No mês da saúde mental, Crusp despeja alunos por carta

Para a SAS, estudantes não têm rosto / Crédito: Henrique Votto

SAS quer retirar moradores irregulares, enquanto cresce a demanda por moradia estudantil

Por Henrique Votto

A Superintendência de Assistência Social (SAS-USP) enviou, nas últimas semanas, via carta, uma ordem de desocupação de 20 apartamentos do Conjunto Residencial da USP (Crusp). O comunicado previa punição a moradores em situação regular e irregular, dando o prazo de 15 dias para que deixassem os quartos “sob pena de serem tomadas as medidas cabíveis”.

A determinação de despejo vem em meio ao Setembro Amarelo, mês marcado por campanhas de saúde mental na Universidade. “Não consegui fazer mais nada da graduação desde que recebi a carta”, afirma um aluno da FFLCH. A abordagem desumana da SAS foi um dos pontos questionados pela Associação de Moradores do Crusp (AMORCRUSP).

No mesmo apartamento, há outro estudante, este em situação irregular. Apesar de estar enquadrado como Perfil de Necessidade 1, classe prioritária para distribuição de bolsas de permanência, o aluno não conseguiu vaga no Crusp.

Em questão de dias, após solicitar o cancelamento do Auxílio Moradia, de R$ 400, o estudante ficou sem quarto e sem bolsa. “A gente sente que está prejudicando os alunos regulares”, declara.

Em agosto, a SAS manifestou preocupação com a não-ocupação de quartos supostamente vagos. Alguns moradores foram convocados a esclarecer a situação destes apartamentos, chamada que a AMORCRUSP considerou indevida. Na posição da Associação, a SAS estaria responsabilizando a comunidade cruspiana pela fiscalização de seus vizinhos, criando um clima de medo e vigilância prejudicial à convivência.

A direção da AMORCRUSP ainda aponta a ilegalidade do processo de despejo. Segundo Lucas Cacciaguerra, diretor da Associação de Moradores, a SAS mantém uma postura de criminalização dos irregulares, descumprindo com obrigações constitucionais de permanência estudantil e de direitos civis básicos.

Os alunos puderam apresentar recurso à SAS até o dia 24, a ser analisado por Comissão Mista. A batalha judicial promete ser longa.

“A treta toda é porque falta vaga”

Enquanto vai atrás dos estudantes irregulares no Crusp, a SAS não age para a abertura de mais vagas de moradia estudantil, com demanda cada vez maior desde a adesão da USP ao ingresso pelo SISU.

De acordo com o Anuário Estatístico da Universidade, entre 2015 e 2016, primeiro ano da mudança na admissão de alunos, o número de bolsas Auxílio Moradia concedidas, somente para o Campus São Paulo, aumentou em 36%, totalizando 2.613 benefícios.

O número total de vagas do Crusp, hoje, é de 1.692, mas estima-se que cerca de 1.850 pessoas estejam alojadas no conjunto residencial, segundo estimativa da AMORCRUSP.

Uma das principais reivindicações é a recuperação dos blocos K e L, onde permanecem instalados, há tempos, serviços e divisões remanescentes da antiga Reitoria. A devolução destes prédios ao Crusp disponibilizaria mais 400 quartos para alunos, segundo a Associação. O assunto foi pauta de greve estudantil no ano passado e remonta a compromissos firmados pelo ex-reitor João Grandino Rodas, em 2009, no primeiro ano de sua gestão.

Como resposta ao SAS, a associação de moradores organizou um comunicado de resposta, semelhante ao enviado pelo órgão de Assistência Social, em que notifica a desocupação desses dois blocos, no prazo máximo de seis meses. “É uma briga política. O que é nosso, a gente vai tomar”, promete Lucas.