Atletas escolhem entre esporte e estudo

Com pouco apoio da Universidade, manter as práticas esportiva e acadêmica em alto nível segue sendo um desafio, apesar da melhora no cenário

O esporte universitário no Brasil, como um todo, carece de investimento das próprias instituições que abrigam esses atletas. Dentro da Universidade de São Paulo, por exemplo, 2958 atletas fizeram carteirinhas da Liga Atlética Acadêmica (LAAUSP) em 2015, documento que os permite participar de campeonatos internos. Desses, alguns já chegaram a participar do esporte de alto nível e depois tiveram que abdicar para continuar jogando, ou vice-versa. Levar os dois com maestria é tarefa difícil e exige muito mais do que tempo ou disposição, especialmente para os que atuaram ou atuam em grandes equipes.

O mínimo apoio da USP ao esporte, seja em estrutura para treinos ou arcando com os custos de campeonatos nos quais os atletas levam o nome da instituição, começou a aparecer há pouco tempo e chega a fazer diferença, apesar de ainda não ser o ideal. Esse foi o primeiro ano que ouvi falar sobre dinheiro para competições e para o esporte. Nosso centro esportivo está completamente sucateado , além de muitas vezes possuir áreas perigosas pra pratica esportiva , por conta da falta de manutenção e o descaso total da reitoria com o espaço”, declarou Clarice Tambelli, aluna do Instituto de Relações Internacionais (IRI) e jogadora federada de handebol durante cinco anos. Ela lembra que desde que chegou à Universidade, em 2012, ouve sobre a reforma das quadras cobertas, obra que começou apenas este ano. Além disso, o problema fica ainda maior para esportes com menos evidência no país. “Um exemplo bem elucidativo seria o fato de não possuir um campo de rúgbi (quando possuímos tantos de futebol) e poucas áreas para prática adequada de lutas”, disse Alexia Araujo, judoca e aluna da Escola de Comunicações e Artes (ECA).

Luiz Fernando Rodrigues, esgrimista e aluno do Instituto de Física (IF), aponta que o maior problema em conciliar os estudos ao esporte está em professores que não compreendem a junção desses dois universos. Ele, inclusive, assim como outros praticantes, chegou a perder provas e atividades por conta de competições. O estudante também lembra que o tempo máximo para se formar é baixo para a demanda de alguns cursos, ainda mais se este estiver aliado a outras atividades. Caio Pantarotto, nadador e estudante da Escola Politécnica, acrescenta  que é indispensável “evidenciar a importância do esporte como complementar à formação, motivando mais alunos a ingressarem nesse meio e dando maior visibilidade do esporte em um contexto externo à USP”.

A escolha entre esporte e estudo não precisa ser feita apenas no ensino superior. Na tentativa de ingressar em uma boa faculdade, os atletas acabam concentrando seus esforços em salas de aula do ensino médio e de cursinhos, fator que os afasta das quadras, piscinas e tatames. Foi o caso da Heloisa Marcondes, aluna da ECA e jogadora de vôlei, que depois de muito tempo se dedicando aos treinos e jogos por um time profissional, deixou sua equipe e já não fazia mais parte do esporte de alto nível quando ingressou na USP. “Para falar a verdade, acho pouco provável conciliar uma vida no esporte profissional com uma vida acadêmica. Acho o apoio da Universidade importante, porém é muito inexpressivo, principalmente em relação ao esporte universitário de outros países, mas acho um bom começo”, declarou.

A comparação com grandes potencias esportivas chega a ser inevitável. Nos Estados Unidos, por exemplo, o esporte é bastante incentivado nas escolas e universidades. Michael Jordan, o grande astro do basquete, foi descoberto na liga universitária de basquete do país e contratado pelo Chicago Bulls, onde iniciou sua jornada no profissional. “Se chegássemos nesse âmbito, seria bacana. Teria como a USP, pela grandeza que tem, fazer esse incentivo maior. Parte do esforço precisa ser das atléticas, mas é importante que a reitoria esteja um pouco mais empenhada nisso”, comentou Christian Anderaos, jogador de futebol e futsal e aluno da EEFE.

É um rotina dura mas, ainda assim, tem seus pontos positivos. Caio ressalta que seu desenvolvimento esportivo foi afetado pela faculdade e que a existência de atléticas organizadas e competições com alto nível esportivo são uma grande motivação para aguentar a rotina de treinos e buscar melhores resultados, além das amizades que se constroem nesse contexto e que são fundamentais para a manutenção dessa cultura esportiva. Clarice também ressalta a parte boa dessa vida dupla. “A faculdade só reforçou o papel essencial do esporte na minha vida. Meus laços mais fortes, meu contato com os veteranos, minha sensação de pertencimento são dentro dele..

Com certeza meu desenvolvimento esportivo foi influenciado pela possibilidade de continuar jogando e participando de campeonatos”, finalizou.

Christian Anderaos – Federado por 8 anos no futsal e 2 anos no campo

Depois que entrei na faculdade, diminui bruscamente a quantidade de treinos. Treinava todo dia e passei a treinar duas vezes por semana, as vezes quatro. Foi bem difícil conciliar tempo porque não estava acostumado com o estudo. Quando rolou essa mundaça, tive dificuldade, era muito tempo estudando e tinham treinos a noite, no almoço.

Minha rotina de treinos era intensa. Treinei desde os 9, 10 até 13, treinava a noite. Depois até 16 treinava a tarde, e depois de manhã e a tarde, aí estudava a noite, das 7 as 11. Os treinos começavam as 8, as vezes até antes

O apoio dado tá crescendo um pouco mais, ano passado fui da seleção e crescemos. podia ter mais divulgação até por parte da diretoria, mostrar que eles tão interessados em divulgar nosso esporte, que eles querem nos incentivar, fazer atléticas fortes. Seria legal tomar como parâmetro os EUA, os jogadores saem das equipes universitárias e vão para o profissional, é muito comum. Se chegássemos nesse âmbito, seria bacana. teria como a usp, pela grandeza que tem, fazer esse incentivo maior. Parte das atléticas, mas seria legal se a reitoria estivesse um pouco mais empenhada nisso

(foto: acervo pessoal)
(foto: acervo pessoal)

Desenvolveu totalmente a minha parte de raciocínio. Ensinam muito como poderíamos jogar, coisas a se pensar, questionar. Fisicamente, cai muito de rendimento. Antes treinava muito e tinha um condicionamento melhor. Minha parte esportiva, de técnicas e movimentos, desempenhei de forma bem melhor e os números provam isso. Fomos campeões, fiz grandes jogos, fui declarado o melhor jogador da EEFE. Mudei muito, sou outra pessoa e muito mais inteligente jogando. Meu nível federado e de estudante é muito diferente. Abaixei meu físico mas ganhei cabeça.

Ter que dar sua vida na faculdade e dar sua vida no treino é muito difícil. Essas pessoas tem que ser tomadas como ídolos, eu tive muita dificuldade. Foquei no treino e acabei indo mal em algumas provas.

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