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A cada 15 dias, a USP imprime com dinheiro público 8 mil exemplares do Jornal do Campus. O que aconteceria se o empreendimento tivesse de funcionar com pernas próprias, gerando – em banca ou por assinatura – os recursos para seguir existindo? Difícil prever. Mas uma coisa é certa: o jornal deixaria de servir aos interesses dos alunos envolvidos na produção e passaria a levar em conta o interesse do leitor também. Caso contrário, definharia até morrer, como ocorre com qualquer jornal normal.

A utilidade de um projeto universitário vai muito além da sua viabilidade financeira. E não tem sentido algum implementar um modelo comercial num laboratório que se presta justamente ao aprendizado e à experimentação de jovens estudantes em formação. Porém, é possível submeter o Jornal do Campus a alguns exercícios de realidade – que, suponho, já até tenham sido realizados alguma vez ao longo de seus 35 anos de existência.

Quem pagaria pela informação que está sendo entregue hoje? Quanto pagaria? E por que pagaria? Conhecer o leitor é um princípio básico de qualquer processo de comunicação jornalística. Se o repórter, o pauteiro, o editor não fazem ideia de quem está do outro lado, como podem definir a linguagem da publicação, os gráficos, as peças com informações de serviço, o tamanho médio dos textos, o tamanho da letra, a linguagem, os assuntos a serem cobertos?

Olhando as últimas edições, é difícil entender quem é o leitor. Se tivesse de apostar num perfil , eu diria que se trata talvez de um estudante permanentemente descontente com a reitoria, com os governos estadual e federal, extremamente interessado nos assuntos sindicais, engajado em protestos e na vida social da Cidade Universitária. Enfim, alguém muito parecido com o tipo de estudante que escreve os textos, provavelmente. Isso não é um problema em si. Mas é pobre.

Um exemplo: o espaço da Biblioteca da Brasiliana Guita e José Mindlin “registrou aumento na circulação de alunos”, mas se ressente dos “problemas com divulgação de suas atividades”. A quem interessaria saber disso, mas ficar sem saber qual o calendário das apresentações de música que “ocorrem no local toda quinta-feira”? Não há agenda, endereço, site ou telefone. Afinal, para quem se escreve um texto assim?

Qual a utilidade de ler uma página inteira com descrições sobre o perrengue do transporte público na Cidade Universitária e a insuficiência de alternativas, como ciclovias, se não há um questionamento frontal à Secretaria de Transporte ou um gráfico mostrando a oscilação de público nos diferentes horários do dia, para que os passageiros se programem melhor; ou ainda as rotas mais seguras de bicicleta, as rotas noturnas mais bem iluminadas, enfim, algo que faça com que o leitor realmente veja utilidade na informação que está consumindo?

Nem tudo precisa ser matéria “de serviço”, como dizemos no jargão. Porém, nem tudo tem de ser um desserviço também. Afinal, pode até não parecer, mas tem alguém lendo isso.

Por João Paulo Charleaux