Falta de visibilidade e infraestrutura afetam os vários corais amadores da Universidade

Sem auditórios adequados, grupos enfrentam dificuldades para se apresentar ao público
Ensaio do Coral Laboratório da Terceira Idade na Escola de Comunicações e Artes, um dos muitos que abrem espaço para a participação da comunidade externa (Foto: Matheus Pimentel)
Ensaio do Coral Laboratório da Terceira Idade na Escola de Comunicações e Artes, um dos muitos que abrem espaço para a participação da comunidade externa (Foto: Matheus Pimentel)

“O que a gente come no domingo?”. Várias respostas dispersas. “No domingo, a gente come macarrão, certo? E em cima do macarrão, o que tem?”. Expectativa. “Tem molho, ‘moio’. Lembrem do macarrão e repitam comigo: ‘moio-iô-iô-iô-iô’”. A classe reproduz o exercício. Quem diz é o regente do Coral da Terceira Idade, um dos vários coros situados na Cidade Universitária, durante ensaio na Escola de Comunicações e Artes (ECA). Apesar de espalhados pelas Unidades da USP, os corais de amadores geralmente estão distantes dos olhares e da atenção da comunidade. O Instituto de Física (IF), a Faculdade de Odontologia (FO) e o Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) são alguns dos locais que possuem coral próprio. Além deles, há os vários grupos do CoralUSP e os coros da ECA.

“Isso aqui é uma maravilha”, declara José Tapia, membro do Coral da Terceira Idade há cinco anos. Ele, que é chileno, diz que o fato de poucas pessoas de fora da Universidade saberem das atividades de extensão é um problema. “Coral [de amadores] é uma ideia que deveria se espalhar pela América Latina”. Engenheiro elétrico de formação, José conta que já cursou disciplinas nas vagas reservadas para idosos em áreas diversas, como Geologia, Relações Internacionais e Antropologia. Também coralista, Marilena soma nove anos de ensaios e apresentações. “O coral é ótimo, a gente canta em inglês, francês, japonês”, diz ela. A longa permanência dos membros é uma marca do Coral da Terceira Idade, mas novos coralistas podem ingressar no grupo, já que existem testes a cada semestre.

Obstáculos

Marco Antonio Ramos, professor e coordenador do Laboratório Coral do Departamento de Música da ECA, afirma que o canto coral para amadores é importante, mesmo com a pouca visibilidade que possui atualmente: “Quando eu me formei, na década de 70, quase todos os museus da cidade tinham seu próprio coral. Hoje, essa prática é rara”. Apesar da quantidade de coros, dificilmente há apresentações na Cidade Universitária. “Não é muito fácil cantar dentro do campus. Primeiro porque o aluguel dos espaços é muito caro. Na Brasiliana, custa R$ 3.000 por período. Segundo que o público não vem para o campus, onde, para dificultar, os portões ficam fechados durante os finais de semana”, explica ele.

Fatores como a ausência de um fosso para ópera e problemas na acústica – a predominância de madeira faz com que as vozes ressoem melhor, ao contrário de metal, carpete e cortinas – são outros obstáculos para os coros. “Parece que você está cantando sozinho”, afirma Henrique, aluno do quarto ano de Música, se referindo a apresentações em auditórios com acústica desfavorável.

Alunos regem

No Laboratório Coral, voltado para ensino e pesquisa, há seis grupos. Dois deles – o Coral da Terceira Idade e o Coral Escola Comunicantus – contam com a participação da comunidade externa para as fileiras de coralistas. Os regentes são os próprios graduandos em Música. “Nenhum professor põe a mão naquele coro”, pontua Marco Antonio, lembrando que tais coros servem também para que os alunos exercitem a regência enquanto ainda estão na faculdade. Sendo assim, existe a preocupação por parte do Coral em inserir pessoas com dificuldades nos coros, para que os alunos aprendam a lidar com empecilhos. O professor acredita que pessoas dos mais diferentes perfis podem cantar juntas em coral: “O desafinado é um mito da deseducação da população. Se você ensina as técnicas, logo consegue afinação”.

Dúzia de sons

O CoralUSP, que é vinculado à Pró-Reitoria de Cultura e Extensão, reúne 12 grupos ao todo, compondo um mosaico diverso de estilos musicais. Ser membro da comunidade universitária não é um requisito para fazer parte de qualquer um dos coros. Além disso, experiência prévia dos participantes não é necessária, na maioria dos casos.

Quando o assunto são as apresentações, Marcia Hentschel, maestrina e diretora artística do CoralUSP, diz que a equipe de produção é grande e consegue lugares para os concertos, tanto dentro quanto fora do campus. Porém, nem sempre é simples. “Existem muitos lugares que querem cobrar e a gente não pode pagar”, conta ela. O CoralUSP segue uma norma de não pagar para cantar, mas, em contrapartida, também não cobra um valor pelo ingresso, salvo quando tal quantia será revertida para uma causa social. Igrejas e teatros municipais e estaduais são os principais palcos dos grupos.

Apesar de cada coro possuir um público específico que o acompanha em concertos, o CoralUSP tem, de acordo com a maestrina, deficiência na questão da visibilidade. A divulgação tem sido incrementada, sobretudo na internet, para tornar o Coral mais conhecido.

Marcia relata ainda que o CoralUSP enfrenta problemas de infraestrutura, pois está localizado no prédio da antiga Reitoria e não possui salas para os ensaios, que atualmente acontecem em locais pulverizados pelo campus. “A gente tinha uma sede que nos foi tirada e agora o anfiteatro [Camargo Guarnieri, próximo à praça do relógio] está sendo reformado para, um dia, abrigar a Orquestra [Sinfônica da USP, Osusp] e o Coral”, diz. Segundo dados da Superintendência do Espaço Físico (SEF) da USP, a reforma do anfiteatro, interditado há quatro anos, custará mais de R$ 19 milhões, deverá ser concluída até dezembro de 2016. No ano passado, o término dessa obra foi listado como uma das metas da Universidade para 2015.

Por Letícia Paiva e Matheus Pimentel