Proibir festas é medida extrema e falha

(Foto: Thiago Quadros)

Um jovem de 20 anos desaparece. Três dias depois, seu corpo sem vida é achado boiando. Não se sabe quem é o assassino (ou se houve um). Em outro episódio, um garoto é atingido na cabeça por um tiro e morre ali mesmo, no estacionamento de sua faculdade. A cada noite, novos casos de estupros, sequestros, assaltos, furtos, brutalidades. Para Datena nenhum colocar defeito, a Cidade Universitária parece um microcosmos do Brasil, onde a desigualdade social e a segurança deficiente escancaram a violência.

Com as fotos de Victor Hugo dos Santos estampando as páginas dos jornais, as autoridades correm para tomar as medidas que a sociedade exige. Ao proibir confraternizações envolvendo bebida alcoólica nas dependências da Escola Politécnica, o diretor José Roberto Castilho Piqueira, em fala para o Estado de S. Paulo, foi categórico ao afirmar: “Universidade não é local de balada, de bebida, de festa!” Se o problema é esse, que proibamos então os estudantes de ocuparem o vazio do campus onde circulam. E se maratonistas são atropelados nos sábados de manhã, oras, é porque a Universidade também não é lugar de fazer cooper!

Alguns setores da sociedade concordam com a medida, embasados por uma visão de que a USP se tornou um antro de baderneiros inconsequentes. O que tais pessoas custam a entender é que festas não são meras desculpas para atentar contra a moral e os bons costumes. Com o Grêmio Politécnico ainda preferindo não se manifestar sobre a proibição de festas, fui procurar outras entidades que vão sentir na pele as implicações do banimento.

No Centro Acadêmico da Engenharia de Produção, a vice-presidente do departamento financeira Nathalia Sadocco explica: “Aprendemos muito com o planejamento de eventos desse porte. Mas nós somos, antes de tudo, espaços de convivência. Precisamos do dinheiro das festas para manter esses espaços, pagarmos as contas, organizarmos eventos acadêmicos e para projetos voltados aos alunos e à sociedade”. No caso da faculdade, são exemplos o Poliglota, curso de idiomas, e o Cursinho da Poli, que ministra aulas pré-vestibular; ambos mantidos pelo Grêmio.

E se a moda pegar em outras instituições? “A Veterinária não costuma realizar eventos grandes dentro da USP com muita frequência”, diz Brenda Alcântara, presidente da Associação Atlética Acadêmica (AAA) IX de Setembro. “A proibição de festas dentro do espaço da Universidade afetaria, sim, nosso rendimento, mas não consideravelmente, já que as promovemos também fora daqui.” Brenda acredita que a segurança não será melhorada com proibições, mas com restrições: maior controle sobre quem entra, ainda que as festas, possivelmente, sejam barradas para os não alunos.

Já na AAA de Farmácia e Bioquímica, o presidente Daniel Campello pensa a proibição de maneira diferente. “Não diria que são medidas equivocadas, mas, sim, extremas. Essa proibição prejudicará bastante o orçamento das entidades, que contam com esse lucro para manterem atividades. A segurança poderia melhorar tanto com a contratação de equipes com mais experiência até com parcerias com a reitoria para aumentar o contingente de segurança em dias de grande circulação no campus”, ele expõe.

Enquanto o debate se prolonga, as associações tentam se equilibrar na corda bamba com o que têm. Na Escola de Comunicações e Artes, os frequentes casos de furtos e assaltos colocam em risco o happy hour semanal Quinta i Breja. Em entrevista à Folha de S. Paulo, o professor Paulo Saldiva da Medicina diz que a próxima festa Carecas no Bosque, promovida pela Atlética da faculdade e recentemente envolvida em um caso de estupro, não acontecerá.

É certo, porém, que os diretores partidários da proibição enfrentarão mais que estudantes insatisfeitos. Quem não está gostando nada dos burburinhos dentro dos muros da USP é a Ambev. Nada a ver, porém, com a defesa de ideias políticas progressistas. A gigante do ramo de bebidas tomou postura contrária ao veto pois é responsável pelo patrocínio de 86% das agremiações estudantis na cidade de São Paulo. Ao menos nesse caso, os estudantes podem contar do seu lado com a força avassaladora dos interesses econômicos.

por RAFAEL BAHIA