Fazer intercâmbio: vale a pena?

Brasileiros e estrangeiro contam a experiência de estudar em outro país
Foto: Marcos Santos/USP Imagens
Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Em 2001, no primeiro ano deste século, apenas dois alunos da USP rumaram para o exterior em intercâmbios vinculados à Universidade. Um do Instituto de Química (IQ) e um da Escola Politécnica (Poli); um para a França e um para a Alemanha. Mais de dez anos depois, em 2014, no auge dos intercâmbios, a USP enviou 3448 estudantes para o exterior e recebeu 1782 estrangeiros.

Os dados, disponibilizados pela Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional (Aucani), refletem a popularização dos intercâmbios e o crescente número de bolsas e programas de incentivos à formação acadêmica no exterior, como o Ciência Sem Fronteiras, criado pelo governo federal em 2011. Simultaneamente, as estatísticas demonstram tendência de queda na quantidade de estudantes indo para o exterior a partir do ano passado, em consonância com os cortes em programas de bolsas e a crise da Universidade.

A despeito da redução de vagas, muitos alunos da USP ainda sonham em estudar fora do país. Para entender o que motiva os estudantes a deixarem suas casas rumo ao exterior ― e compreender, também, o que faz com que estrangeiros se aventurem em terras brasileiras ― o Jornal do Campus conversou com os que já foram e com os que estão experimentando um intercâmbio.

Porquê estudar fora

Pedro Ivo Toscano trocou a FEA pela Kedge Business School of Marseille no segundo semestre de 2014. Aos 23 anos, o então estudante de contabilidade foi para o exterior sem bolsas de estudo, mas com a expectativa de desenvolver línguas e de conhecer novas culturas; voltou para o Brasil com muito mais. Passado o choque cultural inicial ― o feano morava com 200 outros estudantes no alojamento da faculdade ― o convívio em terras francesas tornou-se mais fácil e Toscano desenvolveu-se tanto pessoal quanto profissionalmente, ganhando em capacidade de lidar com as diferenças e em independência. Além disso, as aulas mais voltadas para o marketing e a comunicação ajudaram o agora bacharel em contabilidade a focar em uma nova área de interesse, o que o motivou a começar, neste ano, o bacharelado em Relações Públicas.

No mesmo período que Toscano, mas no país vizinho, Cesar Mamede experimentava seu primeiro intercâmbio, na University of Bremen. Nos quatro meses que passou na cidade alemã ― três deles com bolsa conseguida com a faculdade estrangeira ― não só teve a oportunidade de conhecer mais profundamente um outro país, como conseguiu dar  uma pausa na rotina de estudos no Brasil, que após mais de dois anos de graduação já eram maçantes. Tomou gosto pela coisa e no ano seguinte deixou novamente a Escola Politécnica, dessa vez rumo à Sydney.

Em terras australianas, Mamede não só vivenciou a mistura de culturas do país da Oceania, como também teve a oportunidade de  estudar em uma dinâmica melhor. “As aulas são muito melhores, uma carga horária menor, as matérias são mais bem pensadas, além das condições oferecidas pela faculdade para o aprendizado. É muito mais fácil estudar lá, pela acessibilidade e estrutura da faculdade”, explica. Além disso, o período na University of New South Wales ― bancado pelo Ciência Sem Fronteiras ― proporcionou ao estudante de engenharia química  um “enorme” crescimento pessoal e as “melhores experiências” de sua vida.

Vivendo a experiência

Se Toscana e Mamede já retornaram de seus intercâmbios, Carolina Pulice está vivendo a experiência durante este semestre. Em Lyon há apenas um mês, a estudante de jornalismo ainda está assistindo suas primeiras aulas mas já sofre com as expectativas. “Um dos grandes problemas que eu estou tendo é de conseguir conciliar as expectativas dos outros com as minhas expectativas, e com a realidade. A gente chega aqui querendo fazer um milhão de coisas, mas muitas vezes, por questão financeira, ou porque tem que estudar, ou porque simplesmente não dá, acabamos deixando de fazer várias coisas”, explica. Apesar do receio de não conseguir aproveitar o que o intercâmbio tem para oferecer, a estudante acredita que as aulas em um idioma diferente, assim como as novas experiências acadêmicas já são o suficiente para fazer o semestre na França valer a pena.

Estrangeiro no Brasil

Beat Hafner trocou a University of St. Gallen ― na região nordeste da Suíça ― pela FEA no início deste semestre. Aos 22 anos, o suíço veio para o Brasil por indicação de um colega suíço-brasileiro que morara em São Paulo e de outros dois amigos que realizaram intercâmbios na cidade. Morando na Vila Madalena, Hafner aproveita o tempo livre entre as aulas da FEA e as de português para aproveitar a abertura e a receptividade dos brasileiros, os points da cidade ― ele cita a Praça Roosevelt e o Parque do Ibirapuera ― e comidas brasileiras, como o açaí.

Campeãs

A Escola Politécnica, desde os primeiros anos em que o intercâmbio passou a ser parte da realidade uspiana, é a campeã de envios: nos últimos quatros anos, cerca de 20% dos intercambistas brasileiros da USP eram estudantes da Poli. A Escola de Engenharia de São Carlos, a vice-campeã, representa aproximadamente 15% dos intercambistas durante o mesmo período. Além das duas, a Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos de Pirassununga (FZEA), a Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), a Escola de Comunicações e Artes (ECA), a Faculdade de Direito (FD), a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), a Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) e a Escola de Engenharia de Lorena (EEL) se destacam entre os institutos que mais enviam intercambistas. Já entre as que mais recebem estudantes do exterior, a Poli, a ECA, a FEA e a FFLCH despontam como as principais hospedeiras.

Em relação aos países que mais recebem os brasileiros, a França é a grande campeã: só neste ano, 522 brasileiros desembarcaram no país para estudar. Além do país gaulês, o lusófono Portugal, os Estados Unidos, a Austrália, a Alemanha, a Espanha e a Inglaterra vêm hospedando estudantes da USP nos últimos anos. A Universidade, simultaneamente, recebe grande quantidades de latino-americanos ― especialmente de Colômbia, México e Peru ―, e de europeus ― com destaque para os franceses, os alemães, os espanhóis e os portugueses.

A reportagem do Jornal do Campus contatou a Aucani para compreender o funcionamento dos intercâmbios e entender os motivos que levaram à redução das bolsas e, consequentemente, da ida e vinda de alunos. O órgão informou que o aluno interessado deve acompanhar as oportunidades publicadas no site – www.usp.br/internationaloffice e se inscrever nos editais na área pública do sistema corporativo Mundus (www.uspdigital.usp.br/mundus). Até o fechamento desta edição, entretanto, a Aucani não respondeu aos questionamentos do JC acerca da distribuição das vagas entre as faculdades e a queda do número de intercambistas.