Busca por diálogo motiva ocupações em SP

Para Rogério Sottili, secretário da prefeitura de São Paulo, o direito de ocupar os espaços públicos deve ser assegurado

A ocupação da Reitoria da USP, no dia primeiro de outubro, tinha como objetivo obrigar os dirigentes a ouvirem as reivindicações dos estudantes – esta é a perspectiva de Gabriel, estudante do curso de Geografia e ocupante: “Pedimos que a reunião do Conselho Universitário fosse aberta, e a Reitoria negou. Então, para sermos ouvidos, ocupamos a Reitoria”.
Pedro Vidal, aluno de Biologia que também participa da ocupação, concorda com esse ponto de vista: “o fato das portas da Reitoria serem blindadas é um reflexo da falta de disposição ao diálogo”.
Segundo os alunos presentes na ocupação, a ausência de canais de debate com os dirigentes torna essa a única via que lhes permita ter suas demandas ouvidas. “Aqui [a Reitoria] é o lugar onde acontece a administração da Universidade, e é completamente distante de nós”, afirma Gabriela, das Ciências Sociais. Para Gustavo Rego, membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e aluno do mesmo curso, também presente na ocupação, o fato de que a Reitoria tenha solicitado a reintegração de posse antes de ouvir os estudantes sintetiza essa situação.

Além da USP

Situação semelhante leva um grupo de pessoas a ocupar a calçada em frente à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) desde 12 de agosto. Diego, uma das cerca de trinta pessoas que compõem o grupo, conta que eles chegaram à Alesp “com a ilusão de que teríamos alguma influência”.
Depois de elaborar pautas, enviar documentos aos deputados e receber resposta de apenas dois, eles veem pouca perspectiva de serem ouvidos: “A Assembleia é totalmente blindada contra as vontades populares”, afirma Diego, “quando era para ter algum diálogo com a Assembleia, quem vinha falar com a gente era um major da PM”, completa.
Embora os ocupantes nunca tenham entrado em conflito com a polícia, eles afirmam que frequentemente veem policiais e militares observando suas barracas e se sentem ameaçados: “A polícia está sempre tentando intimidar”, comenta Diego.

Representantes públicos

A ocupação dos espaços públicos pode acontecer de maneiras diversas. Estes espaços devem ser encarados não só como palcos propícios para se manifestar e reivindicar, mas também como locais onde as pessoas possam se expressar livre e abertamente. Para o vereador do município de São Paulo e docente da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, Nabil Bonduki, a questão do espaço público é uma das mais importantes de São Paulo e “precisamos trabalhar para democratizar e garantir a ocupação desses espaços e a sua qualificação”.
Assim como Bonduki, o secretário municipal de Direitos Humanos e Cidadania, Rogério Sottili, acredita que o direito de exercer ocupação deve ser resguardado. Para ele, os espaços públicos vêm sendo “cenários de exploração dos direitos humanos”.

Ocupação na USP

Em relação à ocupação da Reitoria da USP pelos estudantes grevistas, Sottili acredita que por trás disso está uma demanda que a Reitoria precisa responder. “Ao se ocupar uma Reitoria ou interromper aulas, se está prejudicando uma parcela da população de alunos, que está querendo estudar. Por outro lado, a Reitoria não pode deixar a responsabilidade na mão de quem ocupou ou de quem ficou prejudicado pela falta de aula, porque, se ela foi ocupada, existe uma lista de reivindicações que ela tem que responder”.
No entanto, na opinião de Bonduki, existem outros modos de se reivindicar pela democratização da Universidade – que deve ser uma luta “contínua” dentro da USP – além da ocupação da Reitoria. “Não estou dizendo que sou contra essa manifestação, mas acho que há outras maneiras de manifestação que teriam uma repercussão maior”.

Manifestações

Desde junho, vários protestos estão ocorrendo em todo o Brasil. Tanto Sottili quanto Bonduki reconhecem a sua importância na manutenção da democracia. “As manifestações naturalmente acontecem nos espaços públicos e o direito de se manifestar nestes espaços deve ser garantido”, declara Bonduki. “Às vezes, a manifestação prejudica o coletivo, mas isso não reduz a importância que ela tem”, ele completa.
Sottili pensa que se deve tentar compreender o que as manifestações querem dizer, independente de sua natureza. “Nossa democracia é recente, precisamos consolidá-la. Então, é fundamental que as manifestações sejam claras, transparentes. Vemos que há algumas manifestações sem foco, em que há destruição de patrimônios históricos, mas, mais importante do que criticar, é tentar entender o que isso significa. Acho que manifestações assim expressam um sentimento de revolta de uma parcela, mesmo que muito pequena, da sociedade brasileira, e temos que ver onde é que o poder público está errando e neutralizar esse sentimento de revolta”.

Regulamentação dos espaços

“Eu acho que a regulamentação é necessária em determinados momentos, mas, mais importante que isso, é o entendimento de que o espaço público deve ser ocupado pela população, e o direito de exercer esta ocupação precisa ser resguardado. Sendo assim, a melhor coisa a fazer não é regulamentar, mas dar liberdade para que a ocupação ocorra. Acredito que a regulamentação deve vir a partir da detecção de conflitos de interesses”, pondera Sottili.
Embora acredite que o espaço público deva ter acesso livre, Bonduki diz que regras de uso são necessárias, pois “o que atende a uns não pode deixar de atender a outros”. No entanto, ele salienta que não se deve restringir o acesso a um espaço público em nenhuma hipótese: “A restrição só é estabelecida quando existe regulamento de ocupação, mas o espaço público precisa ter acesso livre”.

Pautas sociais levam manifestantes a ocuparem calçada da Alesp
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