Isadora Szklo (4º semestre de Letras)

Jornal do Campus: Como você chegou a descobrir quem era a menina que havia sido agredida pelo Guarda, na madrugada da última quinta-feira?
Isadora: Hoje em dia há muita troca de informações pela internet, especialmente pelo Facebook. Ficamos sabendo que na festa de sexta-feira uma menina havia entrado em confronto com a guarda, e espalhamos mensagens por grupos no Facebook tentando descobrir quem ela era. Não foi até segunda-feira, dia 5, que isso foi descoberto. Eu estava na reunião aberta do Sintusp para discutir o abuso dos policiais na São Remo e descobri lá quem era a menina e fui direto falar com ela sobre o assunto.

JC: A menina foi empurrada pelo guarda e chamada de “Nóia” e “Vadia”. Como o Coletivo Feminista de vocês, o Marias Baderna, se posiciona frente a esse e outros tipos de conduta machista em espaços públicos?
I: Então, pelo que me parece, ela foi só chamada de “nóia”, e não de “vadia”, ela mesmo me disse. É difícil se posicionar nesses casos, precisamos ser estratégicas e evitar agir com a cabeça quente. Há meninas no Coletivo que são a favor do escracho imediato, eu particularmente não sou. Prefiro um enfrentamento com discussões e questionamentos antes, muitas vezes assim, a gente consegue explicar porque os atos são machistas. Infelizmente, quando a conduta machista parte de autoridades como a Guarda Universitária, a gente fica com as mãos atadas. O máximo que podemos fazer é oferecer apoio as mulheres agredidas, soltar notas e realizar discussões sobre o assunto. Mas o mais importante é que acima de tudo acreditamos na auto-organização feminina. Já tivemos que agir de forma mais radicalizada – como quando interditamos a mesa de sinuca ou quando juntamente com a Frente Feminista da USP, agimos em uma festa machista da POLI – mas também já resolvemos muitos assuntos pela discussão. É importante que não deixemos a sociedade achar que esse tipo de coisa não acontece, ou se acontece, é comum. Não é. Não deixamos atos machistas passar.

JC: Quais são os tipos de violência contra a mulher que vocês escutam reclamações com mais frequência?
I: Estamos agora entrando em um processo muito bacana que é o processo de reconhecimento enquanto Coletivo no curso de Letras. Começamos a nos organizar no começo de 2010, nosso Coletivo ainda é muito novo. Apesar de divulgarmos bastante, muita gente não sabe da nossa existência enquanto organização. Nos últimos tempos, várias mulheres, inclusive trabalhadoras do prédio vieram nos procurar. Ficamos muito felizes com isso, mostra que rola uma identificação entre as mulheres e o Coletivo. Infelizmente, o que essas mulheres tem pra nos dizer é triste. Temos recebido muitas meninas que se queixam do problema do assédio no transporte público, e é impressionante como toda mulher já passou por uma situação no mínimo constrangedora nesse ambiente. Mas os casos tem sido sérios, inclusive de agressão física no metrô. Pra gente, isso é só uma das evidências da cultura machista, já que na nossa sociedade, esse tipo de coisa passa como comum – inclusive na TV – e a mulher tem que se acostumar.

JC: Na segunda-feira, às 18h, o Coletivo de vocês realizará um evento entitulado “Assedio Sexual não é piada”. O que as motivou para criar um evento com essa temática?
I: Então, o que nos motivou foi justamente a resposta da outra questão. Muitas mulheres tem nos procurado alegando terem sofrido assédio no transporte público. O nome da atividade é “Assédio Sexual Não É Piada: A Violência Contra a Mulher no Espaço Público” justamente para que possamos abarcar questões mais abrangentes, que dizem respeito ao que acontece com a mulher na rua, na faculdade, na internet… Queremos dar um enfoque também a questão racial, já que sabemos que as mulheres que mais sofrem com isso são negras. Sabemos inclusive, que na mídia, trata-se do assunto como piada, a exemplo do Zorra Total, que tem um quadro onde uma mulher negra extremamente estereotipada é assediada no metrô, mas aceita e dá risada porque sabe que é feia. Pode parecer inofensivo, mas esse tipo de comportamento acaba se refletindo nas mulheres, o que é bem preocupante.

JC: Na opinião do coletivo, porque é importante que o machismo seja cada vez mais discutido pela sociedade?
I: É importante por mil motivos. Começamos a nos organizar enquanto coletivo pois já estávamos fartas da opressão contra a mulher. O feminismo é realmente revelador. A partir do momento que a mulher passa a entender o que é o movimento, quais são suas pautas, pra que e a quem serve nossa luta, estudar o movimento, ela passa a encarar o feminismo como forma de libertação. É engraçado como a gente passa a enxergar tudo de outra forma, o que nos faz muitas vezes parecer neurótica, mas na verdade, é só uma ânsia pela mudança.

Gostamos de dizer que o feminismo nunca matou ninguém, mas o machismo mata todos os dias. Os números não nos deixam mentir, pesquisas comprovam que a cada 12 segundos uma mulher é assediada ou violentada no mundo. Isso tudo acontece por um motivo, não é por acaso. Na sociedade machista, a mulher é vista como objeto, e isso se põe em prática de diversas maneiras, inclusive nas que parecem mais inocentes, como quando estamos andando na rua e os homens se sentem no direito de falar absurdos sobre nós, ou quando nossos namorados nos controlam, quando um homem nos constrange no ônibus, quando você é ensinada a competir com outras mulheres, quando você é obrigada a seguir um padrão de beleza, quando o Estado controla seu útero… Exemplos não faltam. No Brasil, uma pesquisa realizada pela Fundação Perseu Abramo revela que 1 em cada 5 mulheres já sofreram violência doméstica. O ódio contra a mulher, em pleno século XXI, se demonstra ainda muito alarmante.

Precisamos discutir esse assunto com homens e mulheres para que possamos ser igualmente livres. O feminismo muda vidas, somos todas provas vivas disso. Convido a todas para conhecer o feminismo e o Coletivo Marias Baderna pra mudar a vida também.