“Minhas ideias são muito, anos-luz superiores!”

Lobão polemiza sobre música, Alice Cooper e ditadura, desqualificando a esquerda e a direita do Brasil em palestra na USP

A intenção era falar sobre a autobiografia 50 anos a mil. Porém, em palestra realizada na Escola Comunicações e Artes, no dia 7 de junho, o cantor Lobão enveredou pela história, política e o panorama musical brasileiro, mesmo quando perguntado sobre aspectos do livro. “Quando estava escrevendo, vi que muitas questões que vivi ainda não tinham sido resolvidas. O Brasil tem muito problema antigo e não basta seguirmos na mesma direção que estamos. Não vai dar certo”.

Na abertura da palestra, o jornalista e professor Claudio Tognolli, especializado em psicanálise, ressalta que desde o lançamento do livro, Lobão vem sendo ator de citações polêmicas, muitas vezes descontextualizadas na imprensa. No entanto, um dos espectadores da palestra consegue dar a exata dimensão da dificuldade dos jornalistas que fazem matérias com falas de Lobão, ao dizer em tom amigável no final: “cara, mas você fala muito”.

Por duas horas o músico respondeu às perguntas, que sempre tinham que ser feitas interrompendo sua fala, pois os assuntos iam se conectando um ao outro e pouca coisa se concluía. A única palavra de ordem é: “isso tudo aqui tá ainda pra se resolver”.

Lobão, sempre polêmico, se orgulha de nunca ter sido universitário (foto: Ana Maria Madeira)
Lobão, sempre polêmico, se orgulha de nunca ter sido universitário (foto: Ana Maria Madeira)

Jornal do Campus: Você disse recentemente em palestra no Festival da Mantiqueira que os militares defenderam nossa soberania no regime militar. Mas você discordou do tom da matéria do jornal Folha de S. Paulo que publicou essa fala sua. Afinal, o que você quis dizer com isso?
Lobão: Eu não falei nada disso. Eu tô falando justamente que a esquerda tem dois pesos e duas medidas. Eu fiz uma história bem provocativa. Eu estava criticando pontualmente a Comissão da Verdade, que quer distinguir o terrorismo de se arrancar uma unha do terrorismo de se sequestrar um embaixador. Eu exijo uma equanimidade de julgamento entre esses dois lados. A direita e a esquerda se merecem: porque são retrógradas, nacionalistas ressentidas, muito iguais.

JC: Você não costuma ter problemas para falar do que você não gosta na música brasileira. Mas o que você curte?
Lobão: Mas eu falo, eu sou o cara que mais apóia artistas novos no Brasil. Por exemplo, BNegão, Mombojó, Wander Wildner, Cachorro Grande, Canastra, Cascadura, Bidê ou Balde, eu mesmo, Arnaldo Baptista. Então essa coisa de dizer que eu falo mal de todo mundo é uma babaquice.

JC: Há alguns anos você apoiou o projeto da lei de criminalização do jabá nas rádios. Você precisa do jabá para sobreviver?
Lobão: Eu ajudei a redigir o projeto! Aí eu falei com o Gilberto Gil, ministro na época e ele falou “é coisa de brasileiro”. Aí arquivou o projeto. E todos nós dependemos do jabá, se você quiser tocar, você tem que pagar. Eu vou pagar até criminalizarem, eu que não vou ficar fora dessa festa. As pessoas têm que encarar que o jabá é a pior maneira de censura.

JC: Recentemente, o Brasil recebeu shows do roqueiro Alice Cooper. Você acha que ele ainda traz inovações, mesmo se apresentando há 50 anos?
Lobão: Eu acho que ele continua muito novo, ele continua chocando, inspirando a Lady Gaga, super atual. É que a gente tem a mentalidade de achar que velho não pode gostar de rock. Eu tenho um monte de ex-fãs meus, meio quarentões, que falam “ah, quando eu era jovem eu ouvia você”. A gente tem uma baixa-estima de que “se chegou aqui no Brasil não deve ser legal”. Não é assim, cobrar inovação? Se você pegar o Alice Cooper com tudo o que ele fazia nos anos 70, tá muito a frente de qualquer coisa que já se fez aqui no Brasil. No show dele, você tem uma aula de rock´n roll clássico.