Ser a primeira é ser a melhor de verdade?

A USP subiu 20 posições no ranking mundial de universidades do instituto QS e é a primeira do Brasil. Especialistas discutem os critérios de avaliação utilizados nestes ranqueamentos e sua influência nas instituições de ensino.
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Acredito que a USP seja realmente a melhor universidade do Brasil – entrevista com Maria Stela Graciani
Não estamos idealizando um modelo perfeito para se copiar – entrevista com Elizabeth Gibney


Acredito que a USP seja realmente a melhor universidade do Brasil

Maria Stela Graciani é doutora em educação pela USP e professora titular da PUC-SP. Especialista em análise de qualidade de ensino e avaliação de critérios educacionais.

Jornal do Campus: Como acontece a avaliação das universidades e a elaboração dos rankings?
Maria Stela Graciani: Tem uma comissão de professores que vão até as universidades e avaliam os cursos minuciosamente em termos da infra-estrutura, das áreas do conhecimento, dos seus docentes e gestores. Além disso, verifica-se a existência de um projeto político-pedagógico e o processo de pesquisa e extensão universitária. Eles têm que estar intimamente organizados e entrelaçados para o ensino dessa universidade.

JC: Como a senhora encara os critérios utilizados para essas avaliações?
MSC: Aqueles que avaliam as universidades têm sido profundamente rigorosos enquanto indicadores. Eles têm uma atualização e uma contemporaneidade muito semelhante ao que se ensina na administração, no terceiro setor, na várias instituições públicas e privadas, empresariais ou comerciais, etc. para chegarem a essa conclusão. Há certa rigidez em relação a esses critérios, tanto do ponto de vista qualitativo quanto do ponto quantitativo.

JC: Existe validade e precisão nesses critérios?
MSC: Com certeza, porque a avaliação qualitativa parte da natureza das atividades desenvolvidas, da participação efetiva não só na sala de aula, mas nas atividades de extensão universitária. Do ponto de vista quantitativo, quantas áreas do conhecimento hoje têm produzido resultados para a melhoria da qualidade da vida da população, para uma administração mais eficiente, para uma arte democratizada. Há um caráter interdisciplinar, porque se vê todas as áreas do conhecimento no seu conjunto.

JC: A senhora concorda com os rankings divulgados que apontam a USP como a melhor do Brasil e 139ª do mundo?
MSC: Tenho visto não só a qualidade, mas a diversidade de opções diárias do conhecimento e da qualidade contemporânea das várias línguas que trazem contribuições à produção diária diversificada da Universidade. Acredito muito que a USP seja realmente a melhor universidade do Brasil. Isso serve para o que acontece na Universidade e também para aqueles que vão fazer uso desse conhecimento quando estiverem operando já formados.

JC: Em relação às universidades de outros países, em que patamar está o nível de ensino da USP?
MSC: Essas universidades que estão nas posições acima da USP já têm um tempo de quase 300, 400 anos, como as universidades da França, da Alemanha, dos Estados Unidos, que são mantidas por empresários que se interessam pelo conhecimento para a manutenção dos seus negócios. As universidades do Brasil, estatais ou particulares, têm uma dificuldade orçamentária bastante significativa na medida em que têm de dividir o bolo.

JC: Quão relativos podem ser tais rankings, já que eles avaliam as universidades em termos gerais e posicionam-na como um todo, sem considerá-las como um espaço composto por faculdades e unidades diferentes?
MSC: Os pequenos “feudos” de áreas do conhecimento têm uma produção muito interna, para dentro da unidade, e muitas vezes para fora sem passar pelo conjunto de discussões e debates da própria universidade. O que nós precisamos, no fundo, aperfeiçoar, é a interação orgânica entre as áreas do conhecimento para ter mais domínio sobre a real produção e o benefício que a sociedade está tendo. Se fosse pluralizada, a avaliação seria muito mais interessante do que esta unificação do ranking, que não têm nenhum interesse, a não ser o científico.

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Não estamos idealizando um modelo perfeito para se copiar

Elizabeth Gibney é repórter da revista Times Higher Education (THE), da Inglaterra, responsável por realizar o World University Ranking. Ela virá à USP para o Simpósio Internacional sobre Rankings Universitários e Impacto Acadêmico na Era do Acesso Aberto.

Jornal do Campus: Quais são as principais metas que orientam os rankings?
Elizabeth Gibney: Nossa primeira responsabilidade é com a comunidade acadêmica, para que eles possam beneficiar-se dos rankings de alguma maneira, seja quanto à mobilidade de aptidões, moldando oportunidades de pesquisa ou planejamento estratégico. Mas é claro que os rankings evoluíram com o tempo e também se tornaram massivamente populares como uma ferramenta estudantil e de consumidores.

JC: Os rankings são convites para melhorar as universidades? Ou elas ficam confortáveis com boas colocações?
EG: Os rankings conduzem a melhorias, com certeza. Inclusive acho que são mais interessantes para a dinâmica de instituições em desenvolvimento. Veja, por exemplo, o Brasil investindo mais de seus recursos econômicos em inovação e pesquisa, o que se reflete nos rankings. Olhamos o impacto e os resultados assim como as iniciativas, então não se pode confiar apenas em reputação e herança. Os rankings são uma grande barreira contra a complacência.

JC: Focar-se na relevância internacional poderia desviar a universidade de questões nacionais de ensino, como infraestrutura e problemas de graduação?
EG: É importante notar que o World University Ranking (WUR) da THE foi feito para analisar universidades que são competidoras globais e focadas em pesquisa – um tipo muito específico de instituição. Há espaço para instituições focadas no âmbito nacional, que satisfazem necessidades locais e habilidades prioritárias. Porém, num país tão grande quanto o Brasil, também há lugar para protagonistas globais genuínos, que tem de colaborar com as melhores universidades da América do Norte, Europa e Ásia. Essa relevância internacional é importante. Mas não estamos dizendo que toda universidade deve ser igual, ou que toda universidade deveria buscar uma posição no ranking mundial. Cabe a cada universidade decidir qual é sua missão.

JC: O que você pensa que deveria ser prioridade: pesquisa científica ou ensino?
EG: O tipo de universidade que avaliamos é o das orientadas por pesquisa científica, então damos mais peso a esses indicadores. Entretanto, é aceito que mesmo as maiores instituições de pesquisa do mundo possuem uma responsabilidade clara de ensinar, então foi colocado um peso significativo nos indicadores de ensino. Mas no mundo que estamos observando, a pesquisa é realmente uma prioridade. Não estamos idealizando um modelo perfeito para cada universidade copiar, mas sim a melhor universidade com foco em pesquisas.

JC: Você acredita que tem se usado os rankings mais como marketing, ao invés de avaliação da qualidade?
EG: Sem dúvida se tornaram ferramentas poderosas de propaganda. A questão é que tudo bem se os rankings usados para seu marketing são estáveis e com fundamento. Eles podem criar ou destruir a reputação da universidade. O perigo é que há tantos rankings que qualquer universidade pode ser muitíssimo bem avaliada. Isso deixa as instituições vulneráveis a mudanças e a metodologias e análises fracas.

JC: Quais as expectativas para sua palestra na USP?
EG: Estou esperando um debate aberto com a comunidade universitária sobre suas necessidades e preocupações. Espero estar apta a ouvir e receber o máximo possível de feedback e colaborações, porque queremos que os rankings sejam realmente valiosos.

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