Além do hormonal: contracepção alternativa

Meio século após o anticoncepcional, mulheres buscam métodos naturais para evitar gravidez

Foi no ano de 1960 que a chegada da primeira pílula anticoncepcional deu às mulheres o controle sobre concepção e sua própria sexualidade.

Cinquenta anos depois, a contracepção ainda é uma preocupação. Adriana Felice, aluna do oitavo semestre de Letras da FFLCH, usa anticoncepcional oral combinado (estrogênio e progestagênio) há oito anos e está satisfeita: “Não tenho enjoo e minha pele melhorou. Minha libido não sofreu nenhuma alteração”, declara a estudante, que combina ao método o preservativo masculino.

Eduardo Motta, médico assistente do Departamento de Ginecologia do Hospital das Clínicas, diz que, devido à facilidade de acesso, “muitas pacientes já fazem uso de pílula mesmo sem terem procurado por orientação médica”. A consulta ao médico na decisão de usar a pílula é essencial porque, segundo Motta, apesar de não se recomendarem exames laboratoriais prévios ao uso de anticoncepcionais orais, “se considera o antecedente clínico da paciente”, cuja avaliação pode ou não atribuir risco ao uso do produto.

É disso que Gabriela Santiago, aluna do terceiro semestre também de Letras, tem medo: “Principalmente de trombose, porque tenho uma amiga cuja irmã teve problemas”. Por isso, está procurando outros métodos que possam substituir o contraceptivo oral além da camisinha, que já usa. “Vejo muita vantagem no anel vaginal, mas ainda não testei”, conta.

O anel vaginal combina os dois tipos de hormônio (estrogênio e progestagênio), que são liberados continuamente por três semanas, quando pode ser pausado por sete dias antes da colocação de um novo produto. Assim também funcionam o adesivo contraceptivo, que deve ser colado à pele, e a injeção hormonal. Motta aponta que a diferença está na molécula hormonal, que varia “para poder ser absorvida de outras formas que não o sistema digestivo, como pele, mucosa vaginal ou via intramuscular”. O médico fala ainda de outros dois métodos hormonais, o implante e o SIU (sistema intra-uterino), mais conhecido como DIU hormonal. Ambos são compostos apenas de progestagênio, bem como a minipílula. No caso do SIU, esclarece que “o efeito é no interior do útero, apenas.”

Já o DIU (dispositivo intra-uterino) de cobre foi considerado por Bruna de Bem, mestranda na Faculdade de Direito da USP. A estudante, no entanto, não se sente confortável com o método porque já ouviu relatos de “gente que engravidou usando e de irritação ao cobre”. Usuária de camisinha e contraceptivo hormonal, Bruna diz que está constantemente mudando de pílula, “tentando encontrar alguma que não altere tanto minha libido, lubrificação e peso, e que mantenha minha pele sem espinhas”, e completa: “Está difícil. Estou pensando em ficar só na camisinha”. Ela também conta que o método causou grave baixa na sua autoestima.

Mariana Bastos, aluna do quinto semestre de Biologia no IB, sofre de Síndrome de Ovários Policísticos (SOP), um distúrbio hormonal definido por um aumento no tamanho dos ovários, e iniciou o uso do anticoncepcional quando procurou uma ginecologista por ajuda para controlar seu ciclo menstrual e acne. “Fiz alguns exames e a médica disse que eu teria que tomar pílula”, diz. No entanto, Mariana também relata alterações de humor e da libido durante o uso. De acordo com Motta, “esses efeitos podem ocorrer com alguns tipos de progestagênios e, nesse caso, pode-se discutir a troca de método”. Por causa disso, a estudante decidiu interromper o uso do método hormonal e agora só usa camisinha: “Acho que se tornou mais cômodo, tanto para as pacientes quanto para os médicos, usar a pílula como tratamento para SOP, acne e qualquer outro problema com causa hormonal”, e destaca: “Há outras formas de regular os hormônios e elas são pouco exploradas pelos médicos”.

Fontes: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), Medical Clinics of North America. Infográfico: Marcelo Grava. Clique para ampliar.
Fontes: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO), Medical Clinics of North America. Infográfico: Marcelo Grava. Clique para ampliar.
O método natural

Cristiani Marton, aluna do décimo semestre de Nutrição na USP, também sofre de SOP. Começou o uso do anticoncepcional para controlar os sintomas. Como consequência, o usual: falta de libido e péssimo humor. Depois de oito anos de pílula, hoje Cristiani combina camisinha com um método natural de percepção da fertilidade, o sintotermal.

O método consiste na percepção dos dias férteis do ciclo da mulher pela observação das alterações de temperatura do corpo e das mudanças do muco cervical — fluído produzido pelo colo do útero, cuja textura e quantidade variam.

Segundo Motta, o ciclo menstrual da mulher apresenta duas fases: a primeira, da menstruação até a ovulação, e a segunda, entre a ovulação e a próxima menstruação. O médico explica: “Após a ovulação, a liberação do hormônio progesterona eleva a temperatura corporal entre 0,2ºC e 0,5ºC”. A mulher deve medi-la diariamente ao acordar, e “quando houver aumento da temperatura, é sinal de que a ovulação ocorreu”

O método sintotermal também exige observação do muco cervical, que tem quatro padrões básicos: seco (sem muco) ou grudento, com aspecto de cola branca secando e/ou flocado; cremoso, com aspecto mais úmido e esbranquiçado; clara de ovo, com aspecto lubrificante, elástico e transparente ou levemente turvo; e aquoso, transparente e muito úmido, mas não tão elástico. Os três últimos tipos de muco — cremoso, clara de ovo e aquoso — são férteis, de modo que o último dia de muco fértil, geralmente aquoso ou clara de ovo, é o dia da ovulação. “É necessário que a mulher aprenda a analisar diariamente o seu muco cervical, introduzindo dois dedos na vagina e obtendo amostra da secreção ali contida”, explica Motta.

Assim, é possível perceber a chegada do período fértil e da ovulação previamente, pela análise do muco, e confirmá-la pela alteração posterior da temperatura basal, traçando melhores estimativas da data da próxima menstruação, e período fértil. O método pode ser usado para evitar a gravidez, bem como para planejá-la, e tem diferentes regras de acordo com o propósito da mulher. Motta diz que, para fins de contracepção, a mulher deve “ter abstinência de sexo vaginal nos dias férteis”, inclusos quatro dias depois da ovulação, e pode ter relações em dias alternados antes da ovulação.

Cristiani ainda está começando e associa o método à camisinha masculina, mas declara: “Estou tendo a oportunidade de me conhecer, conhecer meu ciclo, meu corpo, minhas mudanças”, e finaliza: “É incrível perceber seu organismo funcionando”.

Por Marcela Campos Romão