitoria, existiam pessoas que ingressavam na USP e, em menos de dois anos, entravam com o pedido de aposentadoria e continuavam na ativa. Muitos solicitavam suas aposentadorias junto ao INSS unicamente para obter um ganho adicional. Ressalta-se que a USP agiu dentro da lei e efetivou o pagamento dos direitos trabalhistas dos dispensados, inclusive verbas rescisórias e 40% da multa do FGTS sobre o tempo trabalhado, antes e após a aposentadoria.

As demissões aconteceram porque seus administradores não consideram a omissão como hipótese possível, por não quererem a reprovação de 40 milhões de paulistas que financiam a universidade; nem condenação cível ou penal por omissão.

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