Uspiano luta por vaga no Rio 2016

Remador do Corinthians, Gael trancou matrícula na EEFE para se dedicar aos treinamentos
(foto: Jessica Bernardo)
(foto: Jessica Bernardo)

Gabriel Campos Alves de Mo­raes é um homem de jornada du­pla. Aluno da Escola de Educação Física e Esporte da USP (EEFE), ele também é atleta de alto ren­dimento. Selecionado pela Fu­vest em 2011, o remador está lutando por uma vaga nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que acontecerão no próximo ano.

Além de remar pelo Sport Club Corinthians Paulista na raia olímpica da universidade, Gael, como gosta de ser chama­do, também se prepara para ser bacharel em educação física. O atleta já têm experiência em Jo­gos Pan-americanos, tendo par­ticipado da edição deste ano em Toronto, no Canadá. Além disso, foi campeão brasileiro em 2015 na categoria skiff simples.

O nível de Gael chegou a lhe render participação no projeto A USP nos Jogos Olímpicos e Jogos Pa­raolímpicos 2016 – Programa de In­centivo e Suporte Técnico Esportivo, que prometia auxílio financeiro e estrutural aos atletas profissio­nais que estudavam na USP.

No entanto, o projeto foi des­continuado pela universidade no início da gestão Zago, em 2014. Mesmo sem poder contar com esse apoio, Gael manteve o so­nho olímpico vivo e decidiu tran­car a faculdade para se dedicar à grande meta de sua vida: compe­tir nas águas da Lagoa Rodrigo de Freitas em agosto de 2016.

JC – Neste ano, você conseguiu ser campeão brasileiro de remo na categoria skiff simples e competiu pelo Brasil no Pan-americano. Dá para conseguir uma vaga nos jo­gos olímpicos no ano que vem?

Gael – Acho que dá. Claro que tem mais gente treinando e achando que dá também. Mas eu tracei esse objetivo desde que eu comecei a remar, coloquei como meta conseguir estar em 2015 no Pan e, em 2016, tentar Olimpíadas. Estou treinando firme para poder ganhar a sele­tiva no início do ano que vem. Ganhando a seletiva, tenho que participar de um pré-olímpico, em março, e nele tenho que fi­car entre os seis. Ficando entre os seis, você garante a vaga.

O primeiro degrau que eu tenho que subir é ganhar a sele­tiva interna. E tem cinco caras, pelo menos, que sei que vão dar bastante trabalho. Vai ser uma prova brigada, coisa de detalhes.

Quantas horas você costuma treinar por dia, em média? E antes de trancar o curso?

Quando eu estava na EEFE, treinava duas vezes por dia. De­pendia do meu horário de aula. Se fosse às 8h, eu conseguia trei­nar das 5h até 7h40 e corria para a aula. Quando era mais cedo, tinha que sair antes. Era sempre duas, duas horas e meia de trei­no por período. E outro período à tarde. Seria até 17h30, dependo do horário que acabasse a aula.

Este ano eu decidi trancar a faculdade, para poder fazer o ter­ceiro período [de treinos]. Então, chego aqui às 5h30 da manhã, faço o primeiro treino até às 8h30 e começo um segundo período às 9h, 9h30. É um período um pou­co mais curto, de uma hora, em que faço bicicleta ou vou para o clube nadar. E o segundo período à tarde, de mais duas horas.

Tranquei este ano para con­seguir a vaga no Pan-Americano. Consegui a vaga, que era um objetivo de muito tempo. O ob­jetivo é conseguir a vaga [nas Olimpíadas] no começo do ano que vem e, conseguindo, eu vou trancar mais um ano para trei­nar para as Olimpíadas. Mas ain­da tenho que conseguir a vaga.

Quando você ainda fazia tanto a faculdade como os treinamentos, como era conciliar essas duas ati­vidades? Em semanas de prova, dificultava muito?

Semana de prova acaba pe­sando, porque você dorme mais tarde. Para vir treinar, você aca­ba vindo cansado. Tem profes­sor que ajuda, entende bastante o fato de você ser atleta. E tem professor que não está nem aí.

Eu estava na correria, ti­nha um mundial universitário e [campeonato] brasileiro logo depois. Tive o brasileiro no final de semana e uma prova na ter­ça. Não consegui estudar para a prova. Fui conversar com o pro­fessor, ele foi supercompreensi­vo, falou assim: “Então vai para casa, estude essa semana e me avise quando você estiver prepa­rado”. Mas já teve professor que, quando eu estava indo para um sul-americano, expliquei a situa­ção, ia representar o Brasil, per­guntei se ele poderia abonar mi­nhas faltas. Ele respondeu: “Não, a única coisa que você vai poder fazer é não faltar mais depois”.

A EEFE, como unidade que ensina esporte na USP, dá algum apoio para os atletas, além da aju­da de um professor camarada?

Não. Se eu quiser ir atrás para ter um acompanhamento do la­boratório de força, eu consigo. Mas não é uma coisa tão aberta.

A EEFE poderia ter um progra­ma para ajudar e atrair atletas?

Poderia. Até o programa USP e as Olimpíadas [o nome comple­to do projeto era A USP nos Jogos Olímpicos e Jogos Paraolímpicos 2016] que teve foi muito mal utilizado. A ideia era muito le­gal. Tinha até acompanhamento odontológico, treinamento de força, todas as áreas que a gente precisaria. Mas acabou ficando só na grana. Não teve nenhum projeto que acarretou em me­lhora de rendimento. Tem algu­mas coisas que estou começando a ver agora, de ter uma perna mais forte que a outra. Poderia ter visto isso na EEFE, por exem­plo, com esse projeto. Mas eu não vi nada disso.

Você fazia parte do projeto que a USP lançou em 2012 para ajudar os atletas uspianos com chances de ir para a Olimpíada. Ele acabou? Cortaram a bolsa?

Acho que foi em 2012 que co­meçou. A gente teve um primei­ro encontro no primeiro ano, um segundo no segundo ano, mas só para cumprimentar o rei­tor. Para o reitor tirar umas fotos com a gente, fazer aquela média, falar que estava ajudando. Mas não teve uma continuidade. Fi­cou só na coisa do dinheiro, não seria o mais interessante do pro­jeto. Toda a infraestrutura que a USP dá para a gente seria muito importante para melhorar nos treinos. Daria para ser um pro­jeto muito legal, que acabou não sendo utilizado.

E quando trocou a gestão [em 2014], a USP congelou a bolsa…

Cortou e sem falar nada. Sim­plesmente não vieram mais con­versar com a gente. Não abriu mais edital nenhum.

Você faz bacharelado em edu­cação física. Teve algum conteúdo no curso que você pensou “isso aqui me ajuda no treino”?

Com certeza. A parte de fi­siologia, o tempo todo a gente trabalha com essa dor do lacta­to [composto naturalmente pre­sente no organismo humano, fruto da fermentação lática em exercícios físicos: seu acúmulo gera dor e cãibra]. Entender de que forma o lactato funciona no nosso corpo, como ele acontece durante a minha competição. São 2.000 metros em que se dá os picos de lactato.

A biomecânica é muito im­portante, posso aplicar perfeita­mente no barco. Dá para fazer uma série de experiências, para ver como a remada está, o tipo de força que eu estou fazendo, a aprendizagem motora… Tem muita coisa que se aplica aos treinos. Praticamente todas as matérias de caráter mais fisioló­gico, de entendimento do corpo humano, me ajudam bastante.

Por Matheus Sacramento