Partindo do Alzheimer, espetáculo retrata a memória humana no TUSP

Fotos, objetos, histórias, lembranças, quais memórias não queremos nunca esquecer? Quais não queremos lembrar? Partindo de tais perguntas a Cia. Hiato constituiu a dramaturgia da peça “O Jardim” que estreou na última quinta feira no Teatro da USP (TUSP).

O Jardim explora a memória humana tanto na forma como no conteúdo da peça (foto: Divulgação)
O Jardim explora a memória humana tanto na forma como no conteúdo da peça (foto: Divulgação)

O espetáculo narra 80 anos da vida de uma família dividida em três momentos. O primeiro acontece em 1938, trata-se da separação de um casal, Fernanda e Thiago. O segundo é em 1979, o público acompanha o mesmo Thiago mais velho com as duas filhas: Maria Amélia, que está grávida e Luciana. Elas estão levando o pai que está com Alzheimer para um asilo. Por último, já em 2012, Aline, filha de Maria Amélia, encontra-se na mesma casa que se passaram as outras duas cenas. Aline e sua empregada, Paula, estão sofrendo uma desapropriação da casa do jardim, que perpassou as três gerações. Durante as cenas elas relembram as memórias do lugar.

Ao invés de apresentar essa história de forma linear, o grupo buscou aproximar o espetáculo da estrutura da memória. “O público tem que lidar com a memória dele também, a gente tem um espaço único dividido em três áreas diferentes, as cenas acontecem simultaneamente, dependendo de onde você senta, você tem acesso a uma cronologia diferente”, explica o diretor Leonardo Moreira.

Para criar o espetáculo, o grupo visitou casas de repouso, aonde entrou em contato com pacientes de Alzheimer. Ao entrevistar essas pessoas, a Cia. Hiato enriqueceu o material sobre memória que trabalharia na peça, o que permitiu que o tempo inteiro a memória dos personagens e do telespectador fossem exploradas.

Assim, na medida que as cenas acontecem as caixas de papelão que dividem o cenário vão caindo e os atores trocando os espaços que estão encenando. “Os tempos se cruzam, o público tem que lidar com o fragmento, com a perda ao escolher o que ouvir ou ver dessa estrutura, desses 80 anos concentrados em um só lugar, esse lugar de memória”, complementa o diretor.

Cia. Hiato

A companhia existe desde 2007 e esse é o terceiro trabalho do grupo. Desde o primeiro as deficiências aparecem nas dramaturgias de Moreira. “A deficiência na verdade é só um pretexto para a gente falar da diferença” explica o diretor, “eu estava procurando uma nova linguagem teatral, queria encontrar outras formas de comunicação e ver como isso se refletia na forma dramática”, complementa.

O nome do grupo veio do espaço que existe entre o que se fala e o que se compreende. Esse espaço que faz com que realidade se confunda com ficção a todo tempo. Dessa forma, o diretor valoriza muito o material biográfico dos atores. Isso se reflete na última peça do grupo, na qual a personagem grávida, estava realmente grávida no processo de criação, a separação do casal foi inspirada na separação vivida pelo diretor.

Leonardo acredita que, no teatro, devido a direta relação com um público como “porta voz” de uma narrativa, é importante explorar na dramaturgia o material que o ator carrega consigo. “Acho que todo processo artístico é muito pessoal, principalmente no teatro, o ator está na minha frente, presente”, explica o diretor.

Serviço

Peça “O Jardim”
Quando? 2 a 26/08 – quintas a sábados, 21h, e domingos, 19h
Onde? Teatro da USP – Rua Maria Antônia, 294, Consolação
Quanto? R$20,00 (inteira) e R$10,00(meia-entrada)
Tel: (11) 3091-4376