Jogo de tabuleiro ensina sobre alimentação

O jogo mostra que a porção ideal de feijão é uma concha com caldo e a de farofa é meia colher. O feijão é natural e a farofa processada ou ultraprocessada (Imagem: Adriano Furtado)

Um jogo da memória interativo, desenvolvido pela estudante de nutrição da USP Gabriela Bizari, altera a forma de ensinar as crianças sobre alimentação. Com peças coloridas e diferentes, imagens e linguagem atrativas, o game torna a alimentação saudável uma brincadeira, e não uma obrigação.

Seu noivo Adriano Furtado, estudante da Faculdade de Arquitetura (FAU), teve papel importante na elaboração. “O design era a ferramenta que faltava para tornar os guias alimentares mais acessíveis”, aponta a estudante.

A criação foi motivada pela utilização falha da pirâmide alimentar, forma comum de ensinar crianças sobre alimentação. “A primeira reação das crianças é olhar para o topo. Embora lá estejam os alimentos que devem ser consumidos em menor quantidade, as crianças interpretam como os alimentos mais gostosos”, comenta Gabriela.

A interação com o lúdico foi um tema central no projeto. Houve um estudo sobre quais cores e formatos utilizar, para que a criança interpretasse como um jogo e por isso se envolvesse mais. O fato de as peças terem cores e formatos diferentes torna mais atrativo. Muitos encaram como um desafio, e não como uma obrigação por ter que comer determinados alimentos. Um exemplo do resultado é que o consumo de água, apesar de sua importância, não aparece na pirâmide alimentar. No game, porém, é uma peça que fica no centro do tabuleiro. Quando elas compreendem que têm que beber dois litros por dia, isso vira um desafio, e elas têm a iniciativa de tomar vários copos sem que alguém precise mandá-las fazer isso.

Em cada peça há uma ilustração do alimento, o nome e o que seria uma porção dele.Há também uma indicação quanto ao nível de processamento do alimento: em cada peça há de uma a três bolinhas. Uma bolinha significa que o alimento é natural; duas bolinhas, que é um ingrediente e três quando é processado ou ultra-processado.

O primeiro teste ocorreu em uma escola particular em Cotia, com cerca de 30 alunos acima dos sete anos. Esse foi o momento em que o projeto ganhou impulso, devido à reação dos alunos. Gabriela conta que rapidamente eles conseguiram depreender conceitos como o que é uma alimentação balanceada, a importância do lanche e os substitutos dentro de um grupo alimentar.

Em abril de 2014 eles lançaram um site do projeto “meu dia alimentar”, tendo uma enorme repercussão. As pessoas que se interessaram eram médicos, nutricionistas, mães e professores, sempre com uma resposta positiva à ideia. Diante disso, eles resolveram dar sequência à proposta através do financiamento coletivo, produzindo um vídeo e criando uma página no Catarse para a arrecadação de fundos. Levantaram 115% do necessário para que uma empresa de brinquedos produzisse o jogo para vendas.

Quanto à pratica, Gabriela ressalta que trata-se de um trabalho continuado. Jogando uma vez, a criança adquire uma idéia geral sobre o que é uma alimentação saudável. Porém, é importante que ela pratique ao longo dos dias para por em prática os novos hábitos.

Na brincadeira, não é necessário o auxilio de um profissional. Entretanto, o incentivo dos pais é fundamental para dar continuidade ao que o jogo ensina, ou seja, proporcionar às crianças os alimentos necessários a uma boa alimentação.

PROBLEMAS DA ALIMENTAÇÃO INFANTIL

Gabriela aponta que o que mais se verifica na alimentação infantil é o baixo consumo de frutas, legumes e verduras. Considerando que a criança nasce com o paladar neutro, o estímulo à inserção de alimentos saudáveis deve acontecer desde a infância, dentro de casa.

Outro agravante é o elevado consumo de alimentos ultraprocessados, que possuem uma densidade energética maior, ou seja, em uma quantidade menor de alimentos há muito mais calorias. Esses alimentos em geral são hiperpalatáveis, possuindo altos níveis de açúcar e por isso sendo tão saborosos. Exemplos comuns são os chocolates, os salgadinhos e as bolachas recheadas.

Ela comenta ainda que o brasileiro costumava comer arroz, feijão, carne e salada nas refeições. Hoje, porém, o consumo de arroz e feijão diminuiu muito, sendo substituídos principalmente por refeições prontas. Essa mudança é acompanhada pelo problemático fato de que não existe mais um momento em que todos se sentam para a refeição, o que é grave para as crianças, já que é nesse contexto que se formam os hábitos alimentares.

por THAÍS FREITAS DO VALE