Análise da edição 468

Em vez de esquentar, o Jornal do Campus está esfriando a própria cobertura. Das 19 reportagens da última edição, 12 começam apresentando os fatos em ordem cronológica. “No começo deste ano”, “feita anualmente desde 2003”, “nas primeiras semanas de março, “era 21 de dezembro, “no último dia 2”, “nos últimos anos”, “antes de chegar ao Brasil, em setembro de 2016” são exemplos de frases escolhidas pelos repórteres para iniciar seus textos.

A cronologia é a forma mais básica de relato. Ela retarda a apresentação da notícia em si e obriga o leitor a percorrer um longo caminho até finalmente ser informado do problema que a reportagem prometia relatar. Em tempos de atenção fugaz e de tempo curto, é ainda mais importante que o leitor seja atingido logo de cara pela notícia, antes que o smartphone trema no bolso da calça, avisando da chegada de qualquer coisa mais interessante que as notícias do jornal impresso que ele tem nas mãos.

O esfriamento da edição também acontece nos títulos. O verbo “ser” foi usado em cinco títulos, sendo três deles em sequência: “Projetos de ciências são expostos”, “restaturante-escola é terceirizado” e “ensaios de baterias são restringidos”.

É preciso usar títulos que revelem o significado do que se pretende apresentar. O ideal é que os títulos entreguem mais do que uma simples informação. Eles devem revelar qual a tensão envolvida no episódio inteiro. Afinal, qual a novidade de uma exposição expor projetos de ciência? Qual o problema da terceirização de um restaurante? É preciso que se diga em poucas palavras, pois o bom jornalismo desvela, não enrola. A dica aqui é fugir dos verbos “ser” e “estar”. Eles são pobres para essa função.

O mesmo espírito gélido se apresenta nas chamadas de capa “diretor do Cepe fala sobre” e “professores da USP avaliam reforma”. O que o diretor disse? E qual a avaliação feita pelos professores? Enfim, que notícia emergiu dessas entrevistas? É preciso que se diga, pois o simples fato de o diretor falar e de os professores avaliarem não é notícia em si – salvo se esses personagens quebraram voto de silêncio ou eram mudos e voltaram a ter voz.

O que esses três exemplos mostram é que o jornal está desperdiçando matéria-prima. O processo de edição deve valorizar a informação, nas escondê-la atrás de verbos frios, títulos óbvios e introduções cronológicas. Há necessidade de um tom mais agudo, que exponha de maneira clara a importância de cada fato que o jornal decidiu cobrir. Do contrário, fica tudo muito chato.

Por João Paulo Charleaux