Entrevistas na íntegra para “As assembleias estudantis são representativas?”

Reproduzimos na íntegra as entrevistas realizadas para a a matéria “As assembleias estudantis são representativas?”. Os entrevistados foram Gabriel Lindenbach, estudante de Geografia e diretor do DCE; Luisa D’Avola, estudante de Letras, diretora do DCE; João Abreu, estudante de Economia, presidente do CA da FEA e Márcio R. Becker Góis, estudante de Filosofia, moderador de grupo no Facebook que faz assembleias online.

Gabriel Lindenbach, 21 anos, estudante de Geografia, diretor do DCE

1 – Na sua opinião, por que a maior parcela dos estudantes da USP participa tão pouco das assembleias? Falta interesse político ou é um desgaste do movimento estudantil?
Para mim, o primeiro motivo é que nós não somos criados nessa sociedade para nos organizarmos coletivamente, tomarmos decisões em conjunto. Muitos estudantes, mesmo assim, buscam conhecer esses espaços, novas formas de organização e de manifestação. Muitos deles acabam se afastando porque o movimento estudantil, embora tenha melhorado muito, ainda é muito fratricida e internista, preocupado com suas próprias pautas, pouco disposto, principalmente, a dialogar com as pessoas que não tem, a priori, um interesse em política e em se movimentar. Disposição existe, mas se não soubermos dialogar entre nós, as assembleias se tornam espaços que mais afastam do que agregam e organizam o movimento.

2 – Os horários e localizações (raramente no interior, por exemplo) das assembleias colaboram para que o quórum seja reduzido e pouco diversificado?
Em primeiro lugar, é importante saber que a Assembleia é uma das ferramentas do Movimento Estudantil, e na Opinião do DCE e do XI congresso de Estudantes da USP, realizado em 2012, ela tem um momento certo para ser realizada, num período de maior movimentação da Universidade, com maior participação dos estudantes. Servem para organizar o Movimento em períodos mais dinâmicos (de mobilização crescente). Quando isso ainda não existe, existem fóruns melhores e mais representativos, como os CCAs (Conselhos de Centros Acadêmicos), Reuniões de CA’s, Reunião do DCE.

Há um esforço do DCE de variar os locais das Assembleias, embora isso não seja um acumulo do conjunto do Moviemento Estudantil. Durante a Greve de 2011, fizemos Assembleias, para além do Vão da Geografia, na EACH, Salão Nobre da Faculdade de Direito, ECA, POLI e FAU.

Na minha opinião, esse rodízio é atraente para os estudantes, sim, mas mais importante do que isso, é uma boa construção das assembleias gerais e de suas pautas, desde as bases dos cursos (passagens em sala, reuniões de CA, Assembleias de Curso). Se não há mobilização e dialogo na base, dificilmente temos sucesso em fóruns gerais do Movimento.

Vale dizer, ainda, que é difícil reunir os campi da USP pela distancia, mas os campi do Interior nunca estiveram tão bem organizados e representados como no último período. A articulação do DCE com o CAASO (Centro Acadêmico da USP São Carlos) e o Diretório Acadêmico da USP de Lorena vem trazendo muitos avanços para a Organização Estudantil. Cada vez mais se realizam debates, atividades diversas e mesmo Assembleias desses Campi. Em São Carlos, ano passado, foram realizadas Assembleias do DCE que reuniram 2 mil pessoas, que conseguiram barrar a tomada do Espaço dos Estudantes. Em outros campi, como Ribeirão Preto e Pirassununga, muito tem avançado, também.

3 – Você acha que os 375 participantes necessários para encaminhar deliberações é um número condizente com os 98 mil estudantes da USP?
O Movimento Estudantil vem avançando no último período. O Quórum das Assembleias é recente em nossa história. Em 2010, no X Congresso de Estudantes, foi debatida a função das Assembleias (como já disse, uma das ferramentas do Movimento Estudantil, tem um momento certo para ser realizada, num período de maior movimentação da Universidade, com maior participação dos estudantes. Servem para organizar o Movimento em períodos mais dinâmicos, de mobilização crescente) e que outros fóruns cumprem um papel mais representativo enquanto isso não acontece. Para garantir essa representatividade mínima, o conjunto do Movimento decidiu estipular um Quórum para uma Assembleia ser deliberativa. No último período isso vem sendo bom, para que as decisões das Assembleias cada vez mais representem o conjunto dos estudantes, e não uma minoria já convencida de suas pautas. Se acharmos que ainda é pouco, temos que debater e avançar coletivamente, no possível XII Congresso de Estudantes, em 2014.

4 – O que fazer para que as assembleias tenham maior participação dos estudantes e ganhe mais vozes?
Para o DCE, para uma Assembleia ser vitoriosa, ela tem que representar e organizar bem os estudantes. Quanto maior a participação, melhor.
Para atingir esse objetivo, muita coisa é importante: Construção desde a base, com a atuação fundamental dos Centros Acadêmicos, em suas reuniões ordinárias, assembleias de curso, passagens em sala, realização de debates sobre os temas do Movimento Estudantil, mas também é fundamental a atuação do DCE, com suas passagens em sala, jornais informativos, diálogo e troca de experiências entre os campi e cursos da Universidade.

Luisa D’Avola, 25 anos, estudante de Letras, diretora do DCE

1 – Na sua opinião, por que a maior parcela dos estudantes da USP participa tão pouco das assembleias? Falta interesse político ou é um desgaste do movimento estudantil?
Eu acho que existe um problema mais amplo do que a simples participação dos estudantes em assembleias. Existe uma questão maior e cultural relacionada à ideia da necessidade da participação política. Há diversos problemas com a dinâmica do movimento estudantil numa universidade tão grande e plural quanto a USP, mas nosso principal desafio hoje é cativar os estudantes e convencê-los de que participar da vida política da universidade e mesmo da vida política geral é uma necessidade.

2 – Os horários e localizações (raramente no interior, por exemplo) das assembleias colaboram para que o quórum seja reduzido e pouco diversificado?
Contribuem. Mas novamente me parece que a discussão deve ser feita em outro patamar. Hoje, a universidade – de maneira oficial – não reconhece a existência de um movimento estudantil ou de uma organização dos discentes. Desta forma, a reitoria e as diretorias tratam o DCE e os CAs muitas vezes como meros embustes. Só poderemos ter assembleias que se equiparem a grandeza numérica e espacial de todos os campi da universidade quando estas puderem acontecer em horários de aula, com a grade cancelada e com apoio dos docentes. O ideal seria uma assembleia no horário da aula para que todos pudessem participar. Hoje isso é praticamente impossível. Tentamos, assim, fazer o possível para que os estudantes compareçam às assembleias, isso se dá a partir de passagens em sala, confecção de cartazes, chamados nas redes sociais etc. Mas infelizmente todos estes métodos ainda são fortemente submetidos ao tamanho do movimento estudantil frente o enorme número de alunos. Mais uma vez a questão volta-se para a necessidade do convencimento da participação política.

3 – Você acha que os 375 participantes necessários para encaminhar deliberações é um número condizente com os 98 mil estudantes da USP?
Não acho, mas me parece que a questão não tem a ver especificamente com o quórum – que é condizente não com o tamanho real da universidade, mas sim com a avaliação da conjuntura política do movimento estudantil hoje. Não adianta criar um quórum que remeta à concretude do tamanho da USP, algo como 10% de todos os estudantes, se este quórum se tornar um impeditivo para a realização de assembleias, plenárias etc. Como eu disse antes, acho que o centro do desafio é trazer esse mar de estudantes para as assembleias e torná-los parte da vida política da universidade.

4 – O que fazer para que as assembleias tenham maior participação dos estudantes e ganhe mais vozes?

Acho que já respondi isso um pouco, mas precisamos cada vez mais de um movimento estudantil forte, plural, vivo e aberto. Apenas um movimento radicalmente amplo pode alcançar todos os cantos e locais da USP e isso é o que o movimento estudantil uspiano mais quer – buscar mais pessoas, mais ideias e a maior participação possível. Só assim podemos buscar nossos objetivos, democratizar a estrutura de poder da USP, ampliar o acesso dos excluídos à universidade e lutar contra a precarização do ensino e a privatização da educação.

Márcio R. Becker Góis, 43 anos, aluno de Filosofia, moderador de grupo no Facebook que faz assembleias online.

1 – Na sua opinião, por que a maior parcela dos estudantes da USP participa tão pouco das assembleias? Falta interesse político ou é um desgaste do movimento estudantil?
Primeiramente digamos que as assembleias não sejam o local e a atividade mais agradáveis e motivadores para alguém sobrecarregado com estudos e muitas vezes com trabalho. Não ter a predisposição de comparecer a assembleias não pode ser classificado como desinteresse político. É possível ser ativo politicamente de outras formas.
E é claro que o movimento estudantil está desgastado. A maioria dos estudantes com certeza não se identifica com o perfil de participante do Movimento Estudantil que aparece na mídia e é estereotipado dentro da própria universidade. O espaço é hostil. É extremamente frustrante para alguém que queira propor algo diferente, ao chegar a uma assembleia ser tratado de maneira agressiva e atacado com termos ofensivos pelos participantes que monopolizam esse fórum.

Existe também uma segregação recíproca entre alguns cursos e o DCE. Em alguns CAs existe uma forma de pensar a representação estudantil de uma forma mais democrática. Na Escola Politécnica, por exemplo, as votações são estendidas por alguns dias depois das assembleias, para que os estudantes tenham a oportunidade de votar. Esses cursos, tanto na capital quanto no interior, se constroem politicamente independentemente da participação do DCE e seu posicionamento de proselitismo ideológico.

O movimento estudantil tem sido construído por grupos que já têm uma opinião política determinada – muitas vezes aparelhados por partidos – e não buscam ouvir o que todo o corpo discente tem a dizer. Há uma gestão toda baseada na ideologia que compõe sua diretoria, que é um pensamento afinado com muitas pessoas da FFLCH, por exemplo. Isso justifica que as assembleias ocorram em sua maioria na FFLCH, compostas majoritariamente por alunos dessa unidade, com uma postura ideológica próxima à do DCE.

2 – Os horários e localizações das assembleias colaboram para que o quórum seja reduzido e pouco diversificado?
Existe uma questão de logística de espaço e de tempo. São mais de 90 mil alunos distribuídos em vários cursos espalhados por vários prédios em campi localizados em várias cidades. Só pelo fator dos espaços dispersos são milhares excluídos. Mesmo que conseguíssemos juntar os estudantes, numa suposição de que precisássemos de 50% mais um para dar legitimidade a uma assembleia, ela só seria possível se acontecesse num estádio de futebol e só seria viável uma votação feita por meios eletrônicos. Além disso, as assembleias não têm sido atividades dinâmicas e organizadas objetivamente, o que faz com que se estendam por um tempo muito longo, que nem todos têm disponível. Muitos estudantes possuem outras atividades durante o horário em que as assembleias acontecem e é compreensível que priorizem suas aulas, provas ou seu trabalho.

A mesa que coordena a assembleia dos estudantes da USP não é receptiva a vozes discordantes. Não é interessante para o DCE integrar todos os mais de 90 mil estudantes da USP, pois isso poderia alterar significativamente a concepção ideológica das decisões tomadas. Devido a isso, há uma resistência muito grande em absorver as ferramentas de comunicação do século XXI. Há uma ortodoxia em favor da assembleia tal qual se fazia na Grécia Antiga, há mais de 2500 anos. Já sabemos que com isso se consegue perpetuar uma cultura de assembleias manobradas e com resultados pré-determinados, induzidos por aqueles que comandam a mesa.

3 – Você acha que os 375 participantes necessários para encaminhar deliberações é um número condizente com os 98 mil estudantes da USP?
De forma alguma. Esse número é pouco maior que o número de diretores do DCE. Representa 0,3% do total de alunos da universidade. É como se apenas os eleitores do estado do Acre votassem nas decisões sobre o país. São normalmente blocos de estudantes partidários que vão às assembleias para pressionar os resultados das votações, e vão fazer qualquer coisa para ganhar as votações. Isso deslegitima um fórum de representação discente que deveria ser plural, aberto ao debate, representando o mais fielmente possível os estudantes.

4 – O que pode ser feito para que as decisões do movimento estudantil contemplem a todos?
A única forma justa e democrática seria pulverizar as assembleias em micro assembleias em todos os cursos e campi, o que solucionaria o problema do espaço, e estender as votações por dois ou três dias, preferencialmente online. Os votos de todos os estudantes seriam somados e assim teríamos uma amostragem mais representativa da comunidade discente. (Note-se que algo similar já acontece no curso de Letras, em que há uma assembleia no matutino e outra no noturno, cujos votos são somados). A utilização de um sistema informatizado seria muito eficiente. Não só se eliminariam as limitações de espaço e tempo, mas também se ampliariam o interesse e consequentemente a participação de mais estudantes.

De fato, tem ocorrido um debate dentro do grupo da USP no Facebook que modero, o qual contém 8600 membros, onde fazemos assembleias virtuais para tomar as decisões internas. Participam lá estudantes de todos os campi e cursos, dentro de um espectro político variado. Os quóruns de participação têm sido muito maiores que os das assembleias dos estudantes. O tempo de votação é ampliado para um período de uma a duas semanas e os debates acontecem paralelamente entre os membros. Já votamos enquetes de opinião sobre processos contra estudantes, sobre a construção.

de uma Casa de Cultura Negra e todas as regras seguidas pela moderação são decididas assim. A pauta fica visível permanentemente, assim como o debate entre os membros e não há necessidade de se compor uma ata posteriormente, visto que os posts continuam publicados ao acesso de todos, junto com o resultado da enquete.

Estive conversando com estudantes de engenharia a respeito da possibilidade de desenvolver um sistema eletrônico de assembleias, criadas a partir de nossa experiência no Facebook, que poderiam ser úteis não apenas no Movimento Estudantil, mas também para outras entidades e até condomínios de apartamentos.

Infelizmente a luta por democracia na USP, por parte dos estudantes que comandam o ME, só se refere à escolha do reitor. Não há interesse em se fazer votações com urnas eletrônicas nas eleições para DCE, nem mesmo em se aplicar novas tecnologias para aumentar a participação dos discentes nas tomadas de decisão em assembleias. Sempre serão dadas desculpas de dificuldades de acesso às tecnologias ou mesmo apresentadas teorias conspiratórias para justificar o conservadorismo da gestão.

João Abreu, presidente do CA da FEA, estudante de economia

1 – Na última Assembleia Geral de Estudantes, no dia 27 de maio, foi votada, em caráter indicativo, uma paralisação para o dia 11 deste mês. A que você atribui um quórum tão reduzido de estudantes? Você considera legítimas as deliberações desta assembleia?

Esta Assembleia teve não apenas uma fraca divulgação mas um período curto entre o agendamento e a data da mesma. Infelizmente, isso não pode ser considerado exceção na política estudantil USPiana: há diversos relatos de Centros Acadêmicos que sequer recebem a convocatória da Assembleia. É importante lembrar que tanto a divulgação quanto o período mínimo de antecedência, bem como a obrigatoriedade de convocatória formal à todos os CAs, é regida pelo próprio estatuto do DCE.

Para além dos problemas desta Assembleia em específico, a própria legitimidade de deliberação das Assembleias em geral deveria ser discutida (ver resposta da pergunta 5). No caso de uma decisão de forte impacto, como é o caso de uma paralização, é claramente ilegítimo deliberar em nome de todos os estudantes da USP da forma como hoje é feito. A discussão deve ser realizada nas bases, pelos Centros Acadêmicos, que devem discutir e debater o assunto com os estudantes que representam – e levar as questões propostas para uma discussão entre todos os CAs.

Deliberar, por outro lado, é algo muito sensível. Dizer que ‘esta é a opinião dos estudantes da USP, como a mídia frequentemente faz, é hoje um equívoco. Porém, é possível atingir este grau de legitimidade – e, portanto, de peso institucional, reportando a posição de dezenas de milhares de universtiários da maior Universidade da América Latina. Para isso deveria haver uma forma de consulta formal, como um plebiscito online, de amplo acesso e divulgação – como o CAVC costuma fazer na FEA, inclusive, vide a questão das cotas/PIMESP este ano. Somente assim todos os alunos poderiam facilmente envolver-se na decisão, sem estarem constrangidos por um ambiente hostil, pouco convidativo e marcado às pressas. Com isso, teríamos uma decisão genuinamente democrática, que traria consigo uma legitmidade hoje utópica e daria muito mais força à decisão, tanto na USP como perante a sociedade.

2 – De maneira geral, estudantes da FEA, assim como de diversas unidades, participam pouco das assembleias na USP. Mesmo em 2011, quando mais de 4 mil estudantes se reuniram para votar a favor/contra a greve, a participação de feanos foi muito limitada, assim como sua a adesão à greve. Você acha que essa parcela de estudantes não se sente representada pelas assembleias? Você acha que não aderir à greve – votada com grande quórum – foi antidemocrático?

Aderir à greve é sempre uma decisão política de cada indivíduo, ainda que seja difícil para uma minoria superar o contexto grevista e comparecer às aulas, se assim desejar. No caso de uma unidade inteira que não se sente compelida à aderir a greve, não há qualquer tipo de pressão coletiva e é provável até que muitos dos alunos sequer saibam que parte dos estudantes da USP está em greve – como costuma acontecer na FEA. O fato de estarmos consideravelmente isolados do ambiente político dos setores mais ativos do Movimento Estudantil é determinante para compreender esta não-adesão. Se a maior parte dos FEAnos não se sente representado pelos atores que lideram a greve, pelas reinvindicações da greve e, principalmente, pela forma de ação de tal parcela do ME, é perfeitamente previsível que a greve passe desapercebida pela FEA. Chamar isso de ‘opção antidemocrática’ seria uma acusão superficial que procura atacar um grupo de alunos que não se sente representado pela Assembleia e suas decisões – inegavelmente, este ‘grupo de alunos’ não é uma minoria mas sim uma parcela expressiva da Universidade. Seria mais adequado questionar por que a USP, com seus mais de 60 mil estudantes, considera uma Assembleia com 4 mil pessoas altamente representativa.

Mais além, é urgente se preocupar por que a própria palavra “Assembleia”, “DCE”, “greve” e outras está em uma categoria que automaticamente gera repulsa para uma parcela importante dos universitários. As consequências de um Movimento Estudantil desgastado não podem ser criticadas em si, mas sim a origem deste desgaste deve ser entendida, identificada e combatida.

3 – A maneira como são conduzidas as assembleias é alvo de crítica por parte de estudantes de toda a USP. Você acha que a forma de organização e eventuais manobras políticas destas ocasiões contribuem para criar uma descrença e uma antipatia pelo movimento?

 Sem dúvida a forma atual de conduzir as Assembleias precisa ser duramente criticada. O maior empecilho é que estamos em um círculo vicioso: por um lado o ambiente da Assembleia é fortemente aparelhado, dominado sempre pelas mesmas figuras do Movimento Estudantil e com enorme influência partidária. Por outro, os estudantes independentes e cujas opiniões destoam daquelas do atual DCE e seus apoiadores olham para a Assembleia, enxergam um ambiente hostil e que nunca traz resultados concretos, e optam por simplesmente não comparecer, não se envolver. Isso gera um esvaziamento que atua em sentido duplamente negativo para o debate na Universidade: a maior parte dos estudantes não se sente representada pelo fórum de deliberação máximo da entidade que teoricamente os representa, e as decisões das Assembleias são amplamente questionadas por serem tomadas por um núcleo de alunos que não é maioria na USP. Assim, mina-se a credibilidade das atuais decisões do ME e a cada vez mais intensifica-se esta cisão entre membros ativos e alunos descrentes neste processo.

A forma de quebrar este ciclo, que seria os estudantes não satisfeitos com a atual conjuntura comparecerem em peso na Assembleia, é fortemente improvável pois são justamente estes alunos que já não se interessam pelo debate estudantil e não vêem como ele poderia cumprir seu papel caso fosse bem conduzido e mais representativo – sem falar que a estrutura da Assembleia em si, que dedica pouquíssimo tempo para fala de estudantes independentes, desestimula esse comparecimento. Por fim, infelizmente, temos o desperdício de uma grande oportunidade, pois uma entidade que pudesse falar genuinamente ‘em nome dos estudantes de toda a USP’ teria um poder imenso na sociedade.

4 – De forma geral, falta interesse político à maioria dos estudantes que não frequentam as assembleias?

Falta, sim, mas também falta este interesse na sociedade em geral – e nem sempre deixar de frequentar as Assembleias é sinal de desengajamento. Claro que o fato de estarmos na USP torna esta indiferença e apatia preocupantes, mas é preciso entender a origem este fenômeno – local e globalmente – e diferenciar presença na Assembleia com preocupação com as questões estudantis. No que diz respeito ao ambiente universitário, certamente uma das causas da falta de presença nestes fóruns é o desalinhamento entre os membros dos setores presentes das Assembleias e o resto dos alunos. As pautas de interesse nem sempre são comuns entre os ‘apáticos’ e os ‘engajados’ e, pior, a forma de lidar com os problemas – quando todos concordam que é um problema – diferem muito. A tentativa de dialogar e encontrar uma solução em parceria com as autoridades (seja Reitoria, Prefeitura do campus, prefeitura municipal ou outro órgão administrativo) é privilegiada por muitos, inclusive pelo CAVC, mas raramente é colocada como opção nas Assembleias Gerais, pois há uma descrença de que esta alternativa gere frutos concretos. Curiosamente, do outro lado, há uma clara opinião de que tampouco as estratégias atuais do ME gerem resultados – os exemplos são inúmeros nas últimas décadas, como as Diretas para Reitor e a revisão da estrutura de poder, demandas há anos presentes e que não caminham. Na FEA, perdemos a nossa Vivência, mesmo optando pelo diálogo, é verdade; mas por outro lado, conseguimos que a Universidade construísse um novo espaço, que deve ficar pronto no fim do ano, para convívio estudantil. Evidentemente este intervalo sem espaço habitável é indesejado e foi um ônus da opção pelo diálogo, mas no longo prazo provavelmente foi uma alternativa melhor do que insistir na ocupação do espaço antigo e, invariavelmente, ser removido à força sem receber qualquer espaço em troca.

5 – O que falta ser feito para que o corpo discente da USP participe e se sinta representado pelas decisões do movimento estudantil?

O movimento estudantil precisa se voltar mais para suas bases. Enquanto as suas decisões se pautarem “de cima para baixo”, a participação efetiva dos estudantes será baixa. Talvez a melhor forma para que isso ocorra seja se embasar, acima de tudo, na representação dos estudantes – os representantes eleitos do movimento estudantil não devem ser a vanguarda, mas sim o apoio que sustente e reivindique as reais demandas do corpo discente. Para isso as decisões devem partir do debate desde as “menores instâncias” do movimento, que são os Centros Acadêmicos, até a instância máxima que reúne estas entidades, que é o CCA. A ideia de que a Assembleia é o principal instrumento de decisão democrática estudantil precisa ser revista.