De patas abertas para prática esportiva

Tutores se encontram aos domingos no Bosque da Física para praticar esportes com seus cães
(Foto: Vitória Batistoti)

Em setembro deste ano, o buldogue Otto, cão peruano, entrou para o Guinness, o livro dos recordes, ao atravessar o “maior túnel humano” do mundo em cima de um skate.

Como Otto, muitos outros cães são incentivados a se exercitar pelos seus próprios tutores. Uma exemplo disso é a prática do dog pulling skate (cão puxando o skate, em tradução livre), atividade na qual o cão é responsável por conduzir o skatista que segura a guia do animal. A atividade tem se popularizado bastante e já adentrou o espaço universitário: o grupo de amigos Dog Pulling Skate é um exemplo disso. Com o uso de e skates ou patins, a prática tem capacidade de oferecer momentos de companheirismo e espaço para que o animal descarregue sua energia.

Amigo de quatro patas

Como os seres humanos, os cães apresentam habilidades sócio-cognitivas e são capazes de comunicar e interagir, além de criar vínculos afetivos com seus tutores. “Muitos padrões comportamentais dos cães parecem especialmente direcionados para induzir o cuidado de seus tutores, assim como fazem as crianças”, explica Carine Savalli, pesquisadora na área de comunicação cão-ser humano e professora da Unifesp.

Por isso, quando o tutor trata o animal com afeto e atenção, esse relacionamento cria forte vínculo afetivo, de forma que é benéfico tanto para o animal, já que garante sua sobrevivência com alimentação e segurança e  atende suas necessidades física e emocionais, como para o ser humano. “Há estudos que mostram que acariciar e olhar para o seu cão promove alterações hormonais, como aumento da ocitocina, que está ligado a criação de vínculos afetivos, e alterações em parâmetros fisiológicos no sentido de aumentar a saúde e bem-estar”, comenta Savalli.

Como são animais sociais, o isolamento dos cães pode acarretar em problemas de comportamento, alguns dos quais são potencialmente destrutivos e agressivos. Responder a esses comportamentos com punições, contudo, é capaz de piorar a conduta dos animais. Nesse sentido, praticar atividades com o companheiro canino pode ser uma ótima oportunidade para passar um tempo com o animal, ainda mais para cães que possuem muita energia e necessitam de atividades para descarregá-la. “Se você percebe que seu animal continua agitado, mesmo com passeios diários, é importante pensar em outras atividades para que essa excitação não prejudique o cão”, comenta Alice Frank, psicóloga e mestre pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ-USP).

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Caio e seu Boxer Ozzy com o peitoral indicado para a prática (foto: Vitória Batistoti)
Patas  e rodas

Essa é a ideia do grupo Dog Pulling Skate. Os encontros já ocorrem há quatro meses, aos domingos, a partir das 10h, no Bosque da Física, na Rua do Matão. As atividades são registrados no Instagram do grupo (@dog_pullingskate), que é alimentado com fotos de cães atletas que praticam o esporte tanto nos encontros pela USP como ao redor do mundo. Caio Alves, um dos idealizadores do grupo e tutor do boxer Ozzy, acredita que seu cão melhorou muito com a atividade. “Ele é um cachorro bastante agitado, mas, antes, era ainda mais. Agora, praticando esporte, ele consegue se desestressar e conviver muito melhor com outros cachorros”, relata.

Entretanto, antes que o cão se acostume com a atividade, pode existir certa resistência no começo. Fernando Furuya explica que para praticar com Sheik, pitbull do qual é tutor, começou utilizando um brinquedo que o cachorro gostava. “Coloca o brinquedo a uma certa distância, pega o skate e tenta fazer ele buscar. Vai aumentando a distância até ele pegar gosto”. O tempo de adaptação para a prática, todavia, varia de animal para animal. “Alguns terão mais aptidão, outros vão latir e morder o skate”, relata.

Para iniciar a brincadeira, é importante que o tutor tenha domínio com o veículo que vai utilizar, seja ele skate, patins ou bicicleta. Isso é necessário porque o cão pode estranhar muito no começo e disparar em alta velocidade, se distrair com algum outro objeto ou até mesmo parar de correr bruscamente. “Quem não tiver experiência e quiser começar a praticar, é bom vir com equipamento: capacete, cotoveleira, joelheira”, explica Fernando.

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João Paulo e seus dois cachorros, Mufasa e Shitara (foto: Vitória Batistoti)
Cuidados prévios

Antes de incentivar o animal a praticar quaisquer atividades, contudo, é fundamental visitar um veterinário, pois, como é uma prática que exige esforço, animais acima do peso, idosos, cadelas prenhas ou filhotes, e ainda aqueles em situações de vulnerabilidade, devem evitar a brincadeira. Além disso, é importante que o animal faça um acompanhamento veterinário. De acordo com Maria de Fátima Martins, professora da FMVZ-USP, o acompanhamento serve para avaliar as alterações cardíacas, observar se após a caminhada o animal  perdeu peso corporal ou apresentou fadiga cardíaca induzida por exercício. Ela ressalta a importância de ter atenção com a hidratação do animal,  praticar a atividade em um ambiente calmo e vazio, no qual a temperatura esteja amena, além, é claro, de identificar se a atividade é prazerosa pra ele, o que é possível através da análise de seu comportamento.

Respeitando os limites do animal, a atividade pode proporcionar, ainda, uma melhoria no relacionamento entre cão e tutor, como relata Caio: “Até a educação deles melhora, porque eles executam melhor os comandos quando estão cansados do que quando estão agitados”. A professora Maria de Fátima afirma: “vejo como extremamente benéfico se for respeitada a biologia e fisiologia do animal”.

O grupo Dog Pulling Skate, além de promover atividades esportivas que unem cães e humanos, também é um encontro de socialização canina. Sem distinção de raça, os cachorros atletas e dóceis do grupo estão de patas abertas para quem quiser participar, até mesmo para quem não tem habilidades com a prática.

Por Vitória Batistoti