Matemática e literatura se encontram no IEA

Debate mostrou ao público que as relações entre as duas áreas são mais comuns do que se imagina

A disposição dos palestrantes em um semi-círculo aproximou os pensadores do público | foto: Marina M. Caporrino
A disposição dos palestrantes em um semi-círculo aproximou os pensadores do público | foto: Marina M. Caporrino

No último dia 27, o Instituto de Estudos Avançados (IEA) promoveu uma discussão acerca de um tema não tão recorrente: as conexões entre literatura e matemática. O seminário propôs mostrar ao público que, diferentemente da separação que costuma ser passada para as crianças nas escolas, as duas áreas têm muito mais relações do que se imagina. O debate, que ocorreu na Sala de Eventos do IEA, localizada na antiga Reitoria, teve transmissão on-line e contou com pesquisadores da área: Jacques Fux, Marco Lucchesi, Nilson José Machado e o próprio organizador e mediador do debate, Flávio Ulhoa Coelho.

Os debatedores envolveram o público com suas experiências e o debate não ficou apenas nas relações entre números e letras, mas se estendeu para diversas áreas, desde arte, política, filosofia e teologia, até biologia, tecnologia e até mesmo séries de TV. Para dar início ao debate, foram citados autores aclamados, como Jorge Luis Borges e “A Biblioteca de Babel”, e Georges Perec. Ambos utilizaram, em suas obras, muito mais matemática do que se imagina. Esse uso se deu em estabelecer regras para a criação literária, ou seja, não esperar que a inspiração faça tudo nem deixar a mente vagar sem rumo.

Durante o seminário, houve também a discussão sobre as relações práticas entre matemática e literatura, ou seja, não apenas nas obras de grandes autores, mas no dia-a-dia das pessoas. Nesse aspecto, o primeiro contato que o ser humano tem com essa relação dá-se ainda na infância, por meio dos contos de fadas. Isso porque esses contos são estruturados de uma forma binária, sempre opondo o certo e o errado, ou o verdadeiro e o falso.

Porém, conforme a criança cresce, ela, com a ajuda essencial dos professores, percebe que o mundo não é assim, não se divide em narrativas unárias ou binárias. E, a partir daí, começa a separação que estabelece que matemática e literatura são universos totalmente distantes. “É preciso evitar que a criança separe literatura e matemática ainda na escola e comece a gostar de uma e odiar a outra”, fala Nilson Machado, que também é educador.

A relação do professor com o aluno também foi discutida durante o debate. Marco Lucchesi fala das dificuldades que o Brasil tem na área da educação, tão frágil e tão atacada e destaca o papel do professor na reconstrução da esperança para a educação e também do aluno: “Paulo Freire falou no contexto, falou na confiança do aluno, o aluno não é um saco vazio, ele traz uma grande bagagem, um grande contexto”.

Flávio Coelho conta que a ideia do IEA é promover debates assim com frequência, provavelmente um a cada semestre, para possibilitar o espaço de debate que às vezes falta na sala de aula. “A universidade peca muito nessa história, ela fica muito técnica e não explora todo o potencial que a gente tem, que é fazer essas ligações”, conta Flávio. Não apenas do âmbito universitário, mas na sociedade como um todo, essa relação é esquecida e é por isso que há o desejo, tanto de Flávio quanto do IEA, de promover mais debates nesse sentido. “Têm muitas ligações entre matemática e literatura e as pessoas não têm esse conhecimento, porque não chega a elas”, explica.

Além de estudiosos sobre o tema, os palestrantes também são autores e atuam, ou já atuaram, como professores. Jacques Fux, especialista nas relações entre matemática e literatura e autor de diversos livros sobre o tema; Marco Lucchesi, poeta e ensaísta, professor da UFRJ e membro da Academia Brasileira de Letras; Nilson José Machado, professor da Faculdade de Educação da USP e autor de dezenas de livros infantis sobre o assunto; além do próprio organizador e mediador do debate, Flávio Ulhoa Coelho, professor do Instituto de Matemática e Estatística da USP, pesquisador em período sabático do IEA, matemático e escritor.