Professores sendo disciplinados por policiais?

A truculência de um governador que recebe com cães raivosos educadores aposentados

No final do mês de abril, na quarta-feira dia 29, com o Dia do Trabalho já pairando no horizonte, o Centro Cívico de Curitiba foi palco de uma demonstração clara da prioridade que a educação tem no Brasil.

(Ilustração: Stella Bonici).

Preparados para receber o protesto dos professores do estado paranaense, os soldados da Polícia Militar já tinham todo o plano traçado pelas ordens do governador Beto Richa (PSDB) de como lidar com a manifestação, que este havia descrito em nota se utilizando muito de termos expressivos como: radicalismo, irracionalidade e vandalismo.

Quando o protesto tentava chegar à Assembleia Legislativa do Estado, foi recebido com cães, cassetetes, balas de borracha e jatos d’água, que infelizmente são reações já comuns a alguns tipos de manifestações que o país presencia na atualidade. Vale ressaltar algumas técnicas de alto valor estratégico utilizadas, como o lançamento de bombas de gás lacrimogênio desde helicópteros. Questiona-se se a motivação era atacar apenas manifestantes “exaltados” que se misturam no meio de uma multidão pacífica.

No outro lado das portas da casa do poder legislativo local, os deputados discutiam um projeto que prevê algumas mudanças no sistema ParanaPrevidência, dentre elas a transferência de mais de 34 mil aposentados de 73 anos ou mais do Fundo Financeiro para o Fundo Previdenciário, sendo o primeiro bancado pelo governo estadual e o segundo composto por contribuições dos servidores. Esta mudança economizaria R$ 142,5 milhões aos cofres do estado por mês.

O governo defende que todas as garantias aos seus funcionários serão preservadas e que os cálculos atuariais garantem uma solvência do sistema por 29 anos, pois o Fundo Previdenciário estaria capitalizado em R$ 8,5 bilhões em investimentos. Sua resposta truculenta à presença dos educadores durante a sessão é um válido questionamento sobre a prioridade do governo estadual em preservar os direitos quando isso entra em conflito com as contas do seu Estado, que vai criar um rombo no fundo dos educadores de quase 7,5 bilhões de reais até o final do mandato de Richa. Essa medida é uma tentativa por parte do governo estadual de reparar o problema orçamentário que o Estado enfrenta, reflexo do mesmo problema visto em âmbito federal.

Com o governo trabalhista federal sendo obrigado a fazer ajustes fiscais, a desconfiança na palavra do governador Richa ultrapassa barreiras partidárias e acaba na pergunta: como acreditar que a saída deste dinheiro do fundo responsável pela aposentadoria da categoria dos professores não vai significar, no futuro, o não pagamento de pensões aos trabalhadores?

Entre as várias contagens, calcula-se cerca de 200 feridos na chamada “ação de defesa” da PM, que segundo o governador se fez necessária por culpa dos próprios manifestantes e de supostos “black blocs” que estavam infiltrados no movimento. Estes já muito famosos por receberem de forma bastante recorrente culpa por todo e qualquer ato de violência policial que acontece pelo país, na verdade não são um grupo de pessoas mas uma técnica de manifestação que se fez presente em manifestações desde os protesto de junho de 2013, no caso brasileiro. Nenhuma imagem foi divulgada de técnicas black bloc no ato da quarta-feira.

No entanto não faltam imagens da brutalidade do conflito completamente desigual que ocorreu. Entre os feridos oito se encontram em estado grave. Durante a ação da polícia, os professores iam sendo encaminhados a hospitais locais, no entanto, devido à incapacidade em atender a grande quantidade de pessoas, uma sala da Prefeitura de Curitiba teve que ser utilizada de ambulatório emergencial para cuidar de algumas vítimas que não podiam ser levadas a nenhum dos hospitais. O governo de Richa pareceu não se incomodar com outros setores do Estado estarem mobilizados a cuidar daqueles que seus policiais feriam com tamanha violência.

No entanto, nada do que aconteceu abalou as forças do projeto que foi aprovado em texto final na mesma quarta-feira pela Assembleia Legislativa do Estado e sancionado em extrema velocidade no dia seguinte por Richa.

Em resposta, os professores que naquele momento estavam há seis dias em greve, se reuniram novamente no Centro Cívico no dia 1º de maio, em ato que repudiava a violência que sofreram na manifestação anterior. Por volta do meio dia, os manifestantes tingiram o espelho d’água do Palácio do Iguaçu, sede do governo do Estado, de vermelho, representando o sangue dos feridos na quarta-feira. A bandeira nacional que tremulava na praça foi baixada em respeito às vítimas pelos próprios educadores e a figura de Nossa Senhora de Salete, que se situa frente à Assembleia do Estado, foi vendada, em uma lição de simbolismo que os educadores demonstraram a um país que fechou os olhos para a violência que eles sofreram.

Dentre as diferentes repercussões que os acontecimentos geraram no Estado destaca-se a discrepância entre as definições dadas pela OAB do Paraná, utilizando-se da descrição “verdadeiro massacre”, contra a fala do procurador-geral da Justiça do Paraná que falou sobre “eventuais excessos” nas ações da PM.

O conflito de Richa com os educadores não nasceu aqui, em fevereiro, durante o começo das discussões deste projeto. O governador já havia mandado ordens de repressão para a PM impedir que os protestos dos professores chegassem à Assembleia do Estado. Destaco que naquele momento os soldados da polícia se recusaram a cumprir tais ordens e a reunião da Assembleia foi interrompida pelos manifestantes.

Não há informações de como Richa reagiu a tal “indisciplina”, só podemos imaginar o quanto isso incomodou este verdadeiro legitimador do país em que respeito se confunde com o medo. No entanto, como o próprio governador um dia afirmou, esta visão de nação não combina muito bem com pessoas que receberam boa educação, por isso não quer PMs que estudam muito e acabam se “insubordinando”.

É importante lembrar que os soldados e os cães são apenas a arma de uma sociedade que continua a desqualificar a educação em troca de sua ode à subordinação, e estas duas jamais vão coexistir, pois a educação liberta o questionamento sobre como balas de borracha seriam a melhor forma de tratar os responsáveis por transmitir nossa cultura e educação aos nossos filhos.

Greve dos professores estaduais em São Paulo

Os professores estão em greve há quase dois meses, reinvidicando ajuste salarial de 75,33% para equiparar a categoria a outras que contam com nível superior. Alckmin afirmou que a greve “não tem o menor sentido” pois há oito meses houve um aumento de 7% para a categoria. No dia 6 de maio foi autorizado um desconto salarial pelos dias de paralisação.

Por Daniel Muñoz