Suco volta ao bandejão da EACH após problema na água

Problemas com água contaminada na EACH afeta alunos e funcionários. Foto: Leticia Fuentes

O restaurante da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) ou “bandejão”, como é popularmente conhecido , localizado no campus leste da USP, voltou a oferecer suco e água do bebedouro local para consumo nesta terça-feira (27). O abastecimento de dois pontos internos do prédio onde fica o refeitório estava interrompido desde 31 de maio, quando a água, que era utilizada para consumo e para lavar as frutas e hortaliças servidas nas refeições, começou a apresentar aspecto turvo. A unidade precisou fazer uma desinfecção e remoção total de detritos e impurezas dos reservatórios.

Para contornar a situação temporariamente, a Divisão de Alimentação da Superintendência de Assistência Social (SAS) havia disponibilizado galões de água mineral para os alunos que quisessem se servir, porém o suco, que normalmente é oferecido à vontade, estava indisponível. Durante o período sem fornecimento de água, os procedimentos de higienização dos alimentos passaram a ser feitos na cozinha central da empresa Básica, responsável por fornecer as refeições consumidas no bandejão. O preparo do restante da comida, com exceção das frutas e hortaliças, já era feito fora da EACH.

Procurada pela reportagem, a SAS afirmou que “como medidas preventivas”, no restaurante da USP Leste, assim como em todos que são controlados pela Superintendência, “não se utiliza a água do local para bebedouros e máquinas de suco”, e sim a que é fornecida pela SABESP. Além disso, “são realizadas, ainda em caráter preventivo, análises da água”. Segundo o órgão administrativo, os resultados da avaliação da qualidade da água ainda estão sendo aguardados para posterior divulgação à comunidade.

Ainda assim, em razão do histórico de problemas relacionados à água do local (que teve seu auge com a interdição da escola em 2014, por uma infestação de piolhos de pombo) e à contaminação do solo, alguns alunos ainda veem a situação com desconfiança. Bianca Bloise, que cursa graduação em Gestão Ambiental, conta que sempre evitou beber a água dos bebedouros locais e depois da interrupção do fornecimento no bandejão, a suspeita só aumentou. “Eu procuro encher minha garrafinha antes de sair do trabalho, mas tem vezes que eu passo o dia todo aqui na EACH. Então, pelo menos uma vez por dia, eu acabo tendo que beber água daqui”, diz. “Não como mais no bandejão, porque, sempre que comia, passava mal. E também não bebo o suco, por desconfiança mesmo.”

Ana Pinez, aluna de Gestão de Políticas Públicas, diz que teve intoxicação alimentar há cerca de três semanas, pouco antes do abastecimento hídrico do bandejão ser interrompido, e atribui a culpa à água que ingeriu na unidade. “Na mesma semana, só estava comendo no bandejão e o que comia em casa eram só coisas frescas, do mercado. A única coisa diferente era que passava o dia inteiro na EACH, então só bebi água de lá”, conta a estudante.

Nem todos os alunos, no entanto, compartilham dessa desconfiança. Marina Caruso, que cursa Lazer e Turismo, e Luiza Vanini, aluna de Marketing, não veem problema na água do local. “Bebo água daqui e nunca me aconteceu nada”, diz Marina, enquanto mostra uma garrafinha azul que havia acabado de encher no bebedouro. “Na verdade, a gente nem tem muita opção”, complementa Luiza.

Segundo Marina, já aconteceu de apertar o botão do bebedouro e sair uma água branca quando é assim, ela evita tomar. O mesmo ocorreu com a aluna de Gestão Ambiental Francisca Viana, mas, como aprendeu em sala de aula, esse fenômeno é normal e não oferece nenhum risco à saúde. Por isso, consome sem muitas preocupações. “Quando a água sai branca é porque a pressão está muito alta. São apenas umas bolhinhas. Depois de um tempo, elas somem e a água volta ao normal”, diz a estudante.

Para Gabriel Araújo, que também cursa Gestão Ambiental, o maior problema da EACH é a água subterrânea, que o instituto sabe que está contaminada, mas afirma que não oferece risco aos frequentadores do campus. “Eles dizem que não é a mesma água que a gente bebe, mas como garantir que [a água de consumo] não pode se contaminar também?”, questiona o jovem. “Além disso, se o problema foi na higienização da caixa d’água, é tão grave quanto.”

Procurada pela reportagem, a EACH reitera que “a área Leste do Campus é abastecida diretamente pela SABESP, com entrada única de água potável”.

 

Fantasma do passado

Não é de hoje que a USP Leste vem enfrentando problemas com o abastecimento de água e outras questões ambientais. Seu vasto histórico de polêmicas ecológicas fez com que a unidade fosse comparada por alguns estudantes a Chernobil, cidade na Ucrânia onde ocorreu um dos maiores acidentes nucleares da história, em 1986 – em razão dos diversos episódios de contaminação no local, EACH seria a “Chernobil Uspiana”.

Construída em 2005, ao lado do Parque Ecológico do Tietê e às margens da rodovia Ayrton Senna, a EACH foi alvo de um escândalo em 2011, depois do jornal Folha de S. Paulo denunciou que o campus recebeu 7.200 m³ (o equivalente a 480 caminhões) de terra com procedência desconhecida e, segundo a Cetesb (agência ambiental do Estado), contaminada. Soma-se a isso o fato de que a unidade fica em uma área onde há grande concentração de metano, um gás inflamável, resultante da decomposição de restos de animais, vegetais e outros sedimentos existentes na várzea do rio Tietê.

Ainda em 2011, outra denúncia, dessa vez de que o campus estaria operando, desde sua fundação, sem licença ambiental. Só então a USP tomou as providências necessárias para regularizar a área, criando um sistema para eliminação dos gases do subsolo através de tubos as chamadas “chaminés”.

A unidade também divulga em seu portal na internet laudos bacteriológicos e análises da qualidade da água e do solo, embora o último disponível seja de 2016. Com base nos relatórios, a EACH reconhece que a água subterrânea está contaminada em alguns pontos da unidade, sendo considerada pela Avaliação de Risco para a Saúde Humana como perigosa em caso de contato dérmico e ingestão. A água para consumo, no entanto, passa por avaliações a cada seis meses e, embora os resultados de testes feitos em 2017 ainda não tenham sido publicados, análises anteriores não indicaram anormalidades e a Prefeitura do Campus garante que as condições da bebida oferecida são normais.