Jornalismo não deve escorregar no proselitismo

Se o tema é feminismo na USP, existe uma notícia relevante e que acabou caindo no esquecimento: o resultado da apuração dos casos de estupros, machismo, misoginia, assédio moral e de desrespeito contra as mulheres da Faculdade de Medicina da USP, que vieram à tona em novembro do ano passado e resultaram em uma CPI na Assembleia Legislativa. Foi um dos grandes escândalos dos últimos tempos a envolver o nome da universidade.
As estudantes que sofreram abusos juntaram forças para contar histórias de humilhação e violência contra mulheres que duravam anos na instituição. Também falaram professores e funcionários. Segundo o próprio Jornal do Campus, foram ouvidas mais de 100 pessoas. Quais medidas foram tomadas? Alguém foi punido? Houve ou não sensacionalismo na cobertura?

São fatos concretos, bem documentados, que poderiam ser o eixo central de uma matéria sobre machismo e os movimentos feministas na USP. O tema foi abordado de passagem e o leitor soube pouco dos desdobramentos da CPI. É relevante mostrar o que pensam os movimentos feministas na universidade. Mas existe uma fronteira que separa notícia e proselitismo. Talvez a matéria tenha ficado muito centrada nos discursos e pouco nos fatos.
O JC desta semana voltou a trazer matérias quentes e interessantes, que mostram uma universidade viva e imersa no cotidiano e na história da cidade. Como o perfil do professor da Faculdade de Educação, Roberto da Silva, que foi interno da Febem, e a história do funcionário do CEPEUSP Igor Silva Oliveira, um dos 19 mortos na chacina de Osasco e Barueri.

Também merece destaque o esforço feito pelo JC para acompanhar, via portal, os desdobramentos da tentativa de assalto que resultou no ferimento do estudante Alexandre Cardoso. A entrevista exclusiva com o diretor da FFLCH, Sergio Adorno, foi importante diferencial na cobertura.

Bruno Paes Manso é jornalista, economista e doutor em Ciências Políticas pela USP. Trabalhou como repórter por dez anos no jornal O Estado de S. Paulo e já recebeu o Prêmio Vladimir Herzog. Hoje atua na Ponte Jornalismo, cobrindo temas de segurança pública, direitos humanos e justiça, além de fazer pós-doutorado no Núcleo de Estudos da Violência da USP.