“O aumento [da tarifa] é maior que o dos insumos do transporte”, diz Marta Suplicy, ex-prefeita de São Paulo

Em resposta ao aumento da tarifa em São Paulo – R$ 2, 70 para R$ 3,00 – e a questionamentos sobre a qualidade do transporte público, a ex-prefeita da cidade,  Marta Suplicy, fala ao Jornal do Campus
(foto: Geraldo Magela/Agência Senado; fonte: Assessoria de Comunicação da Senadora Marta Suplicy – PT-SP)
(foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

Jornal do Campus: O que a senadora acha do atual aumento de 11, 11% (R$ 2,70 para R$ 3, 00) da passagem de ônibus em São Paulo e das justificativas para esse aumento que constam na planilha orçamentária da prefeitura?
Marta Suplicy: Nos últimos anos, São Paulo tem convivido com reajustes bastante significativos nas passagens. Reajustes desproporcionais aos dos insumos do transporte e maiores que os observados em outras cidades da Grande São Paulo ou de Campinas, por exemplo. O aumento da passagem do ônibus em São Paulo foi maior, inclusive, que o observado no metrô e na CPTM. Com esse aumento desproporcional, o que vimos foi um crescimento maior no movimento de passageiros na rede de metrô e da CPTM do que na rede de ônibus. Isso porque as pessoas vão onde encontram um custo menor. Além disso, se você diminui o número de usuários do transporte, a pressão por novos reajustes aumenta, porque aumenta o custo do sistema, diminui-se o número de passageiros e também a receita. Na capital, quando implantamos as mudanças no transporte metropolitano, conseguimos aumentar de forma significativa a utilização, levando ônibus a mais lugares e garantindo melhor eficiência. Agora, o aumento da tarifa de forma significativa e sem vantagens significativas leva à diminuição da utilização do transporte público e ao debate em torno dos reajustes.

JC: A senadora acha que as passagens chegariam a esse preço se fosse sua gestão na prefeitura?
Marta Suplicy: Não chegaria. Em primeiro lugar, porque eu teria continuado a série de investimentos no transporte público, sobretudo a criação de corredores. O Serra e o Kassab não investiram em corredores.  Quando você faz isso, além de agilizar o serviço, você aumenta a utilização, porque dá mais rapidez, qualidade e, obviamente, aumenta a demanda, mais usuários utilizam e você tem mais receita, o que diminui o custo do sistema e implica em reajustes menores. Sem contar que os ônibus se deslocariam mais rapidamente pela cidade e causariam menos congestionamentos.

JC: Durante a sua gestão na prefeitura de São Paulo, tarifa do ônibus também aumentou de R$ 1,40, em 2001, para R$ 1,70, em 2003, chegando a R$ 2,00 no início de 2005, já depois de sua gestão. Na época, o que justificava os aumentos?
Marta Suplicy: Houve um processo de reestruturação integral da rede de transporte que aconteceu ao longo de toda nossa administração. É preciso considerar que, ao assumir a Prefeitura de São Paulo, nos deparamos com uma situação de informalidade, onde não havia um regulamento vigente para as empresas de ônibus. Demos início ao processo de reestruturação e isso fez com que aumentássemos a oferta de ônibus, oferecendo veículos maiores e substituindo vans ilegais por microônibus. Tudo isso fez com que os ônibus passassem a chegar a lugares aonde antes não chegavam. Fizemos a maior renovação da frota de ônibus que São Paulo já teve. E quando você substitui ônibus velho por ônibus novo, aumenta o custo do sistema e isso tem impacto na tarifa. Houve também um aumento do que podemos chamar de cesta básica do transporte, com reajustes no combustível e na manutenção, por exemplo. Por último, a implantação do Bilhete Único significou que aquelas pessoas que pagavam duas ou três passagens para fazer um único deslocamento, pagassem uma única tarifa, e isso tomando quantos ônibus necessitassem. Ou seja, embora o valor da passagem nominal tenha subido nesses termos em nossa administração, o que aconteceu foi que a população acabou sendo beneficiada com o Bilhete Único, pagando menos pela passagem. Foi uma revolução.

JC: O que proporia para que as frotas de ônibus garantissem o acesso a locais culturais e de estudos que hoje movimentos sociais enxergam como pontos cegos da cidade, como a Cidade Universitária (USP), por exemplo?
Marta Suplicy: Precisaríamos de uma análise para verificar se esses são realmente “pontos cegos” da cidade ou se é um problema de oferta de transporte abaixo da demanda atual. Na nossa gestão, esses não eram pontos cegos. Tanto a Cidade Universitária (USP) quanto o Parque do Ibirapuera são regiões extremamente populosas e sempre tiveram alta demanda. Aumentamos muito a oferta de ônibus em São Paulo e criamos linhas para lugares onde os ônibus não chegavam anteriormente. Hoje, a cidade tem mais de 1.200 linhas de ônibus, precisaríamos de uma análise técnica para poder afirmar, com certeza, se de fato existem pontos cegos em São Paulo. Se eles realmente existirem, o único caminho possível é aumentar a oferta levando mais linhas até esses lugares.

JC: Qual a avaliação que faz das mudanças inseridas no sistema de Bilhete Único após sua gestão na prefeitura de São Paulo?
Marta Suplicy: No final da nossa gestão, deixamos pronto um projeto de integração total da rede de ônibus, que incluía além do metrô e da CPTM, também o sistema de ônibus da EMTU. A exemplo do que acontece em grandes cidades do mundo, o transporte precisa ser totalmente integrado e garantir a oferta de condições de integração dos bilhetes para estudantes. A prefeitura precisa atrair mais usuários para o transporte coletivo. Só isso garantirá uma maior arrecadação e aumentará as possibilidades de investimentos sem a necessidade de reajustes exorbitantes.

JC: Acha que seria possível a integração plena entre Metrô – Ônibus para os estudantes?
Marta Suplicy: Entendo que não existe meia integração. Integração é integração. É total, é para todos. Se essa integração fosse efetivamente implantada, todo cidadão teria garantido o direito a uma única passagem. Consequentemente, o estudante também seria beneficiado. Esse é o procedimento.

JC: Por fim, a senhora tem acompanhado as manifestações dos jovens paulistanos contra o aumento das passagens dos transportes públicos na cidade?  Qual a sua opinião a respeito?
Marta Suplicy: A sociedade civil tem garantido o seu direito de protestar, sobretudo em situações onde considerar que sofreu abusos, como acontece no caso dos reajustes no valor da passagem ou nas mudanças no Bilhete Único. O que acontece na passagem de ônibus em São Paulo é que o aumento do custo é maior que o dos insumos do transporte e desproporcional ao observado no metrô e na CPTM. A mobilização da sociedade em torno de assuntos do seu interesse é sempre justa e correta e deve ser respeitada.