Adusp se opõe a alterações de carreira apresentadas pela reitoria

Professores da Universidade aderem à greve e questionam proposta para o regime de trabalho, avaliação e progressão na carreira docente
(Foto: Daniel Tubone)

Os docentes da Universidade encontram-se em greve desde o dia 30 de maio, após discussão realizada na Assembleia Geral da Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo (Adusp). O reajuste salarial (de 3% para este ano, incompatível com a inflação de 9,28% registrada entre abril de 2015 e 2016) permanece como um dos principais eixos da greve. Pautas mais específicas da categoria vêm sendo debatidas em reuniões como o debate ocorrido na sexta-feira (03) no Instituto de Física (IF) e o 1º Encontro de Docentes, realizado nesta segunda-feira (06), no Centro de Difusão Internacional.

A deliberação de greve ganhou mais força após a ausência do reitor Marco Antonio Zago em duas ocasiões: na reunião entre Fórum das Seis e o Cruesp; e no debate realizado no Instituto de Física. A reitoria afirma que Zago encontra-se em período de férias.

A última greve da Associação ocorreu em 2014, quando Unesp, Unicamp e USP paralisaram em reação ao reajuste salarial de 0% oferecido pelo Cruesp (Conselho de reitores das Universidades Estaduais de São Paulo) em reunião com o Fórum das Seis, que congrega as entidades sindicais e estudantis das três universidades. Nos últimos 10 anos, os docentes entraram em greve apenas em 2007 e 2009 – além de 2014 –, enquanto os estudantes paralisaram seis vezes e o Sintusp, quatro.

(Foto: Daniel Tubone)

Reinvindicações

A assembleia geral deliberou pela greve declarando ser contra o que é considerado o desmonte da Universidade, que seria promovido através de decisões da atual gestão de Zago. Dentre estas decisões, a assembleia destacou ser contra as mudanças na “carreira docente”, a nova proposta de avaliação docente e institucional, o não reajuste salarial, a não contratação de docentes e técnicos-administrativos no quadro funcional da Universidade e contra a “destruição do patrimônio da universidade que se expressa nos ataques ao HU, HRAC, creches e Escola de Aplicação, entre outros”

Em conversa com o JC, Elisabetta Santoro, 2ª Vice-Presidente da Adusp e docente da Faculdade Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), explicou a principal pauta defendida pelos professores nas últimas reuniões: as mudanças na “carreira docente” e na avaliação. De acordo com Elisabetta, estas mudanças vêm de antes da gestão de Zago. Ainda como presidente da Comissão de Especial de Regimes de Trabalho (Cert), o atual reitor já apresentava raízes de suas ideias que estão sendo discutidas atualmente. A vice-presidente conta que em 2014, no ínicio da gestão de Zago, foi criado um Grupo de Trabalho – Atividade Docente (GT-AD) formado por 7 pessoas indicadas pelo reitor e que tinha como função propor funções no estatuto do docente. “Em certa altura este grupo divulgou um primeiro relatório, com muitos problemas, mas já apresentava propostas que agora encontramos nestas novas propostas que são apresentadas agora”.

Na época, os relatórios do Grupo foram fortemente criticados por muitas congregações de docentes das unidades da USP. Já em 2016, foi realizada a primeira discussão publica sobre o tema em uma com todos os docentes contratados a partir de 2013. Em seguida, o GT-AD publicou o documento com as novas propostas. As principais mudanças seriam a centralização da avaliação docente e institucional –  que deveria acontecer a cada 5 anos –  por uma nova Comissão Permanente de Avaliação (CPA) formada por nove integrantes indicados pelo reitor; e que os novos docentes contratados deveriam ingressar na faculdade com o Regime de Turno Parcial (RTP) de 12 horas, podendo evoluir para o Regime de Dedicação Integral à Docência e à Pesquisa (RDIDP). Elisabetta diz que a Adusp tem uma série de críticas ás novas propostas apresentadas pela reitoria. A primeira é em relação a ausência de diagnóstico. “Porque estamos fazendo isso? Isso é algo importante, porque estamos numa universidade, somos pesquisadores, somos pessoas que costumam encontrar soluções a partir de um problema”, explica. “Quando isto foi perguntado a explicação foi de que a USP precisava melhorar sua posição nos rankings internacionais”.

A segunda crítica fala sobre a centralização desta avaliação. “São nove pessoas para avaliar 6 mil docentes. A participação do departamento e unidades é nula, todos os integrantes são indicados pelo reitor”, aponta Elisabetta. Além disto, no documento não é declarado de que maneira esta avaliação dos docentes será feita. “Fala-se de avaliação qualitativa, mas não se sabe quais seriam estes critérios, o que pode ser muito grave”. A preocupação levantada pela vice-presidente da Adusp vêm de outro ponto presente no documento. Após passar por esta avaliação, os docentes que não atingissem os resultados esperados poderiam sofrer sanções, como a impossibilidade de ocupar cargos administrativos em seus departamentos. “Um exemplo é que se os departamentos não tiverem uma performance considerada adequada poderão ter sua autonomia retirada, o que é um princípio básico da universidade”. Por fim, a crítica as mudanças nos regimes de trabalho vêm desta mesma preocupação com as possíveis sanções realizadas pela CPA. “A gente imagina que uma das punições possíveis seja o rebaixamento do regime de trabalho. Inicialmente RTP E RTC não eram punições, eram simplesmente outros regimentos de trabalho que serviam para casos específicos”, explica Elisabetta.

Outro lado

O reitor Marco Antonio Zago convocou todos os docentes a participarem, no dia 06 de junho, da reunião organizada pela representação no Conselho Universitário. As discussões giraram em torno do aprimoramento do regime de trabalho, avaliação e progressão na carreira docente. No dia 7, outra reunião com a mesma finalidade foi realizada no campus de Ribeirão Preto.

Zago definiu as novas Normas de Avaliação Docente e Institucional como uma “oportunidade histórica”, e pontuou que estas serão as primeiras mudanças na carreira desde a aprovação do atual estatuto, em 1988. Ele enfatizou que se trata apenas de uma proposta inicial, que deve ser aperfeiçoada e amadurecida até a reunião do Conselho Universitário em agosto.

A principal justificativa para a reformulação seriam as diversas críticas acumuladas no decorrer dos anos. “Ao longo da minha carreira, tenho ouvido queixas sobre o regime atual. Concordo com muitas delas, e é por isso que estou empenhado nesta modernização”, declara Zago.

(Foto: Daniel Tubone)

O reitor elencou as principais críticas ao atual regime: a avaliação docente não é considerada equilibrada; a dedicação ao ensino de graduação não recebe a devida atenção; e o trabalho de extensão, pontuado por Zago como um pilar valioso nas universidades modernas, não se reflete na avaliação. Tanto a avaliação quanto a progressão na carreira seriam vistas pela maioria dos docentes como desvinculadas à vida nos departamentos e nas unidades – visão que, de acordo com Zago, deve ser mudada.

A proposta conta com cinco princípios fundamentais: integração da avaliação docente em um panorama amplo, que leve em conta as propostas de unidade e do departamento; mudança do conceito de avaliação docente para o de acompanhamento do docente; simplificação da avaliação; descentralização do processo, delegando responsabilidades crescentes aos departamentos e às unidades; e aumento da participação do Conselho Universitário na definição de parâmetros indicador.

De acordo com Zago, o acompanhamento do docente será feito a partir de um projeto de carreira acordado entre o profissional e seu departamento e unidade, permitindo eixos preferenciais de atuação segundo as qualidades e preferências do docente: pesquisa, ensino de graduação e extensão. “Um único processo deve servir para acompanhar a carreira, garantir estabilidade e assegurar a promoção horizontal”, declarou Marco Antonio Zago.

À pedido dos docentes, o período de debates sobre as mudanças na carreira foi estendido até o final de agosto, data de prorrogação da reunião do Conselho Universitário que deve votar a proposta. O vice-reitor Vahan Agopyan demonstrou preocupação com o prazo: “eu quero chamar a atenção para não postergarmos muito. Se não conseguirmos discutir este ano, infelizmente ficará para a próxima gestão”.

Quais são as propostas da reitoria?

  • Mudança do conceito de avaliação docente
  • Descentralização do processo e maior participação do Conselho Universitário
  • Reajuste salarial de 3%
  • Ingresso na universidade em regime RTP com evolução para RDIDP

O que a Adusp responde

  • Falta de diagnóstico e ausência de critérios na avaliação
  • Centralização do processo em comissão com nove integrantes
  • Reajuste mínimo no valor de inflação 9,28%
  • RTP e RTC tornam-se regimes menos prestigiados

Por Daniel Tubone e Marcos Nona