Para professores, queda da USP em ranking não significa menor produção acadêmica

A queda da USP no ranking Times Higher Education (THE) não significa uma menor produção científico-acadêmica

A USP não conseguiu repetir este ano o bom desempenho obtido no ranking da Times Higher Education (THE) em 2012. Despencando mais de 60 posições, a Universidade, pelo menos de acordo com os dados da revista inglesa, não figura mais entre as 200 melhores instituições de ensino superior do planeta.

A lista avalia cinco categorias principais: pesquisa, ensino, citações, inovação tecnológica e internacionalização. A USP perdeu posições nas três primeiras.

Para os professores Renato Janine e Osvaldo Coggiola, ambos da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), no entanto, não é necessário tanto alarde a respeito da queda. “Subir e descer nesses rankings, dentro de certos limites, é bem natural”, afirmou Coggiola. “Não é possível afirmar que a produção acadêmica uspiana caiu baseando-se somente em uma análise quantitativa”. Janine lembra que há várias avaliações com diferentes critérios a que as universidades são submetidas. “No começo de 2013, por exemplo, a mesma THE divulgou um ranking reputacional, no qual a USP ficou muito bem (entre 61º e 70º lugar). É normal a Universidade ter alcançado diferentes posições em rankings com diferentes critérios”.

O professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Jorge Luiz Souto Maior, questiona a submissão das universidades brasileiras a rankings como esse. “A Universidade precisa possuir os seus próprios parâmetros e objetivos, sendo essencial que se proceda a uma emergente reforma de seus estatutos, sobretudo para efeito da democratização de seus centros de positivação de poder.”

Ele também afirma que, no caso da Faculdade de Direito, “a qualidade de ensino e de pesquisa tem melhorado bastante nos últimos dez anos, notabilizando-se o maior interesse dos próprios alunos pela busca de um conhecimento efetivamente voltado à melhoria da realidade social e não apenas com a formação técnica à satisfação dos interesses de clientes específicos, o que tem gerado uma mudança no comportamento dos professores e forçado a alterações estruturais e curriculares bastante relevantes”.

Burocracia

De acordo com o professor Coggiola, o fato de os docentes brasileiros não terem a mesma tradição de manter o Curriculum Lattes bem atualizado como os europeus e americanos, esquecendo-se de registrar artigos e publicações, é uma das razões que acabam interferindo na categoria “citações”. “Além disso, os pesquisadores dos EUA, UE ou Japão são, provavelmente, mais experientes que os brasileiros ou latino americanos na prática da chamada ‘salami science’, que consiste em dividir diversos artigos entre diversos autores, com objetivo de fazer com que o autor de um artigo apareça como autor de vários, inchando artificial e estatisticamente o número de artigos produzidos”.

Intercionalização

Para Janine, o fato de a USP ter caído na avaliação do THE se deve à importância que o ranking dá a aulas e publicações em inglês. “Não é da cultura científica brasileira, e latina no geral, adotar o idioma inglês como meio de comunicação entre o professor e o aluno”, disse o professor. “Não temos como fugir da tradução. Mas isso não deveria ser o ‘divisor de águas’ entre a pesquisa boa e a ruim, como fez a revista inglesa”.

Movimento Estudantil

Rodas, em entrevista à Folha de S. Paulo no dia 6, apontou o fato de o movimento estudantil da USP ser bastante ativo, se comparado aos de universidades estadunidenses e europeias, como um fator que interfere na visão que o exterior tem da brasileira. “Tal argumentação (suposta relação entre ambos fatos) é bastante esdrúxula”, refuta Coggiola. Janine também não culpa as ações do movimento estudantil pela posição da Universidade em qualquer ranking. “A Faculdade de Filosofia, por exemplo, conhecida dentro da comunidade uspiana por enfrentar várias greves estudantis, está bastante bem nas avaliações internacionais. Não vejo essa relação de causa e efeito que o reitor apresenta”.

Maior vai além e inverte tal situação, afirmando que “se algo em torno das relações humanas ocorridas na Universidade de São Paulo nos últimos anos exerceu alguma influência nesta avaliação está muito mais próximo de ser a repressão utilizada pela Administração contra estudantes, servidores e professores, sobretudo com a utilização da Polícia Militar, que foi trazida para dentro do ambiente universitário, fato que, cabe frisar, não possui similar em nenhuma das universidades situadas no topo dos rankings”.

Consequências

Com a recente queda no ranking, houve um questionamento sobre possíveis consequências acarretadas a funcionários e docentes, especialmente a respeito do que tange às bonificações dadas a eles pela reitoria.

Entretanto, de acordo com Maior, a queda não pode afetar a vida de docentes, alunos e funcionários. “Estes devem estar atentos ao momento de reformulação estrutural e curricular da USP, que se apresenta como emergencial, direcionando-se neste sentido não para atender os parâmetros estabelecidos em tais rankings, mas para constituir os princípios e os objetivos de universidade verdadeiramente pública”.