Antiga Estação Ciência pode não reabrir

Em tempos de crise, espaços culturais da Universidade permanecem fechados para reforma
Estação Ciência, museu da USP instalado em prédio de 1926, teve pico de visitação que chegou a 500 mil pessoas no ano (Foto: Elisabeth Leel)
Estação Ciência, museu da USP instalado em prédio de 1926, teve pico de visitação que chegou a 500 mil pessoas no ano (Foto: Elisabeth Leel)

Importante centro difusor de ciência do estado de São Paulo, a Estação Ciência foi fechada à visitação pública em março de 2013 para reformas devido a diversos problemas estruturais. Passados dois anos de entraves burocráticos para a restauração do prédio, a diretoria do museu ainda não sabe precisar se o prédio será reativado como museu ou como será o novo projeto de interação com o público.

Instalada na Lapa, em uma antiga fábrica de tecelagem do início do século 20, a Estação foi fechada após apresentação de um laudo que indicava, entre outros problemas, riscos de queda de material do teto do edifício. Segundo o reitor adjunto João Marcos de Almeida Lopes, atual responsável pela Estação Ciência, um laudo solicitado à época do fechamento indicou que a situação do teto estava muito crítica: “Foram tomadas medidas emergenciais, mas isso não é o suficiente. Tivemos que fechar o museu. Não se pode colocar centenas de crianças lá sabendo que o telhado precisa ser reconstituído”. O prédio, tombado pelo patrimônio histórico, não foi reaberto desde então.

Apesar de terem sido tomadas medidas pontuais de segurança, como evitar que as pessoas entrassem no prédio e proteger a fachada, a restauração do prédio encontra-se estagnada pela crise financeira da Universidade e por trâmites burocráticos. Em uma estimativa realizada pela direção do museu, uma reforma básica giraria em torno de 13 milhões de reais, enquanto uma mais elaborada, com construção de anexo e adequação da fachada, ultrapassaria 20 milhões: “A Universidade não tem como custear tudo isso”, afirma a diretoria.

Além disso, a USP não possui a escritura do imóvel: o terreno foi cedido pelo Governo do Estado de São Paulo através de diferentes concessões para partes distintas do edifício, o que dificulta sua adequação jurídica para dar início à licitação da reforma. Apesar de lamentar a situação em que o edifício se encontra, o reitor adjunto afirma: “O prédio não está valendo a pena: hoje, é pouco provável que o museu reabra naquele edifício. Mas a Estação Ciência não deixa de existir, ela é um projeto, o prédio que está doente”.

Essas dificuldades físicas trouxeram à tona o debate sobre a rearticulação da proposta museológica e sobre como deveria ser um modelo atual de difusão científica. Começou-se a questionar se valeria a pena investir tantos recursos para reabrir um museu com a mesma proposta. “Sabe aquele museu que você coloca a mão no Gerador de Van de Graaff [esfera que, quando tocada na sua superfície, faz com que os cabelos do visitante arrepiem]? Esse tipo de recepção lógico-formal de um conhecimento ou fenômeno natural, isso está ultrapassado”, afirma Lopes.

Esse tipo de atividade interativa para promover o aprendizado científico foi a marca da Estação desde sua criação, em 1987. A estratégia funcionava bem: era um dos museus mais populares da USP, recebendo cerca de 20 mil visitantes por ano, além de ser um aparelho cultural importante da Zona Oeste. Contudo, para a direção do museu, espaços como o Museu Catavento ocupam hoje o papel que a Estação teve no passado. Para continuar na vanguarda da difusão científica, a Estação deve, nas palavras do reitor adjunto, “desapegar dessas linguagens e começar a pensar coisas novas”.

Para estruturar um novo projeto museológico, foi criado um grupo de discussão entre representantes da Estação Ciência, Parque Cientec e Museu de Ciências, todos administrados pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão, para repensar o modelo de divulgação científica implementado pela Universidade. Até o momento foi realizado um seminário, em julho deste ano, com o objetivo de trazer novas ideias para o debate. O próximo passo é apresentar uma publicação que sintetize as propostas discutidas no evento e apresente um esboço com as diretrizes para este projeto, que ainda não possui prazo para ser concluído.

A direção da Estação ressalta que a intenção não é realizar um desmonte do aparelho cultural da Universidade, mas sim buscar uma saída: “O público às vezes é muito conservador, principalmente com a ‘perda’ do espaço. Hoje nós temos uma outra realidade e existe a necessidade de desapegar dos velhos modelos”, explica. Apesar do projeto não estar estruturado, algumas ideias propostas são a fragmentação do espaço em vários locais da cidade e atuação virtual.

Museu Paulista: nove anos de reclusão

A Estação Ciência não é o único aparelho cultural relacionado à Universidade que está fechado ao público: o Museu Paulista, conhecido como Museu do Ipiranga, ficará nove anos sem visitantes para reformas. Lar de mais de 18 mil peças, entre elas o famoso quadro “Independência ou Morte”, de Pedro Américo, o espaço tem previsão de reabertura apenas para 2022, ano em que se comemora o bicentenário da proclamação da Independência.

Além da coincidência do ano de fechamento, a situação deste Museu pouco se assemelha à da Estação. O espaço funciona como unidade da USP, com administração semelhante às de ensino como a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH). Além disso, esse espaço passará por modificações estruturais e expansão, sem alterar suas missão e proposta.

Apesar de estar fechado há dois anos, a reforma ainda não começou. Em 2013, a Superintendência do Espaço Físico da USP estimou em R$ 21 milhões o restauro predominantemente das fachadas do edifício. Contudo, segundo a assessoria do museu, a atual gestão da USP optou pelo restauro e modernização integral do prédio: “não só fachadas, mas coberturas, ambientes internos e outros itens, incluindo aspectos adicionais relevantes”.

Para que possam ser iniciadas as obras civis, é necessária a desocupação quase integral do edifício, permanecendo apenas o que é de grande porte ou de difícil remoção – como o quadro de Américo, que possui mais de 7m de largura. Devido às limitações financeiras da Universidade, o Museu não sabe precisar quando essa nova fase do processo de reforma será iniciada.

Segundo Luciene Moro, coordenadora pedagógica do Sesi Ipiranga, alguns espaços do Museu, antes de ser fechado, já estavam isolados e sem acesso ao público. “O que causou estranhamento não foi anunciarem o fechamento do Museu para reforma. O prazo que deram para a reforma foi o que assustou”, explica.

Os alunos deste Sesi costumavam realizar visitas periódicas ao Museu para aulas de história e literatura, assim como outras 119 escolas que visitaram o local apenas no ano de 2013. Para a coordenadora, as visitas eram parte importante do aprendizado por realizarem este contato prático do aluno com o conteúdo. “Até procuramos outros espaços para suprir a lacuna, mas não há muitas opções”, afirma Luciene.  

Buscando retomar o contato com o público, será inaugurado um núcleo educativo, em um dos sete imóveis alugados para preservação do acervo, na Avenida Nazaré, ao lado do Museu. Segundo a assessoria do museu: “Neste imóvel também serão ministradas disciplinas optativas oferecidas aos alunos de graduação vindos das unidades de ensino e também alunos especiais externos à Universidade.”

Este novo espaço, contudo, não tem a pretensão de assumir a recepção dos mais de 170 mil visitantes que foram ao Museu somente em 2013. Com uma estrutura física e de equipe muito menor, o núcleo busca manter uma parte das ações educativas promovidas pelo MP. “A ideia principal é manter as ações educativas no Bairro do Ipiranga, relacionadas à história do próprio Bairro, do Parque da Independência e, é claro, do Museu Paulista. A equipe de educadores também realiza atividades em outras locais”, afirma a assessoria.

Por Beatriz Quesada