Resolução veta publicidade para criança

Para advogados, publicidade voltada a menores de idade com apelo ao consumo fere Estatuto da Criança e do Adolescente

A publicidade brasileira não é mais a mesma desde o dia 4 de abril, quando o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) publicou no Diário Oficial da União a Resolução nº 163, que proíbe a publicidade abusiva voltada para menores de idade no Brasil. A partir dessa determinação, que entrou em vigor na data de sua publicação, tornou-se abusivo o direcionamento de campanhas às crianças e aos adolescentes, quando na intenção de estimulá–los ao consumo de qualquer produto ou serviço. A iniciativa de autoria do Conanda, órgão vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, gerou oposição do mundo publicitário: entre as manifestações contrárias, está a da Associação Brasileira de Anunciantes, a qual afirmou reconhecer “o Poder Legislativo, exercido pelo Congresso Nacional, como o único foro com legitimidade constitucional para legislar sobre publicidade comercial”.

O Conanda alega que a prática da publicidade para menores de idade fere a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e o Código de Defesa do  consumidor. Segundo Aclibes Burgarelli, doutor em Direiro pela USP, “a publicidade
voltada para o público infantil atinge a estrutura psicológica da criança e desta forma fere os ditames do ECA. E, além disso, há campanhas publicitárias com conteúdos antiéticos que podem interferir no crescimento psico-social do menor de idade”.
Sendo assim, segundo Burgarelli, publicidades que tenham como tema o consumo de armas
de brinquedo ou que incitam a violência, por exemplo, vão totalmente contra a proteção garantida pelo ECA. “Por outro lado, não há qualquer tipo de violação aos artigos da  Constituição Federal ou ao Código do Consumidor”, afirma o especialista.

Para Vinícius Magalhães Pinheiro, atuante na área dos Direitos Humanos, a alegação do Conanda também não está totalmente correta. “Por um lado, não há qualquer violação
aos princípios constitucionais ou aos ditames do Código de Defesa do Consumidor. Por outro, há a clara violação ao princípio da proteção integral, elencado no artigo 1º do ECA, o qual versa sobre a responsabilidade do Estado e da sociedade civil em tomar quaisquer medidas protetivas a este grupo, mesmo que seja em detrimento da livre iniciativa econômica”.

O que vai acontecer?

No texto publicado no Diário Oficial, a determinação do Conanda prevê que não será admitida qualquer forma de comunicação comercial considerada abusiva voltada para crianças e adolescentes. Indo por partes, é preciso entender primeiramente o que seria a  comunicação comercial, também chamada de mercadológica.

Como indicado no texto da  Resolução, por comunicação comercial pode-se entender os mecanismos utilizados para a divulgação de produtos, serviços, marcas e empresas. Esses mecanismos englobam os anúncios impressos, comerciais televisivos, spots de rádio, banners, páginas na internet, embalagens, promoções, merchandising, ações por meio de shows e apresentações, e disposição de produtos em pontos de venda.

Em relação ao que pode ser considerado abusivo, o texto engloba 19 itens, divididos em  nove grupos, que caracterizam a publicidade tida como inadequada. Os itens são a  linguagem infantil, os efeitos especiais e o excesso de cores; as trilhas sonoras de músicas infantis ou cantadas com vozes de crianças; a representação de criança; pessoas ou  celebridades com apelo ao público infantil; personagens ou apresentadores infantis;  desenhos animados ou de animação; bonecos ou similares; promoções com distribuição de prêmios ou de brindes colecionáveis ou com apelos ao público infantil; promoções com competições ou jogos com apelo ao público infantil.

Se a resolução for cumprida, o público não verá mais campanhas publicitárias como as que costumavam ser veiculadas em canais voltados para o público infantil. E a abrangência das restrições alcança as escolas: segundo a Resolução, é considerada abusiva a publicidade e comunicação mercadológica no interior de creches e instituições escolares da educação infantil e fundamental, inclusive em seus uniformes escolares ou materiais didáticos.

As únicas formas de publicidade liberadas pela Resolução nº 163 são aquelas que consistem em campanhas consideradas de utilidade pública, como as relacionadas à boa alimentação, segurança, educação e saúde.  Para Burgarelli, “a Resolução está correta, porque a criança é considerada como um consumidor indireto por intermédio de seus pais ou responsáveis, e não possui discernimento sobre seus atos. Desta forma, é correto
afirmar que a tutela ao consumidor infantil deve ser maior, aumentando a responsabilidade de seus tutores”.

Pinheiro também apresenta um ponto de vista favorável à determinação proposta pelo  Conanda. “Também sou a favor da resolução, porque a publicidade direcionada às crianças
explora um público que ainda não possui a plena autonomia da vontade e explora um comportamento consumista precoce”.

Infográfico: Érika Lima