Alunos de escola pública ainda são minoria na universidade

O número de alunos vindos da rede pública que ingressaram na USP neste ano não teve crescimento significativo se comparado ao ano anterior. Segundo dados divulgados em abril pela Pró-Reitoria de Graduação da USP, o índice de estudantes que cursaram escolas públicas (EPs) e foram aprovados no vestibular da Fuvest cresceu de 28,03% para 28,5%.

Telma Zorn, Pró-Reitora de Graduação, explica a insatisfatoriedade do índice: “Um provável motivo está relacionado com o fato da proporção de inscritos na Fuvest ainda não traduzir a relação entre o número de alunos matriculados nas EPs e o número daqueles matriculados nas escolas privadas”. Em 2013, dos 159.600 alunos inscritos na Fuvest apenas 55.860 (35%) são egressos de EPs. Sendo assim, o aumento de inscritos foi de 1,5% e o de aprovados apenas 0,47%.

Com o Programa de Inclusão Social da USP (Inclusp), o aluno que cursou todo o ensino médio em escola pública pode obter inscrição gratuita no vestibular, bônus na nota e, caso seja aprovado, pode contar com bolsas de apoio e incentivo para auxiliar sua permanência na universidade.

Ocimar Alavarse, professor da Faculdade de Educação (FE), critica programas como o Inclusp: “É uma medida muito tímida que incide apenas residualmente no problema”. Alavarse coordena o Grupo de Estudos e Pesquisa em Avaliação Educacional (Gepase). Segundo o professor, as cotas para alunos de EPs são medida de justiça, contudo resolvem apenas parte do problema.

Defasagem

A disparidade socioeconômica e cultural do corpo discente da universidade se reflete na vida dos estudantes. É o que conta o aluno de Letras, Daniel Salermo. “O conceito de aula em que as pessoas entram numa sala e são plateia de uma exposição teórica me era totalmente fora do comum, o que é irônico para alguém que já tinha passado onze anos frequentando instituições de ensino”. Salermo estudou somente em EP e ingressou na USP sem fazer cursinho preparatório. “O resultado disso foi uma grande dificuldade de adaptação, com notas baixíssimas e reprovação no primeiro semestre”.

O aluno vê problemas nos critérios da universidade: “Já que o sistema de concessões de benefícios da USP é baseado numa “meritocracia”, me tornei, logo de cara, um aluno que não se enquadraria nas seleções da maioria desses benefícios, algo que me acompanhará durante toda vida acadêmica.”

Salermo também critica a mentalidade do ensino público: “Parece que a escola pública se conformou com o fato de que a universidade não será uma realidade para seus alunos. Jamais ouvi qualquer professor ou palestra incentivando nosso ingresso numa universidade”.

Segundo ele, há um sentimento de incompatibilidade: “Como estudante da USP vindo de escola pública, me sinto como alguém que não deveria estar aqui, tanto por parte das escolas que me formaram, quanto por parte da universidade”.

Maior diversidade

Alavarse questiona a situação atual da universidade. “A USP se configura como uma instituição elitista. A universidade é um bem público, e deve se distribuir com justiça”. Segundo ele, há que se atentar para a característica dos alunos. “É ótimo querer formar pessoas com excelência profissional, mas há um problema se essas pessoas são todas da elite da sociedade”.

Para o professor, receber maior diversidade de alunos melhorará a qualidade da USP. “Alunos de diferentes camadas sociais vão proporcionar democratização e uma série de desafios”.

A pró-reitora espera que o índice de alunos do ensino público na universidade aumente. “A USP vem se empenhando em alcançar essa diversidade por meio da criação e aperfeiçoamento continuado de seu Programa de Inclusão Social”.