Tragédia faz questionar segurança na raia

(Infográfico: Victoria Salemi)

O ainda não esclarecido caso do garoto Victor Hugo Santos foi a última ocorrência envolvendo morte na raia olímpica da USP. Não é a primeira vez que ela se torna cenário de um óbito, e o fato de um corpo ser encontrado na água mostra a existência de uma falha de segurança num local com média de frequentadores diários beirando 400 pessoas e cuja fama é a de abrigar treinos de remo em alto nível de equipes como Pinheiros e Corinthians.

A raia olímpica possui cerca de 2.250 metros de comprimento, profundidade entre 3 e 5 metros e foi projetada como um tanque fechado sem nenhum tipo de ligação externa com córregos ou correntes d’água. Ela é totalmente circundada por 4.600 metros de grades. Apesar disso, há alguns pontos com fendas e outras brechas.

Segundo funcionários do Centro de Práticas Esportivas (CEPE), a raia possui quatro portões de acesso, e apenas um deles fica aberto, com controle, para a entrada do público. Dois seguranças terceirizados são responsáveis pela segurança de toda sua extensão. O suposto horário de desaparecimento de Victor foi próximo da troca do turno da noite, que inicia às 22h e termina às 6h. Não há câmeras de segurança que possam ter gravado imagens relacionadas ao caso. Alguns também confirmaram casos de invasão de pessoas na raia e no CEPE, entretanto, sendo mais comuns ocorrências neste último.

SEGURANÇA ESPORTIVA

A ausência de salva-vidas na raia é questionada por muitos frequentadores do local como um problema de segurança na área esportiva. Porém, segundo o professor José Carlos Simon Farah, diretor técnico do CEPE na área de remo, essa não seria uma medida necessária: “O equipamento de remo é controlado apenas para usuários que possuem uma credencial especial após passarem por um teste de natação. Durante as aulas fornecidas pela USP, há sempre um instrutor por perto orientando”.

Alguns usuários contestam a veracidade sobre a obrigatoriedade do exame de natação. Segundo o estudante Luciano Eiken, frequentador da raia há mais de três anos, foi apenas no começo de 2014 que começou a existir um controle mais rígido sobre quem frequenta o local: “Antes eles só perguntavam e iam na sua fé. Então, se você mentia ou se por acaso achava que sabia, mas não sabia, não haviam provas. Até o ano passado eu tinha uma amiga que não sabia nadar, mas gostava da canoagem. Mudou para o remo e eu tive que avisar os professores de que ela não sabia nadar nada”.

Segundo o Capitão Marcos Palumbo, do Corpo de Bombeiros, em locais de acesso restrito ao público em geral não existem regras de obrigatoriedade para a presença de salva-vidas. Os bombeiros também não realizam fiscalização, cabendo o zelo pelos usuários aos administradores do local: “Recomendamos apenas a presença de um salva-vidas em período de eventos, e avisos indicando ao público o risco de afogamento”.

HISTÓRICO

A morte de Victor Hugo é o terceiro caso documentado de morte na raia olímpica da USP. Em 1997, um garoto de quinze anos, morador da comunidade São Remo (ao lado do Portão 3 do Campus), foi à raia com um grupo de amigos para nadar. A atividade era proibida no local. Os garotos foram expulsos e, segundo eles, agredidos pelos guardas locais. O corpo de Daniel Pereira de Araújo foi encontrado boiando próximo a uma bomba de sucção. A universidade soltou uma nota oficial alegando que a área deveria ser destinada apenas para atletas e que os seguranças alertaram o menino do risco de afogamento. O caso causou revolta na comunidade São Remo e gerou uma série de protestos.

No começo deste ano, o empresário Everaldo Miranda se afogou na raia enquanto praticava Stand Up Paddle, uma modalidade de remo em cima de uma prancha de surf. Ventava forte no dia, e a perícia cogitou que Everaldo tivesse passado mal instantes antes de cair na água. O atleta não usava colete salva-vidas, pois este não é obrigatório para usuários da raia, principalmente porque atrapalha a prática do remo e da canoagem, segundo atletas.

Victor desapareceu por volta das 5h do dia 20 durante a Festa de 111 anos do Grêmio Politécnico, no Velódromo. O corpo foi encontrado boiando na raia três dias depois. Algumas pessoas presentes na festa relataram via Facebook (através do evento da festa) terem visto uma pessoa muito parecida com Victor sendo arrastada de forma violenta por seguranças da empresa GE (terceirizada para cuidar do evento).

Segundo o presidente do Grêmio Politécnico, André Simmonds, não havia nenhum tipo de relato de confusão no relatório pós-festa entregue pela empresa, e, até o momento, tudo se configura como boato. Ainda segundo Simmonds, não é a primeira vez que o Grêmio contrata a GE para a segurança de uma festa, e não havia ocorrido nenhum tipo de problema com a empresa até então.

Não foi encontrado pela perícia nenhum tipo de marca aparente de afogamento no corpo de Victor Hugo. Apenas alguns machucados no rosto foram constatados, e as hipóteses são de agressão ou queda. Ainda se cogita que o corpo tenha sido jogado na raia três dias após a morte e mais informações devem surgir após novos laudos da polícia.

por GABRIEL LELLIS