Paratletas da seleção brasileira de canoagem treinam na Raia Olímpica

Em parceria com a USP, o Centro de Treinamento da Equipe Permanente de Paracanoagem prepara atletas para os Jogos Paraolímpicos do Rio em 2016

(Foto: Hailton Biri)
(Foto: Hailton Biri)

A Raia Olímpica da USP é casa da preparação de potenciais medalhistas do paradesporto do Brasil. Desde abril do ano passado, o Centro de Treinamento da Equipe Permanente de Paracanoagem cede infra estrutura para os atletas da seleção brasileira. Em uma parceria com a USP, o grupo se utiliza do espaço para o treinamento dos atletas que representarão o país nos Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro em 2016.

O folgado primeiro lugar geral no quadro de medalhas obtido nos Jogos Pan-Americanos de Toronto, encerrados na semana passada, não traduz o começo bastante amador dos esportes para pessoas com deficiência no Brasil. Os paratletas treinavam como podiam e dependiam muito de si mesmos para se tornarem profissionais. “A ideia desse projeto era que os atletas com condições de ter alto rendimento tivessem a estrutura necessária e adequada para atingir essa capacidade”, explica Gabriela Nunes, uma das coordenadoras do CT.

A Lei de Incentivo ao Esporte foi importante para a implantação do projeto. Por meio dela, empresas da iniciativa privada podem destinar parte dos recursos que seriam pagos como impostos para fomentar o desenvolvimento do esporte no país. Órgãos do governo, como o BNDES, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, também integram os investimentos. Atualmente, o banco é um dos principais patrocinadores da canoagem no Brasil.

O local utilizado pela equipe é alugado pelo CEPE-USP, da mesma forma que outros clubes, como Pinheiros e Paulistano também fazem. Especificamente sobre o CT da equipe permanente, Gabriela explica que ele não é um lugar de fomento, ou seja, não tem o objetivo de formar atletas, e sim trabalhar com esportistas que já possuem algum destaque. “A gente identifica os atletas nas competições, seleciona e convoca alguns para virem fazer parte”, diz.

Os campeonatos nacionais de paracanoagem, em que os atletas representam seus clubes, são a oportunidade para que essa seleção seja realizada. Nesses eventos, através de alguns cálculos em cima dos seus tempos, aqueles que atingem os números necessários são convidados a participar do CT, que os atletas representam em competições internacionais.

Para serem convidados a participar do Centro de Treinamento, os atletas devem conseguir tempos até 5% acima dos índices estabelecidos em eventos internacionais. Para permanecer na equipe, devem buscar seu aprimoramento alcançando os índices propostos pela equipe técnica, conforme sua fase de treinamento. Caso não consiga manter o alto nível, o atleta pode ser convidado a se retirar do CT, podendo ser substituído por outro.

Gabriela ressalta que a forma como o Centro de Treinamento opera é característica só do Brasil, diferentemente de outros países, em que a canoagem olímpica costuma dividir o espaço e a estrutura com a paracanoagem. Aqui os atletas com deficiência têm total autonomia quanto à olímpica, o que inclui um espaço mais acessível e adaptado, além dos auxílios de moradia, alimentação, transporte e planos de saúde.

Única mulher do grupo, a campeã brasileira de paracanoagem Silvana Santos Ferreira, 46, é uma das seis atletas que integram o Centro de Treinamento da seleção nacional. A história da sorridente alagoana, atleta filiada ao CEPE, demonstra não só superação, característica constante no paradesporto, mas uma trajetória dedicada ao esporte.

Após sofrer a lesão que lhe tirou o movimento das pernas, Silvana encontrou no esporte a saída para sua recuperação e para uma vida mais ativa e saudável. Ainda se adaptando à cadeira de rodas, começou com o basquete. Em 2009, por convite de um amigo, participou de campeonatos regionais de atletismo e natação. Acumulou medalhas em todas essas oportunidades. “Tenho no total 60”, conta. Vai completar um ano de dedicação exclusiva à paracanoagem em setembro deste ano. E os resultados já impressionam.

Além do campeonato nacional conquistado no fim de 2014, o saldo conta ainda com a primeira colocação em duas edições da Copa Brasil. Para o nacional deste ano, as metas já estão definidas. “Meu objetivo é ser campeã de novo. E treinar depois para poder buscar a vaga para as olimpíadas de 2016.”

Silvana é destaque competindo pela classe A, divisão funcional dos competidores que só se utilizam do braço e do movimento do ombro para impulsionar a embarcação. A paracanoagem ainda divide os atletas em outras duas categorias, a partir do nível de mobilidade. Na classe LTA, utiliza-se para remar também o tronco e as pernas. Na TA, apenas o tronco e os braços. As embarcações também variam conforme largura, peso e comprimento.

Na luta por patrocínio, a canoísta se mantém atualmente apenas com a bolsa-atleta, ajuda de custo de R$ 920. Morando com a família, tem a alimentação, gastos com saúde e transporte também subsidiados pela seleção. Gastos operacionais, no entanto, eventualmente ainda têm de ficar por conta da atleta. O barco utilizado nas competições, por exemplo, teve de ser comprado com o próprio dinheiro. Nada que afaste sua motivação.

“Muitas pessoas, após sofrerem lesão, podem pensar que a vida tenha acabado. Acabou minha vida? Acabou nada! Agora que começou”, conta, sobre a liberdade e independência que sente ter quando está na água. “Quanto mais as pessoas me desafiam, mais eu gosto. Podemos ter perdido a sensibilidade, mas não perdemos a vontade de viver. A vida continua pra todo mundo“.

Por Guilherme Eler e Cesar Isoldi