Promotora critica destino de cadáveres em São Paulo

Por Gabriel Bastos e Maria Carolina Soares

Você já se perguntou para onde vão os corpos das pessoas que falecem antes irem para o cemitério? O Serviço de Verificação de Óbitos da Capital (SVOC) recebe todas as pessoas que morreram de causas naturais na cidade de São Paulo e é o responsável por fazer a autópsia dos mesmos.

O SVOC é localizado no chamado “quadrilátero da saúde”, próximo ao Hospital das Clínicas (HC), onde estão os departamentos de medicina, enfermagem, saúde pública e o Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, vinculado à USP. Ele recebe a maioria dos corpos do HC, também ligado aos cursos da área da saúde da Universidade. Por conta disso, o SVOC faz parte do treinamento dos alunos.

Quando as universidades fazem precisam, é também o Instituto que prepara corpos para serem estudados e a maioria deles é recebida pela USP. Entretanto, o trabalho do SVOC vem sendo questionado pelo Ministério Público de São Paulo. O maior problema está na falta de transparência nos processos burocráticos.

Esse é um dos questionamentos principais da promotora de justiça Eliana Vendramini, que estuda esse serviço há anos. Ela critica, por exemplo, o fato do SVOC não se fazer conhecido nem mesmo dentro da comunidade USP.

Falta dar publicidade ao serviço, um dos princípios da administração pública, assim como transparência. “Quantos paulistanos sabem que eles tem que ir ao Serviço de Verificação de Óbitos na busca de um parente desaparecido? Ninguém. Não é nem uma questão de nível de formação, ou informação: só quem vive, talvez, na medicina, ou viveu a história, é que sabe”.

Os problemas apontados pela promotora giram em torno da dificuldade em encontrar desaparecidos. Quando a família não faz o reconhecimento, todos os corpos são encaminhados para o sepultamento após dez dias de permanência no SVOC. Mas o problema não é o período de permanência, mas a falta de divulgação de informações sobre corpos que correm o risco de não serem reclamados.

Visto que muitas pessoas não sabem que deveriam procurar o SVOC, seria importante que essas informações fossem de fácil acesso. No entanto, não é o que ocorre. De acordo com Vendramini, não é feito nem mesmo um contato com a Delegacia de desaparecidos sobre as pessoas que chegam ao SVOC. Ele atesta o óbito e publica notas no Diário Oficial sobre os falecimentos, mas isso é considerado insuficiente pela promotora.

Mesmo quando as pessoas procuram esse serviço, não é fácil encontrar informações. Muitos só encontram seus familiares com a divulgação do Serviço Funerário da Prefeitura de São Paulo, que informa nome, idade, e todos os dados e características disponíveis através de seu site. Porém, isso ocorre quando os corpos já foram encaminhados ao sepultamento, podendo ser exumados e reclamados pela família apenas três anos depois.

Outro aspecto do trabalho do SVOC questionado pela promotoria é a falta de um papiloscopista no serviço. Responsável pela verificação biométrica dos corpos, esse especialista tem a função de atestar a identidade de uma pessoa através da leitura das impressões digitais dos pés e mãos. Assim, seria possível verificar se condizem com os documentos de alguém, serviço essencial para a realização de necrópsias.

Vendramini também contesta a resposta do serviço, que alega ter auxiliares de necrópsia: “mas o auxiliar de necrópsia não é papiloscopista. O problema pode ser econômico, mas ele é econômico há quatro anos. E é um problema econômico em confronto com direitos humanos”.

A promotora reconhece que desde o primeiro contato com o serviço da USP, houve avanços,, como mudanças na documentação para doação de órgãos, partes de corpos ou tecidos, que também são feitas no SVOC.

Um funcionário do SVOC, ao ser questionado sobre tais problemas, responde: “Isso não existe. Não existe divulgação no SVOC. A Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa faz o boletim de ocorrência do desaparecimento e cruza os dados com o B.O. de falecimento”. Além disso, ele afirmou que os corpos chegam identificados e os que não possuírem essa identificação são mandados para o Instituto Médico Legal. “Se a pessoa liga aqui querendo saber a informação, a gente dá. Mas não tem divulgação, nem pode,” completa.

Questionada sobre quais mudanças seriam necessárias, a promotora é direta e incisiva: “A do site não é dinheiro, porque o site já está aí, é só colocar o nome”, sugerindo que o SVOC divulgue em seu site as características dos corpos, mesmo trabalho feito pela Prefeitura, mas em tempo hábil para que a família consiga reconhecer seu parente.