Professores falam sobre a questão salarial

Docentes explicam como obtiveram remunerações maiores que o governador e questionam Tribunal de Contas do Estado

O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) desaprovou no dia 16 de abril a prestação de contas do exercício da USP em 2011. Em documento, o Tribunal aponta que 167 docentes receberam acima do teto salarial estadual. Entre os nomes citados no documento estão o do ex-reitor João Grandino Rodas, seu vice Hélio Nogueira e o atual reitor Marco Antônio Zago. Os vencimentos dos professores são determinados pelo cálculo do Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp).

Segundo a Constituição de 1988, o salário de funcionários públicos do Estado não pode ultrapassar o do governador (R$ 18.725). Joaquim Camargo Engler, da Escola Superior de Agricultura (Esalq), é um dos professores que recebe a maior remuneração, 26 mil reais.

Engler explica que os salários sobem conforme são concedidos benefícios, como os nove quinquênios (adicional de 5% a cada cinco anos). Após 30 anos de contribuição, o professor poderia se aposentar, mas continuou ativo. Por isso, recebe adicional de permanência. Em razão dos descontos da folha salarial, Engler afirma nunca ter recebido mais de 19 mil reais. “A Universidade é a responsável pelo cálculo”, declara o professor.

Relatório do TCE
O parecer emitido pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo afirma que qualquer benefício adquirido antes da Constituição de 1988 não pode ser computado. Quinquênios, sexta partes, e adicionais de aposentadoria, por exemplo, adquiridos legitimamente, não podem ser retirados pelo princípio da irredutibilidade.

Em 2003, o Senado Federal criou a emenda 41, que esclarece algumas das áreas obscuras do cálculo de salários e determina que os vencimentos dos professores não poderiam ultrapassar o valor recebido pelo governador. Em nota, a assessoria de imprensa da reitoria afirma que o cálculo elaborado pelo Cruesp para estabelecer o salário desconsidera os benefícios adquiridos até 2003, já que estes teriam sido de direito legal dos professores e, portanto, não podem ser retirados.

Depois de analisar o caso, a justiça entendeu que “não existe direito adquirido ao recebimento de remuneração além do teto estabelecido pela Emenda n.º 41/2003, não prevalecendo a garantia da irredutibilidade de vencimentos”. Só é garantido que se possa acumular benefícios anteriormente conquistados desde que esses não ultrapassem o valor de R$ 18.725. Sendo assim, a USP, como autarquia, não possui independência suficiente para estipular os vencimentos como faz atualmente.

Engler trabalhou na USP por 48 anos e se aposentou em 2012. Se desconsiderados seus benefícios anteriores à emenda, o salário do professor não atingiria o teto.

Vitor Rhein Schirato, professor de direito admistrativo da Faculdade de Direito, não está entre os professores cujo salário ultrapassa R$ 18.725, mas esclarece dúvidas sobre a legalidade da questão. “Se durante a vigência de uma determinada regra o servidor recebeu legitimamente algum benefício, ele precisa ser mantido. Ainda que passe do teto, se ele era legítimo no momento em que foi recebido, ele deve ser preservado”.

Os altos salários não são apenas calculados pelos anos de trabalho. Em alguns dos casos apresentados, eles se justificam por acúmulo de cargos. Rodas, Hélio Nogueira e Zago estão entre os docentes que acumularam funções, o que é permitido desde que um cargo não atrapalhe o exercício do outro.

Douglas Wagner Franco, professor do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) é o outro docente que recebe o maior salário da lista. Segundo ele, é preciso valorizar a carreira do professor universitário, a Universidade em si e a sua autonomia. O docente critica que o salário dos professores seja comparado ao do governador, pois segundo ele o representante tem uma série de benefícios que não são computados, enquanto os adicionais dos docentes são levados em conta na comparação. Franco também explica que o governador não tem plano de carreira, longo prazo de contribuição, aposentadoria e etc. Além disso, aponta que o salário do governador não é corrigido anualmente mediante a inflação, enquanto o dos professores é. “Não há equivalência de carreira pra ter um mesmo salário”, explica.

Franco lembra que o salário dos professores era atrelado à carreira da magistratura e depois foi desvinculado. “A magistratura tem um teto maior porque eles são vinculados ao governo Federal. Tem que desvincular o salário do governador do nosso. Ou, se manter, que seja comparado ao nosso salário base (sem os benefícios adicionais de tempo)”. O salário base de Franco como professor, por exemplo, é de aproximadamente 13 mil reais.

Sobre a questão de se comparar os vencimentos do professor com o da magistratura, Schirato dá sua opinião, “como [professor] é um cargo do executivo, eu diria que tem que ser comparado com o do governador. Mas isso é uma escolha que o legislador deve fazer.”
Não está claro como o problema será resolvido. “Se o servidor agiu de boa fé, só se pode pleitear qualquer ação para o futuro, não para o passado. Houve casos em que se percebeu pagamento indevido e o funcionário teria que devolver tudo. Mas agora há muitos juízes que entendem que se o servidor agiu de boa fé, tem que ser preservada a segurança jurídica. Ele pode, sim, não receber mais o recurso no futuro”, completa Schirato.

O documento não aborda somente a questão salarial, mas também irregularidades em licitações e na documentação patrimonial.

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