Especial ECA 50 anos – CANiL_ completa 10 anos de intervenções

Espaço abandonado tornou-se símbolo de resistência cultural e estudantil

Em 2016, o CANiL_Espaço Fluxus de Cultura completa dez anos como um local de intervenção cultural. Considerado um “capricho arquitetônico”, o pequeno prédio foi construído em formato arredondado, com teto parcialmente aberto, em forma de uma estrela de quatro pontas. O local – onde acredita-se, teria funcionado um canil – ficou abandonado por muito tempo, quando no dia 4 de maio de 2006, alunos da ECA ocuparam-no para transformá-lo, após marretadas nas paredes internas, em um ambiente de criação e experimentação cultural.

Fachada do antigo CANiL demolido em 2012 (foto: Paulo Fávero)
Fachada do antigo CANiL demolido em 2012 (foto: Paulo Fávero)

Desde então, foram diversas as apropriações do espaço, que serviu como palco de shows, de reuniões de conselhos, de apresentações teatrais e de dança, de festival de cinema e de música, entre outros eventos. O apoderamento do local surgiu no mesmo momento em que outros espaços estudantis eram fechados ou proibidos pela reitoria; e por isso, a área tornou-se um importante centro de encontro entre os alunos. Paulinho Fluxus, um dos fundadores do projeto e ex-aluno de Artes Visuais, conta que o CANiL_ era um ambiente “vazio que dava ideias”, onde tentava-se suprimir a carência de convívio cultural e de experimentação que existem na USP. “A gente queria articular a complementação das faltas, de encontrar outras linguagens, de celebrar as artes”, complementa.

Embora o convívio fosse pacífico, alguns alunos comentam que o espaço era monopolizado por um pequeno grupo, que escolhia quais seriam as intervenções presentes no espaço. Flora Assumpção, ex-aluna de Artes Visuais, conta que o grupo era antidemocrático, e que apenas algumas intervenções podiam ser feitas no local. “Quem não tivesse um pensamento alinhado ao deles, era banido. Houve rachas até mesmo entre os alunos que iniciaram a ocupação, pois esta acabou sendo dominada por um grupo autoritário. Alguns alunos acabaram preferindo se desligar ou foram expulsos”, explica.

CANiL_ e as QIBs

Coro de Carcarás no Festival do Cão em 2012 (foto: Arquivo JC)
Coro de Carcarás no Festival do Cão em 2012 (foto: Arquivo JC)

As Quintas i Brejas surgiram de uma resposta à proibição da Reitoria de vender cerveja e bebidas alcoólicas dentro do campus, em 2002. Para o centro acadêmico da ECA (Calc), esta era uma tentativa de extinguir os momentos de convivência entre alunos, para além da sala de aula. Desde então, o Calc passou a organizar as festas, que ocorriam às quintas-feiras e reuniam alunos, baterias, bandas e outros grupos na ECA. Para os alunos, a QiB era o momento de encontro, um ambiente de realizações e vivências da universidade.

CANiL_ e sua resistência

Em 2012, ocorreu a ocupação da reitoria da USP pelos alunos, em resposta à tentativa de extinguir a democracia na universidade. Com o fim da ocupação, em novembro do mesmo ano, os alunos perderiam não somente sua voz, mas também seu espaço de convivência. Nesse interim, a reitoria demoliu, sem aviso prévio, o CANiL_, na manhã do dia 22 de dezembro. Em uma atitude completamente arbitrária e de retaliação, a direção da universidade provou que não era de seu interesse permitir espaços de convivência entre os alunos.

Oficina de grafite – Semana de Arte e Política em 2011 (foto: Lúcia Lima)
Oficina de grafite – Semana de Arte e Política em 2011 (foto: Lúcia Lima)

Esta não foi a primeira vez que tentaram demolir o espaço: a investida anterior ocorreu em 2010. Mas, na época, os alunos e a diretoria da ECA conseguiram intervir a tempo, pedindo mais diálogo com a reitoria e com a COESF (Coordenadoria de Espaço Físico da USP).

Geodésica construída após demolição da estrutura original (foto: Divulgação)
Geodésica construída após demolição da estrutura original (foto: Divulgação)

Como uma tentativa de reviver o espaço, um novo projeto arquitetônico surgiu dos alunos da universidade. Uma grande instalação de aço na prainha tentaria ocupar o espaço perdido do CANiL_. Com os mesmos 10 metros de diâmetro, uma geodésica foi construída em três partes. Finalizada em 6 de junho de 2013, ela é hoje símbolo da resistência do CANiL_, e é utilizada pelos alunos em reuniões e apresentações musicais e performáticas.

Para comemorar a data, um grupo dos fundadores pensam em organizar um evento cultural no mês de maio. Pois, para eles, é preciso lembrar que o CANiL e as QiBs devem ser, acima de tudo, uma celebração da liberdade de expressão, e que por isso devem ser reconquistadas pelos alunos.

 

Por Carolina Pulice