Comunidade USP fala sobre a gestão Zago

Servidores, docentes e alunos fazem balanço sobre as principais medidas da atual reitoria

Por Carolina Unzelte, Ian Alves e Isabel Marchenta

Quatro anos depois de eleito, o Reitor Marco Antônio Zago se prepara para deixar a reitoria da Universidade. Sua gestão é avaliada de forma controversa por parte de funcionários, professores e alunos.

“De certa forma, ele [Reitor Zago] atribui, aos funcionários da Universidade, a culpa pela crise financeira, dizendo que a foi a folha de pagamento que a ocasionou”, avalia Marina Macambira, que trabalha na USP desde 1981. Nos últimos quatro anos, foram feitos dois Programas de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV), um em 2015 e outro em 2016, que dispensaram quase três mil servidores. “Os funcionários mais velhos se sentem expulsos, desnecessários e culpados pelos problemas financeiros”, completa Marina. Conforme levantamento do Jornal do Campus em novembro de 2016, o tempo médio de serviço dos servidores que aderiram ao Programa era de 30 anos. Este mês, foi divulgado o relatório oficial da gestão, que trata sobre os anos de administração do atual Reitor. Nele, consta que “os responsáveis pelo desequilíbrio financeiro não foram os servidores técnicos e administrativos da USP, e sim os dirigentes da gestão que gastaram em excesso”.

A aluna Ana Lígia Martins, na USP desde 2013, critica a enganosa sensação de segurança ocasionada pela falta de transparência da gestão Zago. Apesar disso, opina que “o balanço das contas era muito necessário. Isso ele conseguiu fazer, equilibrar as contas”. Segundo o relatório da gestão, “guardadas as condições atuais do cenário econômico, a administração projeta, para o término de 2017, a superação da situação de descontrole e a recuperação dos níveis históricos de gastos”.

Um professor, que leciona há mais de 30 anos na USP e não quis se identificar, afirma que Zago “consertou as finanças”, mas sacrificou o diálogo. “Parece que o governo do Temer tá consertando as finanças. Justifica que ele esteja no poder? Quer dizer, a falta de diálogo, a imposição de novas leis da maneira como foi feita, com um congresso que faz tudo de noite, escondido…” Na gestão do Reitor, também foram aprovados os Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira, série de regras para utilização do orçamento. Eles instituem que o teto de gastos com salários seja de até 80% do repasse total do governo do estado à Universidade. A aprovação dos Parâmetros, em março deste ano, foi marcada por controvérsia, uma vez que ocorreu por meio de uma reunião do Conselho Universitário, com poucos membros e após ação de repressão da Polícia Militar contra manifestação organizada pelo Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP) e apoiada por estudantes.

(Arte: Fredy Alexandrakis)

Para o servidor Ricardo Lessa, “nós estávamos caminhando por um processo muito bom de internacionalização da Universidade e isso foi fracassado. Nós tínhamos bolsas de intercâmbio para alunos, as quais ele reteve e não procurou recurso em lugar nenhum para que fossem mantidas.” Em entrevista ao Jornal do Campus no início de seu mandato, o Reitor afirmou que “as bolsas internacionais terão que ser revistas sim. […] Portanto, as bolsas que nós mantivermos serão complementares ao Ciência Sem Fronteiras […] Mas certamente o número total de bolsas vai cair”. No entanto, o programa federal não oferece bolsas para graduação desde 2014. O relatório da gestão afirma que “o intercâmbio de estudantes para a USP e da USP para o exterior mais do que triplicou, em relação ao período de 2006 a 2009, e aumentou de 50% e 67%, respectivamente, em relação ao período 2010-2013” – mas não menciona a questão das bolsas.

(Arte: Fredy Alexandrakis)

A política para manter o aluno dentro da Universidade ele também não desenvolveu”, adiciona Lessa. Segundo o relatório da gestão, “nos três anos da atual gestão, período em que os gastos com todos os itens de custeio foram reduzidos, em alguns casos em até 50%, a permanência estudantil teve aumento de R$ 192,9 milhões para R$ 206,8 milhões. Em 2016, o valor total das despesas com a Política de Permanência e Formação Estudantil representou 31,1% do orçamento de outros custeios e investimentos e 3,8% do orçamento geral”. Mesmo assim, houve, por exemplo, atraso nos resultados das inscrições do Programa de Apoio à Permanência Estudantil de 2015 (PAPFE-2015), para suporte à moradia e auxílios para alimentação, transporte e livros, além de corte do auxílio-transporte mensal de R$ 200 para alunos das unidades da capital em 2016.  

Carolina Andrade Oliveira, aluna da Pós-Graduação, aponta que “uma coisa boa da gestão foi fazer o Programa Unificado de Bolsas (PUB). Quando eu entrei na Graduação [em 2010], os programas eram bem separados, e essa unificação dá margem para a pessoa fazer um projeto que não necessariamente se enquadre numa caixinha”. O PUB reúne, em um único programa, as bolsas de ensino, pesquisa e extensão, e faz parte da Política de Permanência e Formação Estudantil. “O programa unificado é mais livre, fica mais fácil até pros alunos. Se inscreve uma vez [no PAPFE] e tem essa gama de projetos diferentes pra fazer, inclusive encontrá-los em outras unidades”.

Embora tenha elogiado o PUB, a aluna critica os inúmeros cortes de bolsas que ocorreram na administração Zago. Ela conta que, em seu primeiro ano de pós-graduação, foi selecionada para um programa de bolsas da Universidade, mas logo recebeu um e-mail informando seu cancelamento por falta de verba. Em outubro de 2016, o Jornal do Campus retratou um outro caso desse tipo, quando a Aucani cortou 100 bolsas de intercâmbio de estudantes que já haviam sido selecionados, sem qualquer tipo de aviso prévio ou explicação. Segundo Nabi Oliveira, Representante Discente na Congregação da EACH, a falta de diálogo com a comunidade USP é um ponto marcante desta gestão. Para ele, “a reitoria deveria nos representar perante o governo do estado, e jamais representar o governo do estado perante a comunidade universitária”.