Por que o Brasil ainda não tem um Nobel

Por Gabriela Teixeira

108 nomeações: segundo a lista divulgada pelo site oficial do Prêmio Nobel, essa é a quantidade de vezes que o Brasil concorreu na premiação. Tivemos mais chances do que o Chile, a Hungria e até mesmo o Canadá. Todos esses países foram laureados com um Nobel. O Brasil, não.

A participação brasileira no Prêmio iniciou-se no ano de 1911, quando José Maria da Silva Paranhos Júnior, também conhecido como Barão do Rio Branco, disputou o Nobel da Paz. Mas foi apenas dois anos depois, com os estudos de Carlos Chagas sobre o ciclo da doença de Chagas, que o Brasil, pela primeira vez, chegou realmente perto de conquistar um título, dessa vez na categoria de Medicina.

De lá pra cá, indicações têm se acumulado, ano após ano. Junto com elas, cresce também a sensação de ausência de reconhecimento. O que falta para o Brasil se tornar merecedor de um Nobel?

Arte: Maria Clara Rossini

Para Paulo César Soares, professor na Universidade Federal do Paraná, a explicação é estrutural: “Temos poucos grupos com longa tradição de pesquisa científica e tecnologia. Os grupos brasileiros são transitórios e dependem da mobilidade nas tendências de financiamento”.

Outro ponto fundamental apontado pelo professor é a ausência de espaços apropriados para a realização do trabalho científico, o que prejudica seu desenvolvimento. “Faltam centros governamentais de pesquisa que permitam maior tempo de dedicação à construção de uma descoberta ou invenção disruptiva, que alterasse a rota tradicional de compreensão de um fenômeno e ainda avançasse até o ponto de implicar em benefício para a humanidade”, explica Soares.

Prioridade à relevância

E é exatamente o fator relevância que se destaca na lista de exigências feitas pelos comitês de seleção do Nobel. Não basta que o trabalho seja inédito, é preciso que se mostre útil à sociedade. Por isso, em determinados casos, um projeto pode passar anos em avaliação, antes de ser finalmente premiado.

O conceito de relevância possui diversas interpretações. Conforme o relatório “Research in Brazil”, publicado pela Capes no começo do ano, o impacto de uma publicação científica está relacionado à quantidade de vezes que ela é citada em trabalhos posteriores.

Seguindo esse critério, o Brasil está em uma posição abaixo da média mundial, mas apresenta crescimento: no período avaliado, entre 2011 e 2016, houve um aumento de 18% no número de citações das pesquisas brasileiras. Além disso, estamos em 13º lugar na lista de países que mais produzem artigos científicos.

Rogério Meneghini, diretor científico da SciELO, é defensor da ideia de que a contabilização de citações por artigo é um parâmetro muito mais confiável para mensurar a qualidade da produção nacional. “Nesse critério, estamos aproximadamente na 30º posição mundial. O Brasil tem sim produzido material científico de relevância, temos autores que possuem valores altos de citação no contexto internacional”, explica. Para ele, a situação brasileira no cenário global, apesar de longe da vanguarda, é “boa e realista”.

Questionados sobre os recentes cortes de orçamento na área da ciência, tanto Soares quanto Meneghini concordam que eles tornarão ainda mais difícil a conquista do Prêmio Nobel.

Para o professor da UFPR, além de investimento, é preciso reformar o modelo atual, criando, tanto dentro quanto fora das universidades “centros independentes de pesquisa, com fundos de longo prazo, e grupos cuja maior preocupação seja com o avanço do conhecimento até alguma meta singular e não com o maior número de trabalhos publicados ou doutores formados por ano”.